Pedro França/Agência Senado

O deputado Luis Miranda (DEM-DF) e o irmão, o chefe de importação do Departamento de Logística do Ministério da Saúde, Luis Ricardo Miranda, apresentaram à CPI da Covid relatos de mensagens que indicam pressão para compra da vacina indiana Covaxin e também declarações sobre suposta cobrança de propina para que o Ministério da Saúde fechasse o contrato.

A aquisição das doses da Covaxin é investigada pela CPI e pelo Ministério Público Federal. O servidor da pasta relatou ter ouvido falar sobre propina envolvendo a pressão. Em mensagem enviada ao deputado, Luis Ricardo escreveu: “aquele rapaz que me procurou dizendo que tem vacinas disse que não assinaram porque os caras cobraram dele propina para assinar o contrato”.

Em depoimento à CPI, o servidor afirmou que o “rapaz” é um servidor do Ministério da Saúde chamado Rodrigo, que agora os senadores querem convocar para o colegiado. “O Ministério estava sem vacina e um colega de trabalho, Rodrigo, servidor, me disse que tinha um rapaz que vendia vacina e que esse rapaz disse que alguns gestores estavam pedindo propina. Ele não citou o nome.”

Os irmãos Miranda se reuniram com o presidente Jair Bolsonaro, no dia 20 de março, e dizem ter denunciado indícios de corrupção na compra da Covaxin. De acordo com o deputado, informações suspeitas contidas na primeira versão da “invoice” (nota fiscal) da negociação motivaram a reunião com Bolsonaro. Entre as informações questionadas, estão a exigência de pagamento antecipado e a quantidade de doses menores do que estava sendo negociado.

Após a reunião, o servidor da pasta alertou o irmão deputado sobre as suspeitas, conforme áudio exibido na comissão. “Pensa no preju”, disse Luis Ricardo, se referindo às características da importação. Em outro áudio, o técnico do Ministério da Saúde responsável pelas importações fala: “Nunca recebi ligação de ninguém, já nesse, meu amigo, o que tem gente em cima pressionando… Aí você já fica com pé atrás, entendeu?”

Durante o depoimento, o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), fez interferências para minimizar os indícios apresentados. Ele afirmou que os métodos do contrato são normais e comparados a outros laboratórios.

Aos senadores, o servidor da Saúde afirmou ainda quee, durante a execução do contrato da vacina Covaxin, recebeu diversas mensagens e ligações cobrando a liberação do imunizante, o que não aconteceu com vacinas de outras farmacêuticas. Segundo Luis Ricardo, foram constatadas irregularidades e cobranças indevidas na proposta enviada pela vacina, “erros primários”, disse, que travaram o processo. A cúpula da CPI suspeita que uma empresa de fachada foi indicada para receber parte do recurso do pagamento do imunizante. O servidor disse que no dia 19 de março, uma sexta-feira, Marcelo Bento Pires enviou uma mensagem às 23h em que dizia: “Meu amigo, estamos com muitos brasileiros morrendo. Precisamos fazer tudo para ajudar. O representante da empresa veio agora à noite falar com o Elcio [Franco, ex-secretário executivo da pasta] para agilizar a LI [licença de importação] para encaminhar as vacinas esta semana, quatro milhões.”

Na sequência, ele encaminhou o contato de um coordenador da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) e de Francisco Maximiano, sócio da Precisa Medicamentos, empresa usada como intermediária na venda da Bharat Biotech ao país. A Precisa é investigada pelo Ministério Público. Já sobre Alex Lial e Roberto Ferreira, superiores diretos do servidor, Miranda disse que recebia ligações perguntando “se acionou a empresa”, “se já conseguiu a documentação”, “se já foi protocolado na Anvisa”. “Sempre um andamento, mas com bastante constância”, afirmou.

 Luis Ricardo Miranda reforçou, durante depoimento à CPI da Covid, seu estranhamento com o fato de uma empresa terceira – a Madison Biotech – ser a autora das invoices (notas fiscais) enviadas ao governo para a negociação da vacina indiana Covaxin. Ele destacou que, apesar de as informações da nota terem sido corrigidas, a questão da empresa se manteve. Além disso, lembrou que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) negou o pedido de importação feito pelo Ministério da Saúde.”Se eu assinasse a primeira invoice, estaria tratando de maneira errada”, disse ele em resposta ao senador Marcos Rogério (DEM-RO).

Outro lado

Em uma transmissão ao vivo em uma rede social, nesta quinta (24), Bolsonaro confirmou ter se reunido com o deputado Luis Miranda, mas acrescentou que o parlamentar não relatou a ele suspeitas de corrupção envolvendo as negociações pela Covaxin. Também na quinta, no entanto, um grupo de senadores aliados do governo – integrantes da CPI da Covid – disse que, após ter sido informado das suspeitas, Bolsonaro acionou o então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. Um dia antes, na quarta (23), o ministro da Secretaria-Geral, Onyx Lorenzoni, disse que o governo iria pedir a investigação dos irmãos Miranda por denunciação caluniosa.

Luis Ricardo Miranda, servidor do Ministério da Saúde, em depoimento à CPI da Covid — Foto: Pedro França/Agência Senado
Luis Ricardo Miranda, servidor do Ministério da Saúde, em depoimento à CPI da Covid — Foto: Pedro França/Agência Senado