Tiago Calazans

Após lançar o disco que marcou o retorno da banda aos palcos, Cordel do Fogo Encantado chega a Curitiba para apresentar pela primeira vez na cidade o novo trabalho, Viagem Ao Coração do Sol, dia 01 de dezembro, no Ópera de Arame; os ingressos já estão à venda. Além de músicas do álbum lançado em abril, o grupo vai apresentar também alguns dos clássicos dos discos Cordel do Fogo Encantado (2001), O Palhaço do Circo Sem Futuro (2002) e Transfiguração (2006). 

Conhecidos por sempre inovarem na cenografia, a luz do palco estará sob responsabilidade de Jathyles Miranda de Souza, que acompanha a banda desde o início. "A minha escola é o teatro e no Cordel consegui por em prática muito da experiência que tenho, pois a banda permite esse processo criativo como se fosse uma peça. Então, quando chega o momento de montar a luz do palco, trabalhamos semelhante à uma peça, ou seja, nada é aleatório, tudo é marcado, discutido", conta o iluminador. Já o video mapping fica por conta de Gabriel Furtado e o figurino é assinado por Isadora Gallas.

Além disso, a cantora Isadora Melo faz participação especial em algumas músicas do novo álbum, como  Sideral ou Quem Ama Não Vê Fim, Raiar ou O Vingador Da Solidão, Conceição ou Do Tambor Que Se Chama Esperança, Eternal Viagem, Força Encantada ou Largou As Botas E Mergulhou No Céu e Liberdade, A Filha do Vento. Isadora é pernambucana e iniciou sua trajetória no tradicional espetáculo natalino Baile do Menino Deus. Hoje, aos 28 anos, a cantora acumula no currículo importantes apresentações nos palcos do ExcentriCidades, Museu do Estado de Pernambuco, além de passagens pelas cidades de Bordeaux e Orleans (França), e Lisboa (Portugal), festival Cancion sobre Cancion com o grupo Argentino Chanco a Cuerda, Festival REC Beat, Festival de Inverno de Garanhuns, Festivália (Rio2C), e também participações em discos e shows da Orquestra Contemporânea de Olinda, Zé Manoel e Juliano Holanda. Seu álbum de estreia, Vestuário, foi lançado em outubro do ano passado.

Faixa a Faixa – Viagem Ao Coração do Sol

Assim como nos três trabalhos anteriores, o álbum abre com um poema: O Sonho Acabou. É um recorte do texto ficcional que Lirinha escreveu, contando sobre a viagem ao coração do sol. São cinco personagens que estavam adormecidos em casulos no interior da Terra e que, ao despertarem, iniciaram o caminho em direção ao sol. Lá eles querem se encontrar com a filha do vento, chamada Liberdade.

A segunda música Sideral ou Quem Ama Não Vê Fim remete à libertação, fazendo referências, desde a semente do grão até a libertação do corpo; sugerindo a quebra das correntes que aprisionam. "Sideral é o primeiro impulso para chegar perto da filha do vento e apresenta um conceito que abraça o disco inteiro: a sideralidade, o amor como força, vital e eterna, através do renascimento", diz Lirinha. O produtor do disco, Fernando Catatau, participa tocando guitarra tenor.

Já a terceira faixa Raiar ou O Vingador Da Solidão traz um elemento importante para o conceito do álbum, uma vez que fala sobre o raiar de um novo dia; fortalecendo a ideia de nova existência, que permeia toda a obra. "O personagem da história, contada nessa música, viaja na tempestade e vai para a Interlândia, lugar geográfico ficcional, que significa interior; ou seja, ele vai até a origem da banda para anunciar que chegou a hora de raiar", diz o vocalista, responsável pela composição da canção.

Força Encantada ou Largou As Botas E Mergulhou No Céu evoca traços das antigas culturas das cordilheiras, descrevendo o caminho do vento que vem das montanhas até a beira do mar. A música foi composta para o filme Largou as Botas e Mergulhou no Céu, dirigido por Bruno Graziano, Cauê Gruber, Paulo Junior e Raoni Gruber, lançado ano passado, em parceria com o Canal Brasil. Participação de Catatau no violão de aço.

Na sequência vem Liberdade, A Filha do Vento, primeiro single do álbum. A música é o fio condutor da viagem ao coração do sol através da personagem que representa a filha do vento. "Ela também é chamada de Liberdade, mora em uma ilha suspensa, difícil de chegar, no coração do sol", comenta Lirinha. A canção foi escolhida como primeiro single do disco. Catatau também participa da faixa, tocando guitarra e teclado.

No Compasso Da Mãe Natureza ou O Amor, A Pureza e A Verdade é a sexta música e abre com o som de "maracas", chocalho indígena utilizado em festas e cerimônias religiosas e guerreiras. Faz parte da formação da banda na referência ao povo Xukuru, grupo indígena da Serra Ororubá, vizinha da cidade de Arcoverde (PE). Aliás, foi da cultura deles que veio a palavra "encantado" do nome do grupo.

Pra Cima Deles Passarinho ou Semente Brilhante, sétima faixa do disco, foi composta ainda na turnê de Transfiguração, em 2010, dentro de um ônibus. A canção, na qual Lirinha divide os vocais com Clayton, fala sobre a identificação com os pássaros e uma ideia de uma revolução provocada por eles. Logo depois, Dentro Dos Teus Olhos ou Passageira Florescente também é uma composição da primeira fase da banda, a melodia foi composta por Clayton.

Destilações é a primeira música de outros autores contemporâneos gravada pelo grupo. Assinada por Maviael Melo e Alisson Menezes, o Cordel logo de início se encantou pela canção e entendeu que ela fazia parte da história que está contando. Ao mesmo tempo em que é uma música lenta e romântica, traz a força da percussão.

Já a décima música Eternal Viagem é um diálogo entre um homem e uma mulher, na trajetória ficcional dos cinco personagens em direção ao coração do sol. É um texto declamado com uma base instrumental. Vale o destaque para a interpretação dramática da atriz e poetisa Nataly Rocha.

Caminhando para o final do álbum Conceição ou Do Tambor Que Se Chama Esperança é uma música que valoriza os instrumentos das religiões africanas e tem uma forte presença de um coral feminino, formado por Gabi do Carmo, Riá, Helena Cristina e Karynna Spinelli. "Ela nasceu como um juramento de fidelidade aos terreiros de Santa Bárbara, do Morro da Conceição, de onde vieram Nego Henrique e Rafa Almeida. Através da personagem Conceição, fazemos uma homenagem às mulheres negras guerreiras da nossa história. A letra diz:  Conceição / Ninguém apaga a tua história / Escrita por tuas guerreiras / Na tinta negra da memória", conta Lirinha.

Assim como nos álbuns anteriores, neste novo trabalho, não poderia faltar uma música que remetesse à água. Primeira Paisagem ou A Flor Molhada é uma homenagem a Naná Vasconcelos e traz a participação das cantoras da faixa anterior, que juntas fazem parte de um movimento de samba chamado Terreiros de Samba, com influência da música latina.

Para fechar o disco, Cavaleiro Das Estradas Do Sol é uma composição instrumental de Clayton, que traz a participação especial de Manassés na viola 12 Cordas. "São duas gerações que se encontram, pois Manassés é um dos mais influentes violistas brasileiro e Clayton, um importante representante dessa tradição. Com essa música, fechamos a história da viagem ao coração do sol, sob a luz dos acordes encantados dos violeiros repentistas", finaliza Lirinha.

