Divulgação/PRF

“Foi uma experiência horrível. Não desejaria isso nem para o meu pior inimigo.” A declaração é de Ana Maria (nome fictício), uma mulher curitibana de 22 anos de idade. Há cerca de um mês, ela conseguiu voltar ao Brasil após ter passado 20 dias em um país da Oceania, onde foi vítima de exploração sexual. Sem mostrar o rosto e com a voz alterada digitalmente, ela prestou um depoimento durante o 3º Seminário de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e ao Trabalho Escravo, na manhã desta terça (30) em Curitiba. Ela pediu para não ser identificada, nem revelou o país de onde conseguiu fugir porque a família não tem conhecimento dos fatos que aconteceram com ela.

Em outubro do ano passado, através de uma amiga, ela soube de uma oferta que a levaria a receber o equivalente a R$ 100 mil em 30 dias, trabalhando como garota de programa. Após cerca de oito meses de contato com a aliciadora, Ana Maria e a amiga embarcaram para a Oceania.

“Nos primeiros cinco dias, tudo parecia estar conforme o combinado. Mas, depois, nós nos deparamos com uma outra realidade”, conta Ana. “Não podíamos sair do motel, que ficava trancado. Eu era uma escrava sexual, sob ameaças 24 horas por dia.”

Quando ela começou a questionar a sua situação, passou a ser ameaçada com insinuações de que fotos íntimas poderiam vazar, e que os aliciadores sabiam onde a família dela mora.

“Um dia, consegui fugir em uma brecha deixada por um dos seguranças que nos acompanhava. Eu disse que iria em uma cafeteria ao lado do motel. Então consegui fugir com ajuda de um cliente. Ele foi nos buscar e fomos para um aeroporto próximo, que fica a três horas de viagem.”

Com formação superior e de família de classe média alta, atribui sua experiência à ganância. “Não foi por falta de informação. Tenho formação superior. Foi pela ganância de conseguir ganhar R$ 100 mil em 30 dias.” O fato de Ana dominar o inglês, língua falada no país onde estava, acabou por ajudar em sua fuga. Estudante universitária, a amiga dela também conseguiu voltar ao Brasil. O caso é investigado pela Interpol.

O evento – O Governo do Paraná quer a adoção de ações permanentes no combate ao tráfico de seres humanos no Brasil. Durante o 3º Seminário de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e ao Trabalho Escravo,, o secretário estadual da Justiça, Família e Trabalho, Ney Leprevost, disse que saber que em pleno ano de 2019 existem pessoas que estão sendo vendidas como se fossem mercadorias ou que são escravizadas é algo que deixa o país perplexo. “Precisamos unir a sociedade, polícias, secretarias de Estado, Governo Federal, e o Ministério Público, em torno de uma verdadeira cruzada nacional contra o tráfico de pessoas”, afirmou o secretário.

O superintendente da Polícia Rodoviária Federal no Paraná, Ismael de Oliveira, lembrou que o Paraná, por ser um Estado fronteiriço, representa um desafio aos órgãos de fiscalização e controle no combate a este crime. “As condições de vulnerabilidade das pessoas podem provocar graves consequências físicas, e até mesmo a perda da vida. Temos obrigação de levar as políticas públicas a essas vítimas”.

Neste primeiro dia de evento falaram também o pesquisador do Centro Internacional para o Desenvolvimento de Políticas Migratórias, Maurício Carlos Rebouças; e o procurador de Justiça, Olympio de Sá Sotto Maior Neto, coordenador do Centro de Apoio às Promotorias de Justiça de Proteção aos Direitos Humanos do Ministério Público do Estado do Paraná.

À tarde, houve o depoimento de uma vítima de tráfico internacional para exploração sexual e uma mesa-redonda com Olíympio Sá Sotto Maior Neto; o presidente da Comissão Regional de Direitos Humanos da Polícia Rodoviária Federal de Goiás, Fabrício Rosa; e a coordenadora do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas da Secretaria, Silvia Cristina Xavier. O mediador foi o jornalista Rogério Galindo.

TRABALHO ESCRAVO – O Seminário, gratuito e aberto a toda população, faz parte da campanha Coração Azul de Combate e Enfrentamento ao Tráfico Humano e está sendo realizado no auditório da Polícia Rodoviária Federal em Curitiba.

Confira a programação para esta quarta-feira (31), último dia do evento:

08h30 – Palestra Instalação da Coetrae no Paraná: desafios e perspectivas – Felipe Eduardo Hideo Hayashi, chefe do Departamento de Justiça, da Secretaria de Justiça, Família e Trabalho do Paraná.

08h50 – Palestra Ações de Erradicação do Trabalho Análogo ao de Escravo no Paraná – Luíze Surkamp, auditora fiscal do Trabalho, chefe da Seção de Inspeção do Trabalho no Paraná, – Ministério da Economia.

09h10 – Palestra Política Nacional de Erradicação ao Trabalho Escravo e sua Correlação com o Tráfico de Pessoas – Dante Cassiano Viana, coordenador-geral de Combate ao Trabalho Escravo, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos

09h30 – Mesa de debates e perguntas aos palestrantes.

10h30 – Palestra O Papel da Polícia Rodoviária Federal no Enfrentamento ao Trabalho Escravo – Luciana Duarte, instrutora de Direitos Humanos e presidente da Subcomissão Nacional de Valorização da Mulher na PRF.

10h50 – Palestra O trabalho escravo contemporâneo nas cadeias produtivas – Luercy Lino Lopes, procurador regional do Trabalho do Ministério Público do Trabalho no Paraná.

11h10 – Palestra Coibição do trabalho análogo ao escravo e promoção dos direitos humanos – Leonardo Vieira Wandelli, juiz titular da 5ª Vara do Trabalho de São José dos Pinhais-? Tribunal Regional do Trabalho do Paraná.

11h30 – Mesa de debates e perguntas aos palestrantes.