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Os profissionais da área de saúde, que atuam na linha de frente no combate à pandemia do novo coronavírus (Covid-19), reclamam da falta de materiais e condições adequadas para o tratamento dos pacientes que chegam à rede pública com suspeita de terem sido infectados pela nova doença. Conforme os relatos ouvidos pela reportagem, o principal problema é a falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) adequados para a proteção dos médicos e enfermeiros. Além disso, também denunciam a exposição de pacientes nas Unidades de Pronto-Atendimento (UPAs), com a mistura de pessoas suspeitas de terem sido infectadas pelo coronavírus com pacientes que apresentam outros problemas de saúde, o que aumenta o risco de contágio.

Uma das fontes, um médico, relata ao Bem Paraná que faltam máscaras e jalecós adequados para os profissionais de saúde atenderem pacientes suspeitos de terem sido contagiados pela nova doença. “Se parar qualquer ambulância, vai ver que não estamos usando máscara adequada, o material não é adequado. Hoje a noite teve médico que se recusou a atender (pacientes com suspeita de coronavírus) por não ter material. Aí teve de deslocar outra ambulância, é tempo perdido”, conta a fonte, que pediu sigilo de sua identidade.

Ainda segundo esse profissional, os médicos e enfermeiros estão tendo de usar máscaras cirúrgicas e os jalecós que utilizam regularmente no atendimento, quando deveriam estar utilizando máscara N95 e aventais contra gotículas.

“É falta de compreensão. A desculpa é que não tem (esses materiais), mas não é tanta coisa assim (que os profissionais precisam). É falta de conduta mesmo e nem temos muita voz também. Nosso grupo de WhatsApp foi fechado pros médicos não falarem. Só os administradores falam. Então não tem discussão, mas sabemos que têm condutas erradas”, reclama o médico. 

Outra situação levantada diz respeito à exposição dos pacientes que buscam atendimento nas UPAs da cidade. O relato é de que, com todo mundo na porta dessas unidades de saúde, as pessoas acabam se expondo e podem acabar virando os transmissores do coronavírus. “Está misturando pacientes que não deviam estar lá com casos suspeitos (de coronavírus). E ninguém está escutando o que estamos pedindo, que não é roupa de astronauta, mas o básico: máscara N95, controle do fluxo nas UPAs”, relata um médico, enquanto outro colega reforça a preocupação.

“Encaminhamento segue o protocolo da prefeitura aqui em Curitiba. UBS, UPAS e hospitais são referências, dependendo do caso do paciente. Porém, não foi aberto um plano plausível para evitar o contato do paciente suspeito com os outros pacientes crônicos, o que é uma grande preocupação internacional. Não há cobrança de uso de EPI, inclusive os estoques de EPI e álcool 70% estão no fim nas UPAs.

Os profissionais de saúde ainda relatam que o clima entre enfermeiros e médicos é péssimo por conta dessa situação. “Todo mundo tem medo de voltar para casa, porque vamos pôr em risco nossos familiares. Mesmo (em caso) assintomático, podemos ser transmissores”, afirma um deles. “Penso que em pouco tempo também teremos diversos profissionais de saúde contaminados e a assistência também será prejudicada por falta de contingente”, opina outro.

DEMANDA CRESCEU MAIS DE 50%

Outro médico ouvido pela reportagem relata que a demanda de atendimento pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) cresceu entre 50 e 60% nas últimas semanas, apenas em Curitiba e Região Metropolitana. “Estamos com aproximadamente 1,5 ou 1,6 mil ocorrências ao dia em Curitiba e região metropolitana, quando o normal era de 850 a 950 atendimentos. Os quadros respiratórios aumentaram sensivelmente a porcentagem de chamados ao Samu, mas o sistema de saúde já estava saturado nas últimas semanas pela demanda normal nos deparamentos de emergência (UPAs e ambulâncias, principalmente”, explica o profissional.

Ainda segundo ele, os sintomas respiratórios não somam a maioria dos atendimentos. “Exacerbações de doenças crônicas, causas cardiovasculares e emergências psiquiátricas ainda somam a maioria dos atendimentos.”

