O mundo está doente. O homem está doente. O Brasil está doente.

Não estou falando do coronavírus, embora ele já tenha matado mais de 120 mil pessoas no mundo todo e mais de 1300 no Brasil. E a dengue? Também não estou falando da dengue, embora até metade de março já tenhamos mais de 300 mil casos confirmados no Brasil.

Não estou falando de doenças do corpo. Estou falando de outro tipo de doença.

Daquela que faz com que nos tornemos egoístas, daquela cujo principal sintoma é a falta de empatia e de amor ao próximo.

Esta doença mata mais que uma pandemia global. Mata mais que um vírus ou que uma bactéria. “Mata mais que bala de revórve”, diria Adoniran Barbosa. Esta doença não se previne com vacina ou se combate com máscaras.

De repente, acabamos nos encontrando em tempos estranhos. Vivemos como em um filme: fechados em casa, saímos protegidos e somente quando necessário. Vemos no noticiário países entrerrando seus mortos em caixas de papelão pois acabaram os caixões. Mães impedidas de irem ao velório do próprio filho, filhos impedidos de chorar os pais. São tempos estranhos.

Mas a pior doença é aquela que nos faz olhar somente para o próprio umbigo. Quando vemos homens dançando com caixões na maior avenida do país. Quando vemos pessoas públicas dizendo que “algumas mortes são aceitáveis para que a economia não quebre” percebemos que nossa doença é muito pior que um vírus.

Percebemos que chegamos em um ponto limite em que a morte “do outro” não nos afeta. Chegamos em um ponto de pessoas perguntarem na internet quantas mortes seriam aceitáveis para salvar a economia? Podemos devolver a pergunta: quantas mortes na sua família seriam aceitáveis? Se elas fossem de seus pais, filhos, avós ou tios, quantas seriam aceitáveis?

Para alguns (eu incluso) há uma ponta de esperança que possamos sair deste período de isolamento social melhores, repensando atitudes, vendo como a natureza está reagindo ao nosso confinamento. Mas a esperança de alguns é fraca diante da doença de outros.

Este vírus, que poderia ser uma espécie de wake up call, ou chamada de alerta, para o mundo, serviu para que acordássemos para esta outra doença, muito mais contagiosa e mortal. Essa doença que pode atender por diversos nomes: indiferença, descaso, falta de empatia. E que pode estar do nosso lado, tentando nos contaminar.

Sim, estamos doentes. E esta doença não tem vacina ou isolamento social que combata. Esta doença pode ser muito mais fatal que o coronavírus.

*Flávio Jayme é jornalista cultural, escritor e produtor de conteúdo digital em Curitiba