Nos últimos meses, poucos assuntos foram tão discutidos no Brasil quanto as políticas nacionais referentes ao meio ambiente. Para deixar o tema ainda mais em evidência no país, a cidade de Salvador (BA) acaba de sediar a Semana Latino-Americana e Caribenha sobre Mudança do Clima, realizada entre os dias 19 e 23 de agosto pela Organização das Nações Unidas (ONU). Em pauta, discussões sobre o aumento do desmatamento e as queimadas na floresta amazônica e, também, a suspensão de doações para o Fundo Amazônia, anunciada recentemente por Alemanha e Noruega.
O encontro na Bahia foi um dos eventos preparatórios da COP 25, que será realizada em dezembro, em Santiago, no Chile, após o Brasil anunciar, no final de 2018, sua desistência em sediar o evento. O objetivo do COP 25 é debater sobre a implementação do Acordo de Paris, que visa o combate às mudanças climáticas. Para enriquecer a discussão, devemos ir um pouco além das políticas e analisar o cenário de urgência demonstrado pelo relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), divulgado no dia 8 de agosto. Para o estudo, foram reunidos mais de 100 cientistas de 52 nações que, em uníssono, alertam para a questão da produção de alimentos que deverá saciar uma população projetada, para 2050, de 9,7 bilhões de pessoas, segundo a ONU.

O relatório analisa as relações das mudanças climáticas sob quatro pilares: Redução do desmatamento florestal; Produção sustentável de alimentos, com foco no cultivo das principais commodities agrícolas (soja, milho, trigo) e proteínas (carnes, leite e seus derivados); A necessidade de se investir em reflorestamento para sequestro de carbono; e Adoção de biocombustíveis. Quando o solo é degradado, por exemplo, ele se torna menos produtivo: a cada elevação de 1 grau na temperatura do planeta haverá a redução de 7,4% na produção do milho, 6% na de trigo, 3,2% na de arroz e 3,1% na de soja.
Com base nesses dados é que governantes irão se reunir com o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, em uma reunião convocada pelo próprio secretário para 23 de setembro, em Nova York, denominada de Cúpula de Ação Climática. A nomenclatura não poderia ser mais acertada, pois traduz o recado que Guterres enviou direto aos governantes: ele pede que as iniciativas apresentadas sejam implementáveis, escaláveis e replicáveis. Atendendo ao chamado de Guterres, o Pacto Global desafiou CEOs de todo planeta a estabeleceram metas ainda mais ambiciosas para suas empresas: que estejam alinhadas ao relatório para que a temperatura da terra não ultrapasse 1,5º C até o ano 2100. Acredito no poder das organizações em sensibilizar, influenciar e engajar para o desenvolvimento sustentável nos negócios. Assim como o governo, os empresários também devem assumir a posição de líderes na adoção de iniciativas e práticas inovadoras de sustentabilidade.

A integração do público e do privado para uma gestão mais sustentável é possível. Vancouver, no Canadá, tem 600 mil habitantes e mira metas ambiciosas para se tornar mais verde até 2020. Na gestão de resíduos e recicláveis, segundo dados de 2018, a cidade possui a meta de resíduos zero até 2040. Projetando um futuro mais próximo, a comunidade se empenha para chegar a 2020 com redução de 50% dos resíduos produzidos em 2008, quando cerca de 500 mil toneladas acabavam nos lixões da cidade. Desde então, Vancouver já reduziu 27%. A cidade pode ser citada, também, como modelo no planejamento em mobilidade urbana, com a maior frota da América do Norte de carros de aluguel, na modalidade de carros compartilhados, que resulta em 25% dos usuários terem deixado de ter carro próprio, contribuindo para diminuir o trânsito e a poluição. Além disso, a comunidade é incentivada para utilizar modais de transporte alternativos como bicicletas, transporte público e, até mesmo, a tradicional caminhada.
Assim como Vancouver, podemos notar vários exemplos de boas e inovadoras práticas em sustentabilidade ao redor do mundo: Zurique (Suíça), Singapura (República de Singapura), Estocolmo (Suécia) e Viena (Áustria). Desta forma, o apelo do secretário-geral da ONU para que governantes apresentem soluções concretas nas próximas Cúpulas é algo que só será possível com uma comunhão de interesses entre o público e privado. Não há mais tempo, o momento clama por proposições de planos concretos e realistas.

Neste momento, uma educação voltada para que líderes sejam agentes de transformação é indispensável. Reforço que os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) terão resultados mais alcançáveis se fizerem parte de uma ação clara e objetiva nas escolas de negócios e das universidades de todo planeta. Dessa maneira conseguiremos articular, engajar e formar líderes globalmente responsáveis, comprometidos com as ambiciosas metas para mitigação dos efeitos das mudanças climáticas. Esses líderes possuem o conhecimento para enriquecer os debates e auxiliar governantes e comunidades a traçarem objetivos estratégicos pautados em soluções implementáveis.
Norman de Paula Arruda Filho é Presidente do ISAE Escola de Negócios e Coordenador do Comitê de Sustentabilidade Empresarial da Associação Comercial do Paraná (ACP).