BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) – Mão aberta levantada, Juan Guaidó, 35, jurou encarregar-se do poder Executivo da Venezuela, às 13h44 da tarde (horário local, 15h44 em Brasília), sendo muito aplaudido por manifestantes que foram às ruas nesta quarta-feira (23) para um protesto massivo pedindo a saída do ditador Nicolás Maduro.

No palco armado em Chacao, bairro de classe média alta no lado leste de Caracas, o presidente da Assembleia Legislativa venezuelana afirmou: “Sabemos que isso vai ter consequências. Mas não vamos permitir que se desinfle esse movimento de esperança, que seguirá ainda por dias, semanas ou meses, e por isso peço a todos os venezuelanos que juremos como irmãos que não descansaremos até alcançar a liberdade”.

Em seguida, o presidente dos EUA, Donald Trump, divulgou um comunicado reconhecendo Guaidó como presidente interino do país latino-americano, aumentando a pressão sobre Nicolás Maduro. No texto, ele diz que usará “todo o peso do poder econômico e diplomático dos Estados Unidos para pressionar pelo restabelecimento da democracia venezuelana”.

“Em seu papel de único braço legítimo do governo devidamente eleito pelo povo venezuelano, a Assembleia Nacional invocou a Constituição do país para declarar Nicolás Maduro ilegítimo e, portanto, o gabinete da Presidência ficou vago”, declarou Trump.

O secretário-geral da OEA (Organização dos Estados Americanos), Luis Almagro, também divulgou uma mensagem de reconhecimento e felicitação a Guaidó. “Tem todo nosso reconhecimento para impulsionar o retorno do país à democracia”, postou em seu Twitter.

Guaidó já havia se declarado presidente interino do país em 11 de janeiro, um dia após o o ditador Nicolás Maduro tomar posse para iniciar um novo mandato no país.

No palco em Caracas nesta quarta, ele anunciou que, no próximo fim de semana, será apresentado o plano de anistia e o programa para a transição que se daria caso seja possível remover Nicolás Maduro do cargo ou que este renuncie.

Contou que a Assembleia Nacional esteve trabalhando nesse projeto nos últimos dias, disse que contava com o apoio do “chavismo dissidente” e que não haveria perseguição num momento “de união para o bem de nosso país”.

Afirmou que no próximo domingo, a Venezuela seria já um outro país e pediu que todos o acompanhassem cantando o hino nacional, que começou então a ser executado. E acrescentou que, em fevereiro, haverá uma nova marcha “desta vez para pedir que a ajuda humanitária internacional chegue com urgência a nosso país.”

Por volta das 11h locais (13h de Brasília), porém, o Tribunal Supremo de Justiça, ligado a Maduro, declarou que a Assembleia Nacional atacava a Constituição “ao tentar usurpar o poder do presidente da República”.

Também disse que o órgão não tem autoridade para escolher representantes em organismos internacionais, como a Assembleia Legislativa fez na terça-feira (22), nomeando um representante para a OEA (Organização dos Estados Americanos), que aliás já viajou nesta quarta para um encontro com Luis Almagro.

O Tribunal voltou a declarar que as atitudes do parlamento são nulas e que atentam contra a Constituição. “A Assembleia segue violando o texto constitucional e, portanto, continua sendo considerado que está em desacato”, disse Juan Jose Mendoza. Terminou sua fala dizendo, ainda, que o Ministério Público do país estava encarregado de fazer as acusações formais contra a Assembleia, nos próximos dias.

Enquanto isso, em toda Caracas e em várias capitais, houve manifestações durante a manhã e no princípio da tarde, sem enfrentamentos e, em geral, pacíficas. A data escolhida, 23 de janeiro, é uma homenagem ao dia em que foi derrubada a ditadura de Pérez Jimenez (1953-1958).

Numa estratégia para dificultar a repressão, os atos foram realizados em distintos lugares da capital. As colunas começaram a marchar ao som de “sim, se pode”, como grito de guerra. Por outro lado, uma contra marcha ocorria na avenida Nueva Granada, com apoiadores de Maduro usando camisetas e bonés vermelhos. Alguns traziam imagens de Hugo Chávez.

O primeiro ato começou às 11h30, no palco armado em Chacao, onde falaram deputados da Assembleia Nacional.

A líder oposicionista María Corina Machado disse que “amanhã pode não ter caído o governo, mas um novo ciclo começará e terminará apenas quando Maduro saia, isso pode demorar dias ou semanas ou meses”.

Corina acrescentou que tem falado “com os jovens membros das Forças Armadas e estes também estão descontentes, eles também têm famílias que sofrem com o desabastecimento, precisamos deles para fazer tremer a cúpula militar.”

O ato seguiu com diversos deputados da Assembleia Nacional lendo nomes de vários dos 130 mortos na repressão de 2017.

As áreas por onde marchavam os manifestantes anti-Maduro estiveram extremamente vigiadas por oficiais armados. Vários deles foram interrogados por cidadãos: “Por que não vêm com a gente?”, ou “juntem-se a nós, vocês também são venezuelanos”.

Os distúrbios estiveram concentrados na madrugada, quando quatro pessoas foram mortas em Catia, em El Junquito e na estrada que liga La Guaira a Caracas.

Foram reportados episódios de repressão em Caracas, nos municípios de El Valle, Catia, Los Mecedores e El Junquito. Na maioria desses lugares predominam eleitores chavistas, tradicionalmente. Também se ouviram panelaços por toda a cidade durante o dia.

A repressão esteve presente por meio das FAES (Forças de Ações Especiais), do Conas (Comando Nacional Antiextorsão e Sequestro), da Polícia Nacional e da Guarda Nacional Bolivariana. O único morto identificado é um menor, o jovem Allixon PIzani, 16, que participava de uma manifestação com queima de pneus, em Catia.

Em San Felix, ao sul do país, foi incendiada uma estátua de Hugo Chávez. O busto apareceu horas depois, dependurado num poste da cidade.