Franklin de Freitas – O caldo de cana na Prau00e7a das Nau00e7u00f5es

Curitiba tem hoje1.214 vendedores de comércio ambulante ativos junto à Secretaria Municipal de Urbanismo, número levemente inferior ao verificado no ano passado, quando haviam cerca de 1,3 mil cadastros ativos. Mas os dados oficiais, aparentemente baixos, não dão conta da crescente informalidade no mercado de trabalho, com cada vez mais pessoas encontrando no comércio de rua uma forma de garantir renda e sustento.
“A crise faz aumentar a informalidade, os irregulares. Se a pessoa perde o emprego, vai para a rua vender alguma coisa sem se informar muito a respeito. Ela não busca de primeira a formalização (do negócio), mas a solução do problema dela”, explica Jussara Policeno de Oliveira Carvalho, diretora de fiscalização da Secretaria de Urbanismo.
Por mês, segundo informações da própria Prefeitura, de 15 a 20 contratos de permissão são analisados por equipes da pasta, número considerado muito baixo por Jussara. “A procura pela regularização tinha de ser muito maior. Se andar pela cidade, e nem precisa ser no Centro, é só pegar as vias de acesso, as vias principais, ruas de ligação dos bairros e próximos a terminais, você vai ver muita gente vendendo nas ruas”, aponta.
Embora não exista uma estimativa precisa, no começo do ano passado o então secretário de Urbanismo, Marcelo Ferraz César, chegou a apontar que seriam cerca de 3 mil os ambulantes irregulares na Capital. Levando-se em consideração que a informalidade está em alta, não seria exagero, então, imaginar que o número real de ambulantes na cidade seja maior ainda.
Informações do IBGE, inclusive, reforçam essa possibilidade. É que no Brasil o número de pessoas que ganham o sustento como ambulantes de alimentação saltou de 253,7 mil em 2016 para 501,3 mil no final do ano passado. Em 2015, quando a atividade começava a dar sinais de que seria uma das principais alternativas à crise, esse patamar rondava os 100 mil.

O fundamental é ter bom papo e higiene, diz ambulante 
Em Curitiba, a maior parte dos ambulantes regularizados trabalham com cachorro-quente, caldo de cana ou pipocas. E um dos pontos mais tradicionais da cidade para matar a sede fica na Praça das Nações, no Alto da XV, onde há 24 anos trabalha Gicélio Sturião, 62 anos, e sua esposa, Elídia.
“Provavelmente o ponto de caldo de cana mais antigo da cidade é o meu. Estou há 24 anos no ponto e meu cunhado ficou 21 aqui. Hoje sou eu e minha esposa que cuidamos do negócio”, conta Gicélio. “Estava desempregado na época e ele (cunhado) falou em passar para mim o ponto. Aceitei e já são 24 anos de domingo a domingo aqui. Só não venho em dias de chuva”, complementa.
Atualmente atendendo a terceira geração de clientes (“quem vinha criança hoje já está trazendo os filhos”, relata), ele comenta que a concorrência tem crescido nos últimos anos, mas nada que o atrapalhe. “O pessoal fica desempregado e aí tem de se virar. Mas minha clientela só cresce”, comemora.
O sucesso, segundo ele, é fruto de trabalho. “(O segredo) é ter bom papo e boa higiene. Principalmente higiene, que é o essencial, o começo de tudo. E também tem de ter disposição para trabalhar, não tem essa de ‘hoje está meio frio’. Tem de estar todo dia no ponto. E, claro, aqui também sempre tenho caldo de cana bom, gostoso.”

Prefeitura abre edital com 27 vagas abertas para Centro
Para quem está atrás da oportunidade de trabalhar como ambulante em Curitiba, a Prefeitura abriu seleção para o Centro da cidade. São 27 vagas em mais de 10 ruas e avenidas e as inscrições devem ser feitas até o dia 28 de agosto, na Rua da Cidadania da Matriz, no Núcleo da Secretaria Municipal do Urbanismo, na Praça Rui Barbosa. No local, inclusive, há plantão todas as tardes para orientação e para tirar as dúvidas da população em relação ao que é permitido ou proibido no comércio de rua. 
Parte das vagas disponíveis para o Centro são para a comercialização de produtos de couro, confecção e bijuterias. A outra modalidade é alimentação, com quatro vagas para pipoqueiro, dois para doces secos industrializados, uma para frutas e verduras e outra para caldo de cana.
Uma das regras para ocupar as vagas é de que a mercadoria seja legalizada e, em caso de comércio de alimentos, além de se conhecer a origem, o interessado deve ter curso de manipulação de alimentos, para evitar a contaminação. A análise para autorização da atividade também leva em consideração itens como o tempo de moradia no município, o tempo de atividade em Curitiba, a situação habitacional e o grau de instrução do interessado.

Sindiabrabar diz que aumento no número de ambulantes é fruto da alta carga tributária

A carga tributária cada vez mais pesada, aliada a outros fatores como fiscalizações direcionadas, fez disparar o número de vendedores ambulantes irregulares no país. A avaliação é do presidente do SindiAbrabar e da Abrabar, Fábio Aguayo, ao analisar os dados revelados pelo Bem Paraná sobre a informalidade em Curitiba. 

"Este aumento de ambulantes irregulares pode ser resultado da falta de política de incentivo ao empreendedorismo, mas é reflexo direto do aumento da carga tributária", destacou Aguayo. A Substituição Tributaria, segundo ele, "é cada vez mais nefasta". Os dados da Secretaria de Urbanismo revelam uma pequena queda no número de vendedores ambulantes em relação ao ano passado, quando aproximadamente 1,3 mil estavam cadastrados.

Os números oficiais acabam maquiando o quadro real da informalidade no mercado de trabalho da capital, com cada vez mais pessoas encontrando no comércio de rua uma forma de garantir renda e sustento. "Tudo isso aliado ao preciosismo da fiscalização das prefeituras de Curitiba, Londrina, Foz do Iguaçu ou qualquer cidade de médio porte e do Governo do Estado, através da AIFU e ações isoladas", afirma o presidente da Abrabar.

"Fica cada vez mais claro que só enxergam, concentram forças e energias e visam combater somente nossa categoria, que tem estabelecimentos fixos, CNPJ e lutam para atender, tirar as licenças e adquirir produtos com procedência", disparou Aguayo. Enquanto isso, ainda segundo ele, a clandestinidade faz a festa.

"Em tempo de crise é esse o prêmio que nos dão?", pergunta o presidente do Sindicato e da Associação de Bares e Restaurantes. "Principalmente dos que tentam andar nas regras do jogo, com fiscais sufocando o pequeno e médio empreendedor, com exigências exageradas e sem bom senso".

"Depois, ficam reclamando da falta de aumento ou benefícios e reposição salarial, em alguns casos ocorre o atraso no pagamento de salários, pois estão extinguindo os contribuintes, diminuindo a arrecadação de taxas, tributos contínuos e só vivendo de aplicação de multas exorbitantes", alertou Aguayo.

Que completou: "E na outra ponta vem o desemprego, pouca oferta de emprego e renda, enraizamento da informalidade e sonegação". Na avaliação de Aguayo, será um grande desafio aos novos governadores mudar este paradigma incentivando os pequenos e médios empreendedores e não extinguindo-os.