NOTA DO SINDICATO E CASO DE MÉDICO INFECTADO

Nesta semana, o médico Jamal Munir Bark, que atende no município de Rio Branco do Sul e na UPA do Boqueirão, testou positivo para o COVID-19. Ele está internado no Hospital Marcelino Champagnat, em Curitiba, entubado em ala de isolamento. O caso seria grave, segundo relato do Sindicado dos Médicos do Estado do Paraná (Simepar).

Em nota publicada na página oficial do Simepar no Facebook, a categoria reclama que “colocar profissionais de saúde para atender COVID-19 sem EPIs é mandá-los para a morte!”. De acordo com o Sindicato, vários médicos das UPAs de Curitiba e Região Metropolitana estariam reclamando da falta ou inadequadão dos EPIs que estão recebendo.

“Máscaras do tipo cirúrgicas não promovem a proteção necessária. Os profissionais de saúde não estão recebendo óculos de proteção e apenas o jaleco branco os deixa totalmente desprotegidos – expondo também suas famílias à contaminação pelo coronavírus”, diz a nota.

Ainda segundo o sindicato, a situação em Curitiba e região pode acabar se tornando uma repetição do que já aconteceu em Portugal, onde 20% dos infectados pelo novo coronavírus são são médicos, com mortalidade elevada. “Não aceitaremos que esta estatística desastrosa se repita! O Simepar exige que os equipamentos adequados sejam fornecidos e orienta os médicos a não atender pacientes com sintomas respiratórios sem estar adequadamente protegidos!(…) Expor trabalhadores a risco de vida sem os EPIs necessários é um crime”, afirma ainda o sindicato, na nota já referida.

GUARDA MUNICIPAIS TAMBÉM ESTÃO EXPOSTOS

Depois da publicação da reportagem, a equipe do Bem Paraná também recebeu relatos sobre a situação de Guardas Municipais (GMs) que atuam nos postos de saúde da cidade. Um deles, inclusive, teria apresentado sintomas de gripe (tosse, dor no corpo e de cabeça) e, ao buscar atendimento no Hospital Vita, testou positivo para Covid-19. Além disso, haveriam pelo menos outros dois casos suspeitos entre guardas da cidade.

“Nosso GMs estão trabalhando nas UPAs em situação pior, pois eles que estão fazendo o primeiro contato com os usuários do sistema, em especial quando ficam aglomerados, acompanhando ou visitando pacientes”, relatou uma fonte à reportagem.

PREFEITURA PEDE PARA PROFISSIONAIS DE SAÚDE NÃO ENTRAREM EM PÂNICO…

Em entrevista concedida ao Bem Paraná no começo da tarde desta sexta-feira (20 de março), a superintendente executiva da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), Beatriz Nadas, pediu aos profissionais de saúde para que não entrem em pânico. “Primeiro papel é não entrar em pânico, porque está todo mundo em polvorosa, cada um imaginando uma catástrofe cada vez pior. Profissional de saúde tem de ter segurança e tranquilidade, ele é quem vai socorrer as pessoas que vão precisar de auda nesse momento”, afirmou Nadas.

Ainda segundo ela, a gestão da saúde no município tem tomado providências de forma escalonada e cumulativa. Dessa forma, para cada tipo de intervençã tem um tipo específico de máscara que os profissionais de saúde devem usar, enquanto a utilização de óculos de proteção é recomendada para todos os atendimentos.

“A máscara, quando atende casos suspeitos, usa uma máscara especial, com maior poder de filtração. Essa máscara é usada quando vai fazer coleta de material, exame de faringe, atendimento odontológico de emergência… Aí usa a máscara bico de pato, como chamam popularmente, que é indicada nesse contato muito próximo ao paciente. Noutros atendimentos e procedimentos, é a máscara cirúrgica (que deve ser usada).”

… MAS ADMITE DIFICULDADES PARA CONSEGUIR INSUMOS

Ainda de acordo com a superintendente-executiva da SMS, o grande problema hoje tem sido conseguir repor o estoque de insumos e equipamentos de proteção individual. Ela explica que desde o começo do ano o município procurou reforçar os estoques de produtos necessários para combate à pandemia de coronavírus. Com a decretação de situação de emergência em saúde pública em Curitiba, o regime de compra foi facilitado. Mas aí vem outro problema: cadê os insumos?

