Gestores medianamente comprometidos com suas instituições, quando enfrentam crises sabem que o pior a fazer é ignora-las, as dificuldades não vão desaparecer se forem simplesmente negadas, pelo contrário. Qualquer texto básico de gerenciamento de crises e redução de seus danos recomenda que estas sejam vistas de frente, assumidas rapidamente as ações que possam controlar o mais urgente, analisada a questão com todos os envolvidos e tomadas as medidas possíveis; apenas após feito o melhor para que cessem ou diminuam razoavelmente as sequelas da crise é que se deve começar eventuais atribuições de responsabilidade por ela. E, no contato com pessoas prejudicadas ou atingidas, com a opinião pública, jamais adotar atitude arrogante, de acusação a terceiros ou fuga de responsabilidade. 

Saber pedir desculpas é também uma qualidade do gestor, pois culpar a “herança maldita”, a “sabotagem”, sempre leva à desconfiança e raiva daqueles que foram atingidos pela inabilidade ou negligência que causaram o prejuízo. Toda atividade humana é passível de erros, e a competência de quem a dirige reside em minora-los, em atentar para as etapas de cada processo procurando prever e sanar incorreções.

O Enem 2019 trouxe uma surpresa desagradável para quase seis mil estudantes. Um erro de associação de códigos em suas provas, atribuído à gráfica que as imprimiu, levou a discrepâncias entre os gabaritos de respostas e a matriz de correção; em consequência a nota divulgada não correspondia à que aqueles estudantes esperavam tendo em vista a análise feita por eles mesmos com base nos gabaritos divulgados após as provas.

O transtorno causado àqueles jovens, seus familiares e amigos, foi grande e veio em um momento estressante em suas vidas, quando estão procurando definir seu ingresso em curso superior. Mas considerando a questão com frieza estatística, é sempre possível efetuar uma nova correção assim que as causas do problema tenham sido detectadas, podendo em princípio ser reparado. É preciso considerar ainda que muitas instituições dependem totalmente desses resultados para completar suas turmas, designar professores e organizar o calendário escolar como um todo.

O Enem atingiu grande importância no sistema educacional do país, e embora esteja perdendo espaço como avaliador do ensino em si, sua relevância como acesso ao ensino superior não pode ser ignorada, representa a porta de entrada não apenas das instituições públicas mas também das privadas; a respeitabilidade conseguida pelas suas sucessivas edições convenceu até mesmo aquelas mais resistentes a assumir este exame como um vestibular válido.

O que marcou a atuação dos dirigentes educacionais envolvidos, no entanto, foi a arrogância, a negação liminar do erro e o descaso com os prejudicados. Apenas se começou a tomar providencias sérias quando o caso chegou às redes sociais e à besta-fera dos políticos, a imprensa. Entretanto, a pressa pareceu ser de publicar o resultado, fosse ele qual fosse, “livrar-se deste incomodo”, e não de efetivamente esclarecer a falha.

Pessoas praticamente sem conhecimento das áreas para as quais foram designadas, sem preparo técnico e tendo como qualificação apenas a ideologia e a amizade dentro de um certo círculo, provocam semanalmente severas crises no país, levando à suspeita de que trabalhando sério mesmo não temos muitos, a maior parte está criando factoides, ofendendo, dizendo disparates, efetuando dancinhas na chuva ou emulando nazistas.

Como estimular um aluno a estudar, dedicar-se com afinco a aprender uma profissão, colaborar com o desenvolvimento tecnológico e científico brasileiro neste mar de incongruências, atitudes toscas e desprezo pela cultura?

Escolas ensinam também que encarar suas próprias limitações é essencial, não apenas como formador do caráter mas igualmente como melhoria de desempenho nas futuras profissões. Avaliações são realizadas para verificação das fortalezas e fraquezas, e quanto mais rápido voltamos ao estudo, à correção das falhas, mais melhoramos.

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.