Reprodução

A pandemia de coronavírus virou um teste e tanto para o amor. E não somente para o amor de casais, mas para aquele amor entre pai e filho, mãe e filha, primas, primos e amigos. A distância e a saudade do abraço deixam os sentimentos à flor da pele. O que tem salvado as relações e aliviado a angústia é a internet, com video-chamadas, chats, verdadeiras conferências entre amigos e familiares.

A psicóloga Adriana Kaiser lembra que os sentimentos, emoções e sensações neste momento também podem ser amenizados de outras maneiras, não somente fisicamente. “Amar também é um gesto de cuidado. A hora agora é rever paradigmas. Que tal escrever os sentimentos um para outros, falar o que se passa na sua mente e coração. Criar livre, usar da tecnologia aproximando os contatos, conexões. Distribuindo alegria, ouvindo músicas juntos, dançando juntos via web. Criando juntos, cada um na sua casa. A distância física do contato é importante mas não é a única maneira de se conectar. É o momento de recriar, repaginar formas para amenizar a saudade, estimular novos sentidos. Aproximar vínculos e gostos com outras atitudes”, explica. “Nunca estivemos tão longe e tão perto”.

Para os estudantes universitários Caroline Ivanski Langer, 20 anos, Miguel Bugalski, 19 anos, a distância é dupla, porque além de namorados, eles estudam na mesma universidade e participam de várias atividades juntos. “Ficamos separados porque nós dois precisamos ficar perto de nossas famílias e ainda vivemos completamente separados. Nós dois temos avós, então redobramos a atenção para reduzir qualquer risco. Seguimos lidando bem, embora a gente seja muito grudado um no outro. Estamos separados há 29 dias e tentando driblar esses limites físicos através da internet”, conta Caroline.

O casal se fala o dia inteiro pela internet, desde a manhã até antes de dormir: “É geralmente quando temos um pouquinho mais de tempo para fazer ligação de vídeo, jogar joguinhos online e assistir BBB juntos, comentando simultaneamente”, conta Caroline. Eles estão juntos há 11 meses e esperam que até completarem um ano de relacionamento, as coisas tenham se acalmado.

“A Carol me deu um capítulo de mais de 60 páginas contando como é me namorar, porque isso é uma coisa nossa, eu pedi ela em namoro por meio de cartinhas. Aí sempre, a cada mês, eu conto uma historinha por meio dessas cartinhas. Quando sinto saudade ou eu leio o que ela escreveu, ou eu escrevo um capítulo”, conta Miguel.

O jornalista Angelo Binder sofre de saudade dos dois filhos, Carol, 12 anos, e Gabriel, 9 anos. Não os vê de pertinho há três semanas, apesar de ter guarda compartilhada. “Eles ficavam aqui em casa três vezes por semana e fins de semana alternados. Mas como eles tem contato com os avós e bisavô materno, optamos por dividir o tempo de forma diferente. Logo serei eu que ficarei com eles”, explica Binder.

O contato diário é por whatsapp. “Na verdade pelo whatsapp da minha filha. O Gabriel também tem. Ele é muito do contato, do dia a dia. Tem sido bem difícil para nós, mas expliquei da importância. Eu levava eles todos os dias para o colégio. Era nosso momento e tem feito falta. Mas eles estão entendendo bem. Talvez para nós, adultos, seja mais difícil. Sou da geração do abraço, do encontro com a família e amigos. É estranho e espero que isso acabe bem e logo. É um aprendizado para todos nós”, diz o jornalista. Ele também está escrevendo cartas para os filhos sobre os livros que lê, os acontecimentos que presencia e lembranças da sua infância: “Quando isso passar, vou enviar. Quero entregar as cartas para ser uma experiência diferente. Mas que dá vontade de pegar os dois para dormirem aqui hoje, dá”.

Hora de aprender com a solitude e reavaliar as relações

A psicóloga Adriana Kaiser lembra que é tempo de aprendermos a lidar com nossa solitude. “Solidão é diferente de solitude. São tempos de nos recolhermos e estarmos primeiramente conosco. Sentir o gosto de nós. É tempo de meditação, de conexão, de interiorização. É tempo de se olhar no espelho. De se apreciar, de aprender a parar e se perceber. Fomos acostumados e ensinados sempre a ver a graça e alegria para fora. Então nos distraímos e não observamos a estéses da vida. Sentimos falta do outro, claro, mas na maioria o outro vem como para nós completar de nós mesmos e não para somar.

Segundo ela, é um bom momento para avaliar as relações: “É hora de analisar relacionamentos. Esse momento também nos convoca é nos convida a prestar atenção em ver o quão profundo ou superficial são nossas relações. Ou seja mesmo distantes, podemos ver uma nova oportunidade de nos relacionar. De repente de uma forma até mais profunda e real”, explica.

“O que a pandemia nos convida a nos recolher em nossas casas e dentro de nós mesmos. E nisso tudo, os relacionamentos ficam escancarados por um lado, onde a família tem que lidar com 24 horas de vivência em grupo no caso de famílias e quem está sozinho tem que lidar com a solitude, ou seja conosco mesmo de maneira positiva. É um desafio. Mas a tecnologia vem para ajudar neste processo”, explica Gustavo Arns, coordenador do curso Ciência e Bem-estar online da Universidade Positivo. “Essa rede de apoio de amigos e familiares pode ajudar neste momento. É onde pode podemos mostