Caetano Veloso elogia numa bela música sua antiga professora de português, segundo ele “uma negra linda, nobre, a mais exigente – para passar por ela precisava saber muito português”. Ele se orgulha de ter tirado dez, e anos depois a homenageou numa linda canção.

Possivelmente esta mestra representa alguém que se superou e tentou estimular a superação de outros, vencendo as limitações com dignidade, superando discriminações vindas da pobreza, da ignorância, do racismo, mostrando a beleza da linguagem e o quanto vale a pena aprofundar conhecimentos sobre ela.

Da parte do autor e compositor que tem hoje total domínio das palavras em prosa e verso, é a declaração de que, sem um bom professor, severo, mas que o fez conhecer seu idioma corretamente, dificilmente seria quem é. Num tempo em que muitos julgam que a grande qualidade de um professor é apenas ser “bonzinho”, confundindo os conceitos, ou seja, trata-se de alguém disposto a preservar a autoestima do aluno sem transmitir nenhum novo conhecimento que possa demonstrar sua fraqueza em determinada área, é reconfortante pensar que ainda podemos discernir um educador exigente como formador de um bom cidadão.

Voltado a estabelecer relações, inovar nas diferentes formas de solucionar problemas, trabalhar dando significado aos conteúdos, com afetividade e coerência, mostrando que aprender é bem mais que memorizar respostas e tirar boas notas, valorizando o desempenho frente aos resultados dos exercícios e atividades, desenvolvendo conceitos e atitudes diante da vida em comunidade, o verdadeiro orientador dos estudos faz bem mais do que tratar um aluno como um ser frágil e indefeso que precisa ser preservado numa redoma.

As interações entre alunos e professores formam a história da relação com o saber, que é construída num meio permeado ao mesmo tempo pelo cognitivo e pelo afetivo, onde exemplos de postura e conhecimento são narrados diariamente para criar o arcabouço das práticas profissionais e pessoais que nortearão a vida futura do aluno. Aprender exige esforço, resiliência e bastante estudo, não é exatamente como um passeio no parque, embora até isso possa estar também incluído no processo.

Evidentemente escolas devem ser ambiente dinâmico e diversificado, promotor de conhecimento, mas também constituir-se local de socialização, no qual amizades, discussões, competições, jogos, simulações e todas as formas de representações da convivência entre professores e alunos, nos seus aspectos de motivação, afetividade no relacionamento, moralidade, didática, conteúdos, irão interferir tanto na aprendizagem quanto no ensino. No entanto, algumas renuncias estarão incluídas neste percurso: tempo envolvido com os livros e elaboração de exercícios, alguma frustração quando itens que pareciam perfeitamente dominados não se mostram tão fáceis quanto pareciam de imediato.

A qualidade e o alcance de nosso raciocínio, a elaboração de nossos pensamentos é influenciada pelo meio, pelo saber adquirido no contato e vivência com aqueles que nos cercam, pelo ambiente social, pela qualidade implícita e/ou explícita do sistema educacional, evidenciando que cognição e cultura são fatores interligados. Alguns aspectos culturais nos chegam simplesmente pela vida diária, como gastronomia, vocabulário rotineiro, formas de lazer; entretanto outros como a literatura regional ou mundial, a capacidade de elaborar pensamentos complexos, dependem de esforço dedicado, fato que quase sempre contraria as convicções de facilidade que parecem imperar hoje.

Conhecimento deriva da compreensão e interiorização das informações que recebemos de várias fontes (família, livros, jornais, redes sociais, professores, filmes…), e, muito mais do que o mero acúmulo de dados, é o processamento desses dados, a avaliação de sua veracidade, relevância e pertinência. É fundamental saber pensar, e para isso o processo educativo é muito importante, em todos os níveis.

Um homem feito, um compositor consagrado, um profissional de sucesso homenageia uma professora, e percebe sua importância em sua constituição como ser humano. Um bom professor amplia a potencialidade de cada aluno, o faz querer ser melhor e mais completo em sua existência.

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.