LEONARDO NEIVA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Falta de capacidade para analisar dados, distanciamento entre pesquisadores e órgãos do governo e priorização do transporte individual, em detrimento do coletivo, são alguns dos motivos apontados por especialistas para o baixo investimento feito em mecanismos de big data para gerenciar o trânsito no Brasil.
O termo big data se refere ao armazenamento de dados complexos e em grande quantidade. Por meio da análise estatística dessas informações, é possível identificar tendências, que podem ser usadas no busca de soluções ou no desenvolvimento de políticas públicas.
“No Brasil, não falta capacidade humana e técnica, mas sim um maior incentivo à cultura de análise de dados. Discussão com governo a partir de análises estatísticas hoje é algo que não existe”, afirmou o diretor-executivo da CNT (Confederação Nacional do Transporte), Bruno Batista.
As afirmações foram feitas durante debate sobre o uso de big data no trânsito no 2º Seminário Mobilidade Urbana, promovido pela Folha, com patrocínio do grupo CCR e da Uber, nesta segunda-feira (22), no teatro Unibes Cultural, em São Paulo.
Outro ponto de entrave apontado por Batista é a falta de incentivo ao uso do transporte coletivo no país. Segundo ele, sem que haja uma mudança na mentalidade pública a respeito da mobilidade, nem o uso da tecnologia será capaz de reduzir congestionamentos em grandes cidades. “As pessoas vão continuar paradas no trânsito, mexendo no celular e gerando dados.”
Aleksandro Montanha, sócio da empresa de tecnologia Seebot, concordou que o aumento do uso do transporte coletivo seria o melhor cenário para a melhora da mobilidade, mas também frisou a importância da aproximação da iniciativa privada e de pesquisadores do poder público para incentivar maior investimento na área.
O especialista defendeu o uso de mecanismos instalados em semáforos para captar informações sobre o trânsito, como saber se o pedestre está passando dentro ou fora da faixa, se há uma grande quantidade de veículos pesados ou leves circulando pela região ou analisar o fluxo de carros.
A partir desses dados, ele passaria a tomar decisões mais complexas de forma autônoma, como definir se o semáforo fica mais ou menos tempo aberto e até fazer autuações por infração de trânsito. O mecanismo já foi desenvolvido e testado pela Seebot na cidade de Maringá, no Paraná.
Montanha explica, no entanto, que apenas captar informações não é suficiente para criar uma tecnologia de big data eficiente. “O dirigente público precisa saber responder à pergunta: Para que vou usar isso? Vejo um cenário de muitas oportunidades para governo, pesquisadores e empresas privadas. Basta se organizarem, entenderem o que procuram e realizarem.”
PRIVACIDADE
A advogada Lilian Pires, coordenadora do programa de extensão MackCidade (direito e espaço urbano, da universidade Mackenzie), lembrou que também é importante cuidar da privacidade dos dados coletados no trânsito.
“Dados sobre os deslocamentos feitos com Bilhete Único são importantíssimos e podem ser usados pelo poder público para tomar decisões. Mas importa saber o RG e o CPF daquela pessoas? É essencial criar mecanismos que garantam a privacidade dos usuários”, afirmou.
Pires disse que o big data é bem-vindo, desde que priorize uma melhora da sociedade e que haja uma democratização do uso da informação coletada. Segundo ela, a população também deve ter consciência do motivo para o qual as informações serão utilizadas. “Isso evita o vandalismo, que muitas vezes acontece porque as pessoas têm medo de ser filmadas e não entendem para que servem aqueles dados.”