Franklin de Freitas – Pedalar já era uma tendência

O sentimento entre as empresas que trabalham com o mercado das bicicletas é unânime. Seja pela preocupação com a saúde (física ou mental), por uma questão de mobilidade ou ainda por uma decisão profissional, fato é que o mercado de bicicletas pedala ladeira acima em 2020, mesmo em meio à grave crise econômica provocada pelo novo coronavírus.

Entre as bicicletarias de Curitiba, a demanda por produtos e serviços teve crescimento de até 80% neste ano em relação à 2019. Nas palavras de Eliza Merkle Doff-Sotta, proprietária da E.M. Bike Shop, localizada em Santa Felicidade, se em outras temporadas o setor mantinha um bom movimento (ela tem desde 2002 a loja), em 2020 a demanda pode ser considerada excelente.

“Eu tenho desde 2002 a loja, já são 18 anos, e sempre tive um bom movimento, mas não excelente, que nem neste ano”, conta ela, relatando ainda que o faturamento de sua empresa cresceu cerca de 50%. “O esporte é saúde, todo mundo tem que tentar se movimentar e fazer atividade física. E o ciclismo, graças a Deus está na cabeça das pessoas agora”, comemora a empresária.

O que explicaria, entretanto, esse movimento de alta do segmento? Na realidade, as explicações são diversas, aponta Mayara Jahn, sócia-proprietária da Cicles Jahn, empresa familiar fundada há 27 anos e localizada no Xaxim.

Um desses fatores foi a redução nas opções de modalidade. Por conta das restrições impostas pela pandemia, academias passaram algum tempo fechadas, aulas de natação foram suspensas, campos e quadras esportivas acabaram interditadas. Dessa forma, aqueles preocupados com a própria saúde tiveram de encontrar outras maneiras de manter a forma. E mesmo aqueles que deixavam um pouco de lado o cuidado com o próprio corpo acabaram mudando um pouco a rotina, até para evitar maiores complicações caso viessem a contrair o coronavírus.

“A pessoa acostumada a fazer exercício e até aquela que não era acabou optando pela bike. Por isso aumentou a demanda um aumento na ordem de 80%. Uma procura absurda”, comenta Mayara, relatando ainda que outro fator positivo para o setor foi a ‘fuga’ dos passageiros de ônibus que, preocupados com o risco de contaminação no transporte coletivo, começaram a aderir ao uso das magrelas.

“Quem morava não tão longe do local de trabalho optou pelo custo-benefício da bicicleta, economizando em transporte, correndo menos risco [de contrair o vírus] e já fazendo exercício físico também”, diz ela, fazendo ainda uma espécie convocação àqueles que não tiveram o prazer de sentir a brisa do ar batendo no rosto durante uma pedalada (uma sensação que ela define com a palavra ‘liberdade’): “Saia do sofá e venha pedalar”.

Setor sofre com o desabastecimento de peças e produtos

Com a demanda ciclística registrando um crescimento tão expressivo, a grande dificuldade que o setor enfrenta neste momento é conseguir repor o estoque de produtos e peças. “Está faltando matéria-prima em muitos ramos e o da bike não é diferente”, comenta Mayara, relatando que, em época de Natal, a Cicles Jahn costumava trabalhar com mais de 15 marcas diferentes de bicicletas, com estoque de mais de 400 magrelas.

“Este ano não está sendo como foi os outros anos, não estamos recebendo da fábrica. Se eu faço um pedido de 200 bikes neste mês, das 200 eu vou receber 50. Então estou recebendo 25% do que eu era acostumada”, conta a empresária. “O que estou sentindo bastante falta é a questão de material. Está faltando câmara, aro, várias coisas. Está bem complicado”, complementa Eliza, da E.M. Bike Shop.

Se a demanda está em alta e a oferta em baixa, natural então que se tenha também um aumento nos preços praticados pelo mercado (ao que ainda se deve somar à variação do dólar). “O preço aumentou absurdamente. Por exemplo, uma bike que antes da pandemia a gente vendia por R$ 1.599, hoje tenho que vender a R$ 2.299. Aumento de 40%, então aumentou absurdamente”, relata a sócia-proprietária da Cicles Jahn.

Uma tendência que veio para ficar?

Diante de um crescimento tão extraordinário para o setor, fica em aberto a possibilidade de uma mudança de paradigmas. Quem sabe num futuro próximo, por exemplo, as bicicletas podem acabar ganhando uma relevância ainda maior no contexto da mobilidade urbana. Nesse sentido, tanto Eliza quanto Mayara acreditam que o atual momento do setor na realidade se trata de um “Novo n ormal”.

“Ao que tudo indica, esse movimento vai continuar, é o novo normal. E eu espero que sim, para o meu ramo seria bom. Acho que o pessoal está se preocupando mais com o corpo, fazer atividade física, e o ciclismo ajuda muito”, diz a próprietária da E.M. Bike Shop. “Outra coisa que eu tenho notado também é a questão das famílias, com pai, mãe e filho aderindo. Isso é o mais legal de tudo”, complementa.

Já Mayara cita a experiência pessoal para apontar no sentido da continuidade de crescimento do mercado das magrelas. “Quem começa a andar de bike pega gosto pela coisa, falando por experiência própria, e acaba vendo que é um lazer com uma prática física, então é um custo benefício muito bom.”