 

SERVIÇO

CORDEL DO FOGO ENCANTADO EM CURITIBA

 

Onde: Ópera de Arame (Rua João Gava, 82130-010 Curitiba)

Quando: 01 de dezembro, sábado

Horário: 21h

Ingressos: a partir de R$50,00 – venda online – clique aqui

 

Sobre o Cordel do Fogo Encantado

No ano 1997, em Arcoverde, sertão de Pernambuco, no Nordeste brasileiro, surgiu um grupo cênico-musical, compartilhando o teatro e a poesia oral e escrita dos cantadores e ritmos afro-indígenas da região. E, dessa mistura, nasceu o espetáculo: Cordel do Fogo Encantado.

Cordel é sinônimo de história de um povo em forma de poesia. Enquanto, Fogo é o elemento mais representativo do lugar de origem e da intenção músico-poética inconstante e mutável do grupo. Já Encantado ressalta a visão fantástica e profética dos mistérios entre o céu e a terra.

Por dois anos, o espetáculo, sucesso de público, percorreu o interior pernambucano.

No carnaval de 1999, o Cordel se apresentou no Festival Rec-Beat, em Recife, e adaptou a narrativa do Fogo Encantado aos palcos de rua. Nisso, a estreia no carnaval pernambucano chamou a atenção da crítica, e o que era, até então, sucesso regional, ultrapassou as fronteiras, ganhando visibilidade em outros estados e a condição de revelação da música brasileira.

Foi quando a banda consolidou sua formação definitiva com os arcoverdenses José Paes de Lira (Lirinha), Clayton Barros e Emerson Calado, e os percussionistas recifenses, Nego Henrique e Rafael Almeida (do Morro da Conceição).

Através da poesia de Lirinha, a força do violão de Clayton, a referência rock de Emerson e o peso da levada dos tambores dos ogãs Rafa e Nego Henrique, o Cordel do Fogo Encantado passou a percorrer o país, conquistando a todos com suas apresentações únicas e antológicas. Surpreendendo não somente, pela ousada mistura sonora, mas também, pela intensidade cênica de seus integrantes e os requintes de um projeto de iluminação e cenário.

Em 2001, com a produção musical de Naná Vasconcelos, o grupo lançou seu primeiro álbum: Cordel do Fogo Encantado. A evolução artística ampliou ainda mais o alcance do som da banda que, atuando de forma independente, por onde passava, ganhava mais público e atenção da mídia.

Em 2003, o grupo lançou seu segundo registro de estúdio: O Palhaço do Circo Sem Futuro, co-produzido pelos próprios integrantes e por Buguinha Dub e Ricardo Bolognine. O álbum foi considerado pela crítica especializada um dos mais inventivos trabalhos musicais produzidos nos últimos anos. Em turnê, seu show ganhou projeção internacional, com apresentações na Bélgica, Alemanha, França e Portugal.

Em outubro de 2003, o Cordel do Fogo Encantado lançou o DVD "MTV Apresenta", o primeiro registro audiovisual da banda. "Transfiguração", terceiro álbum, lançado em setembro de 2006, com produção de Carlos Eduardo Miranda e Gustavo Lenza, e mixagem de Scotty Hard, vem transformar, ainda mais, a linha tênue entre poesia, artes cênicas e música, firmando o Cordel do Fogo Encantado como um dos grupos mais representativos no cenário da música independente nacional.

Entre os prêmios conquistados pelo grupo estão o de banda revelação pela APCA (2001), melhor grupo nacional pelo BR-Rival (2002), Caras (2002), TIM (2003), Qualidade Brasil (2003), bicampeonato do prêmio Hangar (2002 e 2003) e APCA, como melhor compositor nacional, Lirinha (2006).

No cinema, a banda participou do filme de Cacá Diegues, Deus é Brasileiro, e do documentário O Homem que Engarrafava Nuvens, de Lírio Ferreira.Em fevereiro de 2010, após 13 anos de trabalho ininterrupto, a banda anunciou a paralisação de suas atividades.

No início de 2017, o Cordel do Fogo Encantado voltou a se reunir para a criação de um Viagem Ao Coração do Sol, lançado em abril de 2018, e que agora segue em turnê.