Enquanto o futebol masculino do Cruzeiro foi rebaixado à Série B do Campeonato Brasileiro e acumula dívidas de R$ 262 milhões, o vôlei masculino do clube conquista um título atrás do outro. No último final de semana, o Sada Cruzeiro se tornou heptacampeão sul-americano. Desde 2010, o time disputou 50 campeonatos, chegou a 44 finais e conquistou 37 troféus. O Cruzeiro que vem dando certo nos últimos anos é o do vôlei.

Com os sete títulos continentais (2012, 2014, 2016, 2017, 2018, 2019 e 2020), a equipe celeste disparou na galeria histórica de troféus. Banespa e Paulistano ganharam cinco vezes cada nas décadas de 1970 e 1990, respectivamente. A conquista do Sul-Americano foi a terceira taça da temporada – o time já havia conquistado a Copa Brasil e o Campeonato Mineiro. Além disso, o time é hexacampeão da Superliga e lidera a edição atual.

Para o ponta Filipe, único remanescente desde a criação do time em 2010, a manutenção de uma espinha dorsal foi fundamental para o início da hegemonia. “Mantivemos a nossa base por quatro ou cinco anos. Isso foi muito importante para o início desse período de conquistas”, disse o atleta de 39 anos.

Em 2009, o Sada Betim Vôlei se uniu ao Cruzeiro Esporte Clube e passou a se chamar Sada Cruzeiro Vôlei. O histórico de conquistas do clube começou logo no ano seguinte, em 2010, quando conquistou o seu primeiro título mineiro, desbancando o hegemônico Minas Tênis Clube, e chegou em quarto lugar na Superliga da temporada 2009/2010.

As conquistas seguintes, ainda na opinião de Filipe, foram consequência da criação de uma mentalidade vencedora. O ponto de partida para os títulos internacionais foi a decisão do Mundial em Dubai, em 2011, diante do Trentino, da Itália. “A partir daquele jogo, nós descobrimos que era possível vencer as principais equipes do mundo”, afirmou.

O treinador Marcelo Mendez é um dos principais responsáveis por essa era de ouro. São 10 anos e 35 títulos à frente do clube brasileiro. Natural de Buenos Aires, Mendez concilia o comando da equipe com o da seleção de seu país, que se classificou para os Jogos de Tóquio. “Temos uma vontade grande de vencer, melhorando a cada dia”, completou o treinador que coordenou que já treinou a seleção da Espanha, clubes italianos e os argentinos River Plate e Daom.

O clube vai bem inclusive fora de quadra. A associação entre futebol e esporte olímpico serviu para aumentar o público nas quadras, o que se reflete em ginásios cheios e grande apoio dos torcedores que costumam ir aos estádios.

A presença de um patrocinador forte – o Grupo Sada é referência na América Latina em transportes e armazenagem, além de atuar em vários setores da economia – ajuda a manter as contas em dia e trazer jogadores de ponta. O Estado apurou que os investimentos anuais já chegaram a R$ 10 milhões por ano, valor comparável a um clube médio da Europa.

Quando Vittorio Medioli, empresário italiano fundador do time e presidente do Grupo Sada, decidiu investir no vôlei, em 2006, a sua intenção era usar o esporte tentar mudar a vida de jovens carentes em Betim, na região metropolitana de Belo Horizonte. A opção pelo vôlei era uma saudade da infância dele e do irmão, Alberto, que acompanharam a criação do Parma, que se tornaria esquadrão italiano.

O empresário revela que a queda dos investimentos não comprometeu o sucesso do projeto. “Nos últimos três anos, o investimento diminuiu em valores, mas não se perdeu eficiência. Tivemos que ceder atletas que estavam fora da nossa possibilidade de serem mantidos, mas sempre preenchemos com novidades à altura”, disse Medioli, que também é prefeito de Betim. “As empresas do Grupo Sada emprestaram seus princípios e experiências de sucesso a este projeto”, afirmou o fundador.

A saúde financeira do time azul faz contraste com o cenário de dificuldades estruturais do vôlei brasileiro. Equipes como Maringá e Taubaté, por exemplo, estão com salários atrasados há três meses. No caso do time paranaense, os jogadores estão sendo obrigados a se desfazer de seu patrimônio para custear as despesas pessoais. O líbero Daniel Rossi vendeu seu Gol prata 2010 para ajustar as dívidas do cartão de crédito.

O Sada Cruzeiro, no entanto, não é imbatível. No Mundial de Clubes, disputado em dezembro, a equipe foi derrotada pelo Lube Civitanova, da Itália. Ficou com o vice. Na atual edição da Superliga, o time caiu uma vez em 16 jogos. Passou por momentos de instabilidade com as mudanças no elenco. Em 2018, o ponteiro cubano Leal, um dos destaques da equipe, decidiu atuar na Europa e foi para o Civitanova, depois de seis anos em Minas Gerais. Outro craque do time, o central Robertlandy Simon, também deixou a equipe. O substituto de Leal, o norte-americano Taylor Sander, ficou metade da temporada e foi para a Rússia.

Nesta temporada, a equipe vive uma reformulação profunda. São sete novos nomes no elenco, com quatro deles no time principal: o líbero Lukinha, os ponteiros Gord Perrin e Facundo Conte e o central Otávio. “Quando perdemos uma peça, é preciso encontrar outra que corresponda. Esse é um fator importante. Além de bons jogadores, é preciso trabalho, conhecimento e aperfeiçoamento”, avaliou Marcelo Mendez.