Franklin de Freitas – Na Ceasa não tem desperdício. O que não é doado

“Jogar comida no lixo é pecado”. Essa é uma frase repetida diariamente em muitas casas no Brasil. Virou regra em alguns lugares. Não precisa ser religioso, nem ter avós que passaram pelo inverno europeu ou pelo caos da guerra para saber que essa norma faz todo sentido.

Mesmo assim, a cultura do brasileiro ainda é de desperdício. “Infelizmente, o volume que se joga fora é ainda muito grande. A ideia é reduzir o desperdício. Em torno de 30% do que é produzido no Brasil acaba sendo desperdiçado, e nós queremos evitar isso”, diz Eder Bublitz, diretor-presidente das Centrais de Abastecimento do Paraná (Ceasa).

E as Ceasas do Paraná entraram com tudo nessa luta. Uma parte dos produtos que poderiam parar no lixo vira composto orgânico (adubo) e retorna para ajudar na agricultura. Outra parte “foge” desse destino cruel, o lixo, e vai parar na mesa dos paranaenses.

“Às vezes o produto não está bom para o comprador porque tem uma manchinha, mas para o consumidor está muito bom. Em vez de jogar no lixo, trazemos aqui, o pessoal separa e distribui para quem mais precisa”, afirma Volni José Vieira, diretor social do Sindicato dos Permissionários. Os permissionários são produtores e comerciantes que têm permissão para atuar dentro do Ceasa, em espaços específicos.

Por ano, apenas a Ceasa de Curitiba consegue reaproveitar 4,6 mil toneladas de hortigranjeiros. No total, 194 mil pessoas são beneficiadas com esses alimentos.

O programa do Banco de Alimentos da Ceasa funciona em parceria com produtores e permissionários, que repassam ao banco produtos sem padrão de comercialização, porém ainda em boas condições de consumo. Estão cadastradas no programa 453 entidades, como instituições de acolhimento, creches, hospitais públicos e filantrópicos e entidades assistenciais. Na unidade de Curitiba, também são atendidas famílias da Capital e da Região Metropolitana.

O BANCO DE ALIMENTOS
Reaproveita 4,6 mil toneladas de produtos do Ceasa por ano
Produtos que são consumidos por 453 entidades (orfanatos, creches, hospitais públicos e instituições assistenciais
Por mês, 194 mil pessoas são beneficiadas
Como cadastrar uma entidade: [email protected]

Curso de culinária ensina a aproveitar tudo do produto
O espaço da Cozinha Industrial, na Ceasa Curitiba, vem ofertando cursos de culinário para evitar que bons alimentos acabem no lixo. O tema da última oficina foi “Cozinhando sem perdas e desperdícios”. Durante três dias, reuniram-se aproximadamente 100 pessoas para aprender novas técnicas de aproveitamento dos produtos recebidos pelo Banco de Alimentos.

O secretário de Estado da Agricultura, Norberto Ortigara, afirmou que, por desconhecimento ou hábito, às vezes as pessoas acabam jogando fora partes boas da comida. “Basta uma aprendizagem um pouquinho diferente, mudar um pouco o jeito de olhar cada vegetal, para ver que dá para fazer muita coisa decente, boa, como fonte de vitamina, proteína, sal mineral, fibra, coisas essenciais para o corpo”, afirmou.

O erro mais comum, contou a gerente do Banco de Alimentos da Ceasa, Jaqueline dos Reis Macedo, é não aproveitar o talo de alguns alimentos, como a beterraba, a cenoura, a couve-flor e o brócolis. “Tem um valor nutricional importante”, diz. “Dá para usar em tortas, por exemplo, e fica maravilhoso o sabor”, garante.

A última oficina reuniu representantes das entidades beneficiadas pelo Banco de Alimentos, famílias atendidas no programa e merendeiras de escolas e alunos de cursos técnicos de nutrição.

Em todos os dias houve orientação por parte dos chefes de cozinha Fernando Matsushita, do restaurante Peruano Gastronomia e Cultura, Alessandro Gonçalves, diretor gastronômico e sócio proprietário da Organização Pistache, e Alvaro Kriech.

Além de receitas mais tradicionais, os cursos também ensinam como fazer molhos, temperos e compotas.

Alimento
DA MANGA AO TOMATE
O produto mais doado pelos comerciantes e produtores para o Banco de Alimentos do Ceasa depende do período. “Depende da safra. Tem o período da safra da manga. Na safra do tomate, chegamos a receber aqui 500 caixas de tomate por dia”, conta a gerente do Banco de Alimentos da Ceasa, Jaqueline dos Reis Macedo. Há períodos do ano em que o pêssego e o mamão são os alimentos que mais chegam ao Banco.

DIGNIDADE
O diretor agrocomercial da Ceasa, Paulo Ricardo da Nova, explicou que muitas famílias iam até as unidades para catar as sobras e agora recebem os alimentos selecionados e com qualidade. “A Ceasa tem responsabilidade com as famílias do entorno. A entrega dos produtos evita que muitos venham aqui catar, o que é uma situação muito degradante. Então oferecemos mais dignidade às pessoas que estão cadastradas e vêm receber suas sacolas”, diz.

DISTRIBUIÇÃO
Em Curitiba, a distribuição das frutas, legumes e hortaliças é feita diariamente, às 13 horas, após os funcionários do Banco de Alimentos coletarem os produtos com os permissionários. Cada entidade tem um dia específico para buscar os alimentos na sede da Ceasa, que distribui uma média de 250 toneladas por mês. Cerca de 100 instituições e 140 famílias são cadastradas no programa.

PROJETOS
Entre os projetos apresentados, está a ampliação do banco de alimentos, que fornece o excedente a entidades filantrópicas; a construção de um viveiro na Ceasa de Curitiba para produzir mudas destinadas à recomposição de matas nativas e a capacitação de moradores do entorno das unidades sobre o aproveitamento integral dos alimentos. “Vamos avaliar essas propostas para encontrar a maneira mais sustentável e correta de executá-las”, afirmou Piana.

CALAMIDADE PÚBLICA
Os Bancos de Alimentos da Ceasa passarão por uma modernização que vai permitir o processamento dos alimentos no local, aumentando a validade dos produtos. A ideia é criar um estoque de alimentos embalados a vácuo para também atender casos de calamidade pública. “A doação é sazonal, tem dia que não há produtos suficientes. Com o processamento, teremos possibilidade de dar um atendimento mais uniforme às entidades e também em situações de desastre”, afirma o diretor Paulo da Nova.