O que restou da “febre Orkut”? A comunidade virtual mais famosa do Brasil completou três anos de existência este mês e já deixou de ser novidade há um bom tempo. Mas nem por isso os brasileiros abandonaram o site. Hoje, são nada menos que 23 milhões de perfis que dizem ser do País. Não que o site seja adorado por todos. Não faltam críticas dos usuários ao excesso de spams, à superlotação dos grupos de discussão, que atrapalham a troca de idéias, e à superexposição que as conversas públicas do Orkut trazem. Também não faltam polêmicas. Desde 2005, o site se tornou alvo de denúncias de diversos crimes que estariam ocorrendo em grupos e perfis. Racismo, pedofilia, venda de drogas, entre outros, cometidos por usuários mal-intencionados, levaram até os donos do serviço, o Google, a prestar esclarecimentos à Justiça brasileira.

Mesmo com tudo isso, usuários como Vinícius Fiorentino, 25 anos, não se afastam do site. “Depois de todos os problemas do Orkut, tomo mais cuidado para não me expor “, diz. “Mas não quero sair. Todos que conheço estão lá: amigos, pais, irmãs…”

Vinícius tem um motivo a mais para ser fiel ao Orkut. Foi no site que ele conheceu sua noiva, Bruna Severiano, 20 anos. “Fucei o perfil dele, me identifiquei e mandei um recado. Deu certo”, diz Bruna, que está grávida de cinco meses. O cupido virtual foi tão eficiente que, em dezembro, vai ter casório. “O Orkut faz parte das nossas vidas”, diz Vinícius.

COMPREENSÃO

Para entender o sucesso e a longevidade do site no Brasil, o Google encomendou um estudo. Segundo a pesquisadora da Universidade Católica de Pelotas, Raquel Recuero, a permanência do site no gosto dos brasileiros se deve à popularização que a página teve. “É o que se chama de efeito de rede. Ao atingir uma massa crítica, há estabilização: todos ficam lá porque todos estão lá”, diz.

Quando o assunto é comunidade virtual, o Brasil foge às regras do resto do mundo. Para começar, o País é um dos poucos em que o Orkut vingou. Além disso, por aqui não houve, em três anos, uma debandada contínua de usuários de um site de relacionamentos para outro, o que já ocorreu nos EUA e na Europa. No que somos diferentes? “É a própria questão cultural”, diz o pesquisador Theophilos Rifiotis, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). “O MySpace (comunidade popular nos EUA), por exemplo, é mais voltado para a música. Já o Orkut tem muitas ferramentas para conversa entre usuários. E os brasileiros gostam muito de estar em contato”, diz.

O próprio visual do Orkut é uma das explicações da adesão e longevidade do site.”Ele possui uma interface amigável ao Brasil”, explica a pesquisadora Maria Bretas, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). “E quando foi lançada a versão em português facilitou ainda mais.” Essas características aliaram-se a um ingrediente que deu um toque final para o site ganhar em cheio os brasileiros: só entrava quem tinha convite. “Os usuários gostaram dessa exclusividade”, diz o pesquisador do Ibope Inteligência, José Calazans. “Como o brasileiro é muito social, ele precisa se integrar às coisas que estão na moda. Não ser convidado para o Orkut significava quase como não ter amigos. Todo mundo corria atrás de um convite.”

PERFIS

Foi assim que o site chegou aos atuais 23 milhões de perfis brazucas, 58% do total. Nem depois de surgirem outros sites parecidos, além da demora causada pela superlotação, denúncias de crimes e problemas como spam, os brasileiros abandonaram a comunidade. “Pela disseminação, esses problemas não afetam a popularidade”, constata Calazans.

Mas por que tanta devoção, mesmo após três anos? “O Orkut cresceu muito e concentra muitos brasileiros. Ninguém sai pois os amigos estão lá e é possível xeretar a vida dos outros. É uma zona estável, difícil de quebrar”, diz a pesquisadora Raquel Recuero, que estudou o Orkut sob encomenda do Google, dono do serviço.

Se a maioria dos usuários não abandona o site, o Orkut já dá sinais de estagnação. De acordo com Raquel, o número de brasileiros que se cadastra hoje está diminuindo. “Há uma estabilidade e uma quantidade de usuários que sai e entra a cada mês”, diz. “Muitos já fizeram três ou quatro perfis, sempre ‘matando’ um, saindo do sistema e, depois de um tempo, retornando.”

Essa característica de fidelidade dos “orkuteiros” já chama a atenção. E dá lucro. O consultor de Marketing Bruno Unger, 25 anos, descobriu no site uma forma de, ao mesmo tempo, trabalhar e ter tempo para surfar. “Tenho 200 grupos de discussão e divulgo eventos através deles. Ganho por isso e trabalho só três horas por dia.”

O grande negócio de Unger aconteceu no início do mês. Ele prestou uma “consultoria” à rede de comunicações do Sul RBS e embolsou R$ 2 mil. “Passei o controle do grupo ‘Eu amo Floripa’ para divulgar um evento”, conta. “Onde tem muita gente, sempre tem trabalho. E o Orkut é ‘o’ lugar.”