Em breve, recuperandos da unidade prisional de Alto Araguaia (MT) – 415 km a sul de Cuiabá – vão iniciar a construção de ciclovias e ciclofaixas nas vias públicas da cidade, de forma a estimular o ciclismo, esporte que já conta com adeptos e praticantes frequentes. O início dos trabalhos será possível com base na assinatura de um Termo de Cooperação entre o município e a Fundação Nova Chance, firmado na última sexta-feira, 17, com objetivo de promover a reinserção social dos recuperandos, por meio do trabalho remunerado em obras do poder público municipal.

A iniciativa do projeto partiu do juiz da 2ª Vara de Alto Araguaia e corregedor da unidade prisional, Adalto Quintino da Silva, informou a Assessoria de Comunicação do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT).

Ao assumir a 2ª Vara Cível e Criminal de Alto Araguaia, em julho de 2019, Quintino abriu tratativas com a prefeitura e com a Fundação Nova Chance, autarquia estadual que atua na ressocialização de presos. “O que está por trás desse projeto é o sentimento de solidariedade, aliado à vontade comum que todos têm de viver em uma sociedade ainda melhor”, disse o juiz.

Para Adalto Quintino “a contratação da mão de obra de reeducandos pelo Poder Público se traduz em um mecanismo onde todos ganham. O poder público ganha, pois terá uma obra realizada com um custo inferior ao que teria se fosse contratar empresa terceirizada para a sua realização”, destaca o magistrado.

“A população ganha, pois terá à sua disposição uma obra, as ciclovias, que estimulará ainda mais a prática do ciclismo, o que reveste em benefício para a saúde, reduzindo riscos de diversas doenças, além da economia do dinheiro público”, pondera.

Para Quintino, também “o próprio reeducando ganha, pois além da redução de sua pena por meio da remição, a execução do trabalho, que será remunerado, irá lhe transmitir conhecimento e qualificação que poderão ser fundamentais na sua ressocialização e reinserção no mercado de trabalho”.

O juiz observa que a contratação de reeducandos não está sujeita às regras da CLT nem à obrigatoriedade do regime previdenciário, não havendo necessidade de o contratante pagar FGTS, férias ou 13º salário, nem mesmo recolher contribuição previdenciária.

Inicialmente, as tratativas ensejaram a assinatura do protocolo de intenções, ainda em 2019. O presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, desembargador Carlos Alberto Alves da Rocha, e o corregedor-geral da Justiça, desembargador Luiz Ferreira da Silva, estimularam a iniciativa durante a passagem da expedição Araguaia Cidadão pela cidade.

A partir desse protocolo foi elaborado o Termo de Cooperação formalizado na última Sexta-feira e assinado pelo prefeito de Alto Araguaia, Gustavo de Melo Anicezio, e pela presidente da Fundação Nova Chance, Dinalva Oriede da Silva Sousa, em cerimônia na Câmara do município.

Segundo o magistrado, não se pode ignorar o fato de que todos aqueles inseridos no sistema carcerário irão retornar às ruas. “Então, devemos nos indagar: como queremos que eles retornem? Com alguma qualificação e conhecimento relativo a trabalho ou sem qualquer experiência nesse sentido?”, argumenta.

Adalto Quintino ressalta que “pesquisas apontam que o índice de reincidência no Brasil supera o patamar de 70%. E é nesse ponto que a remuneração do trabalho do preso se torna interessante, pois o trabalho deixa de ser apenas pena cumprida, e passa a despertar no reeducando essa visão de que a atividade lícita, com salário, poderá assegurar a ele e a sua família uma vida digna, de modo que não fará mais sentido voltar a delinquir”, assinala o juiz. “E quem ganha com isso é, sem dúvida, toda a sociedade, novamente.”

Adalto Quintino da Silva afirma ainda que a iniciativa pretende, neste momento, “plantar uma semente”. O magistrado sugere mobilização para que o País encontre saída para um drama que ganha contornos mais graves a cada dia. “Para que, em breve, tenhamos uma árvore e bons frutos a serem experimentados por toda a comunidade, e, para isso, é fundamental que não só o Poder Público, mas também o setor privado, as empresas urbanas e rurais, participem desse processo, e vejam que a contratação da mão de obra de presos é, sim, interessante, não só no sentido dos benefícios sociais, mas também para o empregador, que terá um custo menor na contratação, e, desse modo, poderá maximizar o resultado financeiro de sua atividade, ou seja, seus lucros.”