Fotos: arquivo pessoal – Carolina e a filha

Todos os dias quando chegava em casa, Bruna Bueno era recebida pelo filho, Miguel, de apenas cinco anos, que ficava na garagem já a esperando. Tão logo a porta do carro abria, ele corria para dar um caloroso abraço na mãe. Desde março, no entanto, a rotina da família foi alterada e o abraço de boas-vindas, temporariamente suspenso. É que Bruna é enfermeira e, por conta da pandemia do novo coronavírus, foi obrigada a adotar diversas mudanças em seu dia a dia para poder não apenas se proteger, mas também proteger aqueles que ama.

Maioria entre a população paranaense, as mulheres são também a maioria na linha de frente no combate à Covid-19. Uma pesquisa do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), por exemplo, revela que elas representam 86,6% da categoria. Num momento como o atual, acabam sendo duplamente afetadas, tanto por sua atuação na área de saúde quanto por atuarem como cuidadoras primárias de suas famílias. Curiosamente, inclusive, no próximo domingo é celebrado o Dia das Mães, enquanto na terça-feira comemora-se o Dia Internacional da Enfermagem. Para celebrar as datas, então, o Bem Paraná conversou com diversas mães que fazem parte do grupo de profissionais que estão na linha de frente no enfrentamento à Covid-19.

Para quem atua em UTI e diretamente com profissionais expostos ao novo coronavírus, por exemplo, é preciso tomar um banho na saída do trabalho e outro na chegada em casa. Foi por isso, inclusive, que Bruna teve de ‘adiar’ os abraços do filho.

“Antes eu chegava, ele me esperava na garagem e quando eu chegava, já me abraçava. Agora, ele me olha e eu vou direto pra lavanderia, tiro a roupa toda, vou pro banheiro e tomo banho. Só depois que vejo ele, converso”, diz a enfermeira.

Aniversário distante
Mãe do Alexandre, de 9 anos, e da Rafaela, 6, a enfermeira Flávia Micheluzzi Marafigo Vecina, coordenadora de enfermagem das UTIs do Hospital Pequeno Príncipe, comemora que no próximo domingo poderá celebrar o Dia das Mães perto de seus filhos. No último dia 15 foi seu aniversário, mas ela havia contraído o novo coronavírus. Agora, diz, vem a recompensa, que é poder abraçar os dois pequenos no seu dia.

“Não pude abraçar meus filhos no aniversário. Fiquei em isolamento do dia 7 ao dia 20 de abril. Depois que passou a quarentena, foi só alegria dentro de casa, todo mundo abraçando todo mundo, beijando todo muito”, relata Flávia. “Quando contei que estava com corona, eles se assustaram, perguntaram se eu ia morrer. Os primeiros dias foram mais tensos. Como eles [filhos] são pequenos, não entendem. É um momento difícil, mas com fé, paciência, conseguiremos passar por isso.”

Os profissionais de saúde, sejam da área médica, de enfermagem ou técnicos que atuam na linha de frente no atendimento de pacientes da Covid-19, sofrem duplamente e também correm riscos dobrados. A saúde mental para eles, então, é tão ou mais necessária do que para o resto da população. Nessa hora, a família faz diferença, e o Dia das Mães também.

Aline e os filhos: saudade e brincadeiras

A enfermeira que virou ‘caçadora de coronavírus’

Aline da Silva Paula, enfermeira-chefe do Núcleo de Epidemiologia Hospitalar do Vita Curitiba, relata que ficou 43 dias longe dos filhos, Luís Antônio, que no próximo dia 14 completa quatro anos, e João Henrique, de dois anos e três meses. No período de início da circulação do novo coronavírus pelo Brasil, ela e o marido decidiram por deixar os pequenos aos cuidados dos avós enquanto a mãe se preparava para atuar na linha de frente.

“Tinha dia que o coração doía, apertava, mas sabia que estavam bem na casa dos avôs, no interior. Ficamos 43 dias separados e eles retornaram à Curitiba no dia 1º de maio”, conta Aline.

Mas o dia a dia também tem seu lado lúdico. Aline, por exemplo, virou a ‘caçadora de Corona’ aos olhos do filho mais velho. “Eu falo para ele que sou caçadora de coronavírus. Ele gosta de ver as fotos da mamãe paramentada, com os materiais na mão. Digo a ele que é minha super fantasia de caçadora”, comenta a profissional de saúde.

‘Meu medo é pensar que pode acontecer alguma coisa com minha filha e por minha causa’, diz profissional da saúde

Mesmo entre aquelas com filhos mais velhos, os momentos de tensão foram grande, em especial entre o final de março e começo de abril, quando a pandemia do coronavírus ainda começava a atingir o território brasileiro. Enfermeira do Hospítal de Clínica, Carolina Poite de Siqueira, de 35 anos, decidiu mandar a filha por algumas semanas para morar com os avós. A solidão, conta ela, foi grande.

“Foi bem difícil, muito difícil. Já está numa situação muito estressante e ainda chega em casa e não tem ninguém para conversar… A ideia que eu tinha no começo era que aquela realidade de eu ficar sozinha perduraria meses. Fiquei triste mesmo”, recorda ela. “Todo dia eu pensava: e se eu morrer? Minha filha não ficou comigo, a gente não se viu, não se abraçou. Isso foi chegando a um ponto que, no pesar da balança, achei que valia mais a pena ela voltar para casa.”

Já a enfermeira Juliana* (nome fictício), que pediu para não ser identificada, possui uma filha de 18 anos e trabalha no Hospital de Clínicas, atendendo diretamente pacientes com Covid-19. Ela conta que chegou a pensar em se mudar para um alojamento enquanto estivesse no enfrentamento ao coronavírus, mas acabou desistindo da ideia.

“Ela [filha] queria tudo, menos que eu ficasse longe dela. Isso foi difícil para mim… Na cabeça dela, a contaminação pelo vírus era um problema menor do que a distância”, comenta a mãe e enfermeira. “Meu medo é pensar que alguma coisa pode acontecer com minha filha e por intermédio meu. Mas conversamos e acordamos em ficar juntas, pedir proteção a Deus e ter o máximo de higiene possível, mantendo distância uma da outra. É difícil não chegar perto, não poder abraçar…”.