Reprodução – Fredson ao lado do guarda Alexandre Albuquerque

Fazer a coisa certa também pode ser algo extraordinário, ainda mais quando a ação é executada de maneira quase que ordinária por alguém que vive em condições extremamente desfavoráveis e que poderia beneficiar-se (financeiramente) da situação. E um episódio registrado nesta quinta-feira (16 de junho) em Curitiba é um exemplo disso.

Perto do horário do almoço, um cidadão chamado Fredson Pereira de Oliveira, de 21 anos, encontrou três aparelhos celulares (dois iPhones X e um iPhone 11) dentro de uma sacola que havia sido perdida na Rodoferroviária, na região central da cidade. Em vez de ficar com os aparelhos, procurou a Guarda Municipal para que o auxiliasse na procura pelo dono dos smartphones, numa situação que surpreendeu e comoveu os próprios guardas – até porque Fredson vive em situação de rua há sete meses na capital paranaense.

Responsáveis por atender a ocorrência e auxiliar Fredson, os guardas municipais Alexandre Albuquerque e Kleyton contam que estavam se deslocando pela Rua João Negrão, no Centro da cidade, quando foram abordados por Fredson. “O indivíduo chamou a equipe, a gente foi até ele e aí ele comentou que encontrou os celulares na Rodoferroviária, estava perambulando e não sabia se entregava nos Correios, onde ele teria de deixar, porque queria achar os donos. A gente notou que era um cidadão em situação de rua, até puxamos a ficha dele para ver se tinha alguma situação com a Justiça, mas estava tudo okay. E o que me chamou a atenção foi a honestidade dele. Porque os três celulares, somados, dariam tranquilamente uns R$ 10 mil vendendo no mercado negro e ele falou que queria fazer a coisa certa”, relata Albuquerque.

Em seguida, os guardas verificaram que os celulares estava desbloqueados e zerados, ou seja, sem qualquer conta. Um dos aparelhos, inclusive, ainda estava na caixa original, novinho em folha. “Através do IMEI [número de identificação dos aparelhos] tentamos identificar se tinha alguma situação de furto, de roubo, se tinha algum boletim de ocorrência, mas não encontramos nada. Alguém tinha perdido os iPhones, realmente”, conta ainda o guarda municipal.

Fredson, então, foi orientado para que deixasse os aparelhos no setor de Achados e Perdidos da Rodoferroviária, já que havia sido lá que ele localizou os iPhones. O homem, então, pediu para que os guardas o acompanhassem para que ele pudesse entregar o aparelho, e foi o que eles fizeram, como se pode ver num dos vídeos abaixo.

“A gente lida com pessoas em situação de rua o tempo inteiro e sempre lidamos com pessoas que estão furtando, que estão roubando, muitas vezes para sustentar o vício. E o que nos chamou a atenção foi a honestidade dele, um menino novo, de 21 anos, em situação de rua. Confessou pra gente que é usuário, mas que não rouba, não furta, só pede dinheiro pras pessoas mesmo. Acompanhamos ele até a rodoviária e lá ele entregou os iPhones. Depois fiz um vídeo, parabenizei a atitude dele de honestidade, que nos dias de hoje é coisa rara, ainda mais em se tratando de pessoas em situação de rua, que muitas vezes são discriminadas”, comenta Albuquerque.

Sete meses em Curitiba e sete meses vivendo na rua

O Bem Paraná ficou sabendo da história de Fredson através de um dos vídeos gravados pelo guarda Alexandre Albuquerque. E depois de conversar com a equipe da GM, a reportagem foi até a rodoviária atrás do próprio Fredson, para que ele pudesse contar sua história.

Nascido em Itaberaba, na Bahia, o homem de 21 anos está vivendo há sete meses em Curitiba, praticamente todo esse tempo vivendo na rua. “Tem alguns dias que eu consigo um dinheiro e daí vou para um hotel, mas não é sempre. Quem vive na rua é assim: se a gente consegue para hoje, amanhã já tem de voltar pra rua para matar outro leão de novo”, diz ele, que costuma ficar próximo do Banco Bradesco, de frente para a Rodoferroviária, junto de outras pessoas em situação de rua. “Ali é um lugar tranquilo e o pessoal me recebeu bem”.

Sobre os celulares, ele conta que estava na Rodoferroviária quando notou numa sacola largada no chão, sem ninguém por perto. Se aproximou e pegou a sacola. Esperou para ver se alguém se manifestava, protestava, mas nada aconteceu. “Eu saí então com as sacolas e depois fui ver que tinha três celulares lá dentro. Até pensei em ficar com um para mim, mas não era o certo a se fazer”, diz Fredson.

Artista circense, ele sobrevive com o dinheiro que ganha nos semáforos curitibanos, onde faz malabarismos e também algumas apresentações pirotécnicas. O que ele queria mesmo, porém, era conseguir um emprego fixo para ter alguma estabilidade e poder alugar uma residência. “Eu queria trazer meu filho, que tem um ano e meio, e a minha esposa para cá, mas não vou trazer eles para viverem na rua, que é difícil, ainda mais que Curitiba é muito frio”, afirma.