“A máscara de três camadas (de proteção), temos uma entrega de 185 mil máscaras, que deveriam ter sido entregues em 3 de março. Fizemos a compra em janeiro, ainda no regime tradicional de compra. O fornecedor tinha de entregar em 3 de março, mas não fez essa entrega. Notificamos, intimamos, ele não entregou. Enquanto ele não entrega, fomos atrás de outros fornecedores e estamos com muita dificuldade de aquisição”, relata a especialista.

Nadas conta ainda que o valor para aquisição das máscaras, fechado ainda em janeiro, foi de R$ 2,95 para a caixa com 50 unidades. “Agora, porém, os fornecedores já dizem que não tem (o produto), e quem tem cobra R$ 200, R$ 300, R$ 400 (a caixa). Temos orçamento disso. É uma situação muito difícil”.

Outro relato dela é com relação a um carregamento de álcool-gel, que deveria chegar nesta semana em Curitiba. No entanto a fornecedora, que é de Minas Gerais, foi proibida pelo governo mineiro de destinar a produção para fora do estado. “O governador de Minas Gerais não deixa (os carregamentos) sair de Minas, está destinando a produção deles para eles, que também estão pecisando. Nossa felicidade é que O Boticário está fazendo uma doação de tonelada de álcool gel, o que é essencial para nós. Os preços ficaram nessa loucurada, e nem é só o preço, mas não tem o insumo.”

Por fim, Beatriz Nadas ressalta que o município ainda possui estoque dos itens, ou seja, há material para ser fornecido às equipes. “Estamos fazendo uso disciplinado. Se for usar máscara bico de pato para todos os atendimentos…”

DEMONSTRAÇÃO DE APOIO E GRATIDÃO

Internautas brasileiros organizam uma manifestação inédita para esta sexta-feira (20 de março). No lugar de bater panelas, a promessa é de aplausos a partir das 20h30, num ato de apoio e demonstração de gratidão aos profissionais de saúde, que fazem a linha de frente de combate à pandemia do novo coronavírus (Covid-19). E Curitiba também está nessa.

“Enquanto estamos protegidos em casa, os profissionais da saúde estão enfrentando essa crise onde muitos estão se contaminando”, diz o comunicado. “Vamos mostrar nossa gratidão a todas essas pessoas com uma salva de aplausos das nossas janelas dia 20”, completa.

CONFIRA, NA ÍNTEGRA, A NOTA DIVULGADA PELO SINDICATO DOS MÉDICOS DO ESTADO DO PARANÁ

“Colocar profissionais de saúde para atender COVID-19 sem EPIs é mandá-los para a morte!

O Simepar tem recebido diversas queixas dos médicos das UPAs de Curitiba e da região metropolitana quanto à falta ou inadequação dos EPIs que estão recebendo.

Máscaras do tipo cirúrgicas não promovem a proteção necessária. Os profissionais de saúde não estão recebendo óculos de proteção e apenas o jaleco branco os deixa totalmente desprotegidos – expondo também suas famílias à contaminação pelo coronavírus.

Hoje tivemos notícia de que um médico estaria internado em estado grave na UTI, com sintomas de insuficiência respiratória compatíveis com infecção causada por coronavírus.

Esta situação repete o recém ocorrido em Portugal, onde 20% dos infectados pela COVID-19 são médicos, com mortalidade elevada. Não aceitaremos que esta estatística desastrosa se repita!

O Simepar exige que os equipamentos adequados sejam fornecidos e orienta os médicos a não atender pacientes com sintomas respiratórios sem estar adequadamente protegidos!!!

O Simepar deseja que o colega internado tenha boa evolução e que em breve possa ter alta, e solicita aos médicos que enviem fotografias e vídeos com os EPIs que receberam (ou a falta destes) para que possamos tomar as medidas judiciais adequadas. Expor trabalhadores a risco de vida sem os EPIs necessários é um crime.”