Arquivo Bem Paraná/Geraldo Bubniak – Samir Namur

O Brasileirão só terminará em fevereiro, mas o fim de 2020 será importante para mais da metade dos clubes participantes. Afinal, 11 deles passarão por eleições presidenciais no período. O elevado número de disputas já chamaria a atenção para o cenário, que se torna ainda mais importante pelo contexto de crise financeira e mudanças no futebol nacional.

A pandemia do coronavírus paralisou as competições por quatro meses, afastou os torcedores das arquibancadas por tempo indeterminado e afetou as contas dos times, deixando algumas ainda mais fragilizadas. Além disso, os próximos anos devem ficar marcados por alterações nos modelos de negociação dos direitos de transmissão dos torneios e de gestão, com a possibilidade de adoção do clube-empresa. Assim, especialistas apontam que os eleitos vão enfrentar o maior desafio da história do futebol.

“É um momento desafiador por juntar a questão da covid-19, que afetou brutalmente as finanças e as atividades dos clubes, com um ambiente de grandes mudanças estruturais, com os clubes tendo de se adaptar a um xadrez de negociações. Antes, os clubes recebiam um cheque da Globo e cediam várias propriedades. Agora, vai se negociar múltiplas propriedades para plataformas, com múltiplos parceiros. Além disso, a inovação chegou ao mundo do futebol”, afirma Fernando Ferreira, sócio-diretor da Pluri Consultoria.

A maior parte das eleições não teve suas datas definidas, embora o clima político esteja quente em vários clubes. Em geral, isso se dá em times em crise esportiva e financeira. Nesses casos, há algumas coincidências: a antecipação as discussões e a apresentação de diversos candidatos. Nesse cenário, os casos mais claros são Vasco, São Paulo, Santos, Corinthians e Coritiba.

“Os clubes onde a crise é maior, a eleição será mais disputada. São clubes em fase complicada financeiramente, que estão em um círculo vicioso: as finanças vão mal, reduzem a possibilidade de investimento no futebol e aí os resultados são ruins e os clubes perdem receita. Isso é perpetuado por uma crise política. O ciclo só vai ser rompido quando isso for resolvido”, acrescenta Ferreira.

A disputa no Santos, por exemplo, promete ser intensa. Além de José Carlos Peres, que ainda não confirmou se buscará novo mandato, nomes como Esmeraldo Tarquinio, Milton Teixeira Filho, Rodrigo Marino e Andrés Rueda podem participar do pleito. Os candidatos de oposição, porém, têm buscado um acordo para o lançamento de uma candidatura única, através da montagem de um grupo de pacificação, que conta com nomes como Marcelo Teixeira e Walter Schalka. “A gente vai abrir mão de desejos pessoais por algo maior, recuperar o Santos, que está em situação caótica. Vamos definir o candidato em 15 dias, de forma consensual”, disse Rueda, segundo colocado na eleição anterior, em 2017.

No São Paulo, a eleição, prevista para novembro, deve envolver Julio Casares e Roberto Natel, que recentemente venceu uma disputa com Marco Aurélio Cunha para ser o candidato de oposição. Com o clube em crise, os candidatos têm buscado se manter afastados de Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco, atual presidente e alvo de críticas da torcida, mesmo que ambos já tenham atuado ao lado do dirigente.

“Não tem situação nem oposição, porque está tudo misturado. Por isso estamos chamando de coalizão. São duas chapas que brigam pelo poder, e as duas têm membros de oposição e situação. São novas propostas. A nossa busca é por unidade, com um plano de gestão bem definido”, disse Casares, que admite preocupação com as finanças do clube.

“O que nós vamos fazer é ter um comitê financeiro para discutir isso e fazer um realinhamento da dívida. Vamos honrar, claro, não existe outro caminho, mas vamos discutir de forma técnica, tentar renegociar e realinhar os prazos. isso tudo com ações técnicas. Temos um programa de gestão para suportar essa transformação, porque o São Paulo precisa de mudanças”, acrescentou.

A eleição no Corinthians, será em 28 de novembro. Até o momento, três candidatos confirmaram que pretendem concorrer ao cargo: Mário Gobbi, que foi presidente entre 2012 e 2015; Augusto Mello, empresário que fez parte do grupo “Renovação e Transparência”, liderado por Andrés Sanchez; e Ricardo Maritan, que faz oposição à atual gestão. Contudo, há outros nomes que podem entrar: Paulo Garcia, dono da Kalunga, derrotado no último pleito, e Duílio Monteiro Alves, diretor de futebol do clube.

A disputa no Vasco promete ser histórica por dois fatores. Após décadas, não terá a participação de Eurico Miranda, falecido em 2019. E pela possibilidade de ter a votação direta dos sócios, o que será definida em Assembleia Geral no próximo domingo. Augusto Ariston, Fred Lopes, Luis Roberto Leven Siano, Luis Manoel Fernandes e Nelson Medrado Dias já apresentaram pré-candidaturas. E a lista ainda deve ser ampliada com Julio Brant e o presidente Alexandre Campello.

“O Eurico sempre teve participação importante. Com a ausência de um ex-grande líder é natural que a política sofra mutação”, disse Fred Lopes, que já esteve nas gestões de Campello e Roberto Dinamite, mas que agora busca um voo solo, explicando a presença de tantos concorrentes.

No Coritiba, três grupos lançaram suas pré-candidaturas. São eles: Renato Follador Júnior, filho do ex-jogador Renatinho; a associação entre o torcedor João Luiz Buffara Lopes e o ex-conselheiro Luiz Carlos Betenheuser; e Paulo Roberto “Mago”. Há também outros dois prováveis participantes: o atual presidente Samir Namur, que buscaria se reeleger, e João Carlos Vialle, que já foi diretor de futebol.

DEFINIÇÕES IMPORTANTES EM CLIMA MAIS AMENO – No Botafogo, em eleição marcada para 24 de novembro, a novidade é que o mandato, antes trienal, passará a ser de quatro anos. “A comissão entendia que deveríamos acabar com a reeleição e, em contrapartida, até para dar mais tempo de trabalho ao novo mandatário, aumentar em 1 ano o período de mandato”, explica Edson Alves, presidente do Conselho Deliberativo do Botafogo.

A disputa deve envolver Alessandro Leite, atual vice-presidente do clube, apoiada pelo mandatário Nelson Mufarrej; Durcésio Mello, apoiado por Carlos Augusto Montenegro; e Walmer Machado. Agora, a equipe carioca busca transformar-se em um clube-empresa, com o intuito de profissionalizar sua gestão e conseguir equilibrar suas contas.

No Atlético-MG, Sérgio Sette Câmara é franco favorito a conseguir o segundo mandato de três anos. Há alguma tensão com o ex-presidente Alexandre Kalil, de quem deixou de ser aliado político, mas a tendência é que o prefeito de Belo Horizonte não se envolva na disputa – o presidente do Conselho Deliberativo, Castellar Guimarães Filho, seria um candidato competitivo caso tivesse o seu apoio.

Assim, Sette Câmara, que tem contato com o apoio financeiro da família Menin para investimentos no futebol e construção da Arena MRV, deverá estar à frente do clube em um momento importante, a inauguração do estádio, prevista para 2022. “É claro que é um sonho de qualquer atleticano inaugurar o estádio”, disse.

No Bahia, Guilherme Bellintani – ou o candidato do seu grupo político – deve ser eleito. A novidade do processo será que as chapas participantes da disputa pelo Conselho Deliberativo precisarão ter 20% de participação feminina.

No Internacional, a disputa deve envolver o atual vice-presidente de futebol Alessandro Barcellos, do ex-dirigente José Amarante e do empresário Luciano Davi, que perdeu para o atual presidente Marcelo Medeiros, no último pleito.

No Goiás, o atual presidente Marcelo Almeida não pode buscar novo mandato, com o conselheiro Paulo Rogério Pinheiro sendo visto como seu potencial sucessor. Já no Sport, Milton Bivar é favorito a obter novo mandato.

FUTURO DA GESTÃO – Para Claiton Fernandes, especialista em gestão esportiva e professor da FGV, os futuros presidentes terão de se atentar à implementação de um planejamento estratégico para o futebol. Isso garantirá que seus objetivos, metas, indicadores, táticas e planos de ação, se nortearão às ações futuras, através de projetos e processos focados em resultados dentro e fora de campo.

Fernandes alerta que se os gestores não adotarem um modelo de negócio para o futebol as consequências tendem a ser alarmantes. “Os times terão suas receitas minimizadas, não conseguindo formar equipes fortes e competitivas, o que reduzirá a participação em competições e a conquista de títulos. Eles apenas administrarão as dívidas, comprometendo cada vez mais a saúde financeira do clube. Além disso, irão desvalorizar sua marca, podendo ser adquiridos por investidores de capital nacional e internacional”, explicou.

O especialista ainda enumera desafios que os gestores terão “Eles deverão se preocupar com a revisão e atualização dos estatutos, desenvolvimento e execução do planejamento estratégico, modernização da estrutura e gestão administrativa, reestruturação financeira, gestão do passivo e equilíbrio do fluxo de caixa. Vale ressaltar que ações de marketing focadas na geração de receitas, investimento em infraestrutura e conhecimento em tecnologia também fazem parte desses desafios”, concluiu.