Franklin de Freitas – Velórios mantêm o rito e o respeito

Desde o início do ano, quando o novo coronavírus que provoca a Covid-19 cresceu de forma alarmante na China e começou a se esboçar uma pandemia, empresas do setor funerário do Paraná começaram a se mobilizar para o momento de crise, que agora atinge o território brasileiro. Preocupadas com o possível aumento da demanda e com o risco de contaminação, as funerárias e os cemitérios elaboraram um protocolo de procedimentos, que já está valendo no estado.

A diretora dos Crematórios Vaticano, Mylena Cooper, e a gerente administrativa da Funerária Jardim da Saudade, Fabiana Miranda explicam que esse protocolo segue recomendações dos órgãos sindicais e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Tratam-se, ao menos por ora, de instruções normativas, e não impositivas, que versam sobre como proceder nos velórios, preparação de corpos e cremações, por exemplo. Outra medida importante, cita ainda Miranda, é o reforço na utilização, pelos funcionários, de equipamentos de proteção individual (EPIs), como macacão, máscara, luvas e óculos.

“A principal recomendação é que o tempo de velório e o número de pessoas que participam sejam reduzidos. Os velórios, que antes viravam a madrugada, agora duram no máximo duas, três horas. Além de mais curto, também colocamos uma limitação de no máximo 10 pessoas na sala de despedidas, podendo revezar. Aos grupos de risco, a recomendação é que não compareçam. Caso seja alguém muito próximo do falecido, pedimos para que seja definido um horário específico para visitação”, explica Cooper.

“Algumas pessoas entendem e aceitam essas questões novas que estão chegando, mas ainda temos uma certa dificuldade em fazer com que as famílias entendam que os velórios têm de ser resumidos. É também uma questão cultural, um momento muito importante para as pessoas”, comenta a gerente do Jardim da Saudade.

Para além das novidades protocolares, o setor também já se mobilizou e garante estar pronto para um possível aumento da demanda por serviços. Miranda, por exemplo, relata que desde o início do ano, acompanhando o que ocorria em outros países, o Jardim da Saudade começou a oferecer treinamentos para sua equipe.

“Já era previsto que teria essa situação e nos preparamos. Temos equipes prontas para atender. Na área de atendimento e operação, outras pessoas que não atendem a área de frente, mas já têm conhecimento, estão sendo treinadas para que, caso essa demanda aumente, consigamos suprir. Estamos trabalhando com treinamentos internos”, explica ela.

Já a diretora do Vaticano comenta que o setor funerário brasileiro, em especial o do Paraná, é reconhecido nacional e até mesmo internacionalmente por sua qualidade e número superior de empresas em relação a outras unidades da federação, o que dá maior tranquilidade. “Esperamos que não aconteça o que houve na Itália, mas frente a um colapso (na saúde pública), o setor no Brasil é muito organizado e trabalha de forma colaborativa. Todas as empresas se ajudam nesse momento em prol da sociedade.”

Recomendações em caso de morte por Covid-19

Fabiana Miranda, gerente administrativo do Jardim da Saudade há 14 anos, reconta que há recomendações sendo seguidas para casos de morte não apenas por Covid-19, mas para qualquer óbito relacionado à síndromes respiratórias.

“Em casos de morte confirmada por Covid, não indicam procedimento de tanopraxia. Sai direto do hospital, é feita uma preparação mínima e vai direto para sepultamento, também não se indica velório. Caso a família insista, queira o velório, deve durar no máximo uma hora e com urna lacrada”, explica Miranda. “O caixão ficar fechado é a parte mais triste da despedida para esse tipo de óbito”, opina Mylena Cooper, diretora dos Crematórios Vaticano.

No caso de pessoas que não falecem necessariamente por conta do novo coronavírus, mas que tiveram como causa de morte doençlas do trato respiratório, a recomendação também é que o velório seja feito com urnas lacradas, até porque, em muitos casos, é necessária a confirmação dos exames para saber se a pessoa tinha ou não o vírus, e os resultados podem demorar a sair.

“No crematório, nos casos também com suspeita de Covid, doenças do trato respiratório, os corpos seguem direto para cremação. Normalmente fazemos cerimônia de despedida, mas foram suspensas para evitar aglomerações”, diz Miranda.

Velórios ao ar livre como forma de prevenção

O Cemitério Vaticano, de Almirante Tamandaré, começou nesta semana a realizar velórios ao ar livre para as famílias enlutadas, com estrutura montada no gramado do cemitério, numa tenda, com cadeiras, bancos e a base para a urna. A iniciativa foi uma forma de dar mais segurança aos enlutados, possibilitando maior distância entre as pessoas, e também permitindo um número maior do que 10 em uma sala fechada. A estrutura vai comportar um velório por vez, de até três horas. A despedida poderá ser feita em qualquer horário por conta de o cemitério realizar sepultamentos nos períodos noturnos, quando necessário.

“Sabemos que é um grande impacto, o velório é importante no processo de luto. Trem sido difícil conscientizar as pessoas, mas nosso desafio é acolher caso por caso e inovar para que as despedidas sejam mais curtas, seguras, porém grandiosas. Homenagear de forma mais rápida, porém significativa”, diz ela.

Além disso, o cemitério também tem à disposição um psicólogo para atender as famílias e já existe uma programação para após essa fase atípica, quando disponibilizará cerimônias de homenagens a todos os entes queridos que se foram nesse período e tiveram somente uma breve despedida.

“Nossa estrutura é muitas vezes superior à de muitos países”, diz Abredif

Na última semana, em entrevista à Agência Brasil, o presidente da Associação Brasileira de Empresas e Diretores do Setor Funerário (Abredif), Lourival Panhozzi, comentou que já foi identificado, a nível nacional, um crescimento acentuado no número de óbitos com causa morte identificada com as relacionadas ao novo coronavírus (síndromes respiratórias). Ainda segundo ele, a estimativa é que o país possa atingir o pico de 3,5 mil óbitos num único dia.

Apesar disso, garante que o setor está preparado e problemas como os ocorridos em outros países não devem se repetir por aqui, reforçando o que afirmam as funerárias do Paraná.

“Nossa estrutura instalada é muitas vezes superior à de muitos países, mas para que ela continue operacional é preciso que o Ministério da Saúde implante nosso protocolo. De nada adianta nossa estrutura física se nosso pessoal for afastado por contaminação”, argumenta Panhozzi referindo-se a um protocolo de procedimentos técnicos já encaminhado ao ministério.

A ideia, explica ele, é elaborar protocos unificados, o que facilitaria a sua implementação em todo o país, garantindo segurança aos trabalhadores do setor e à sociedade como um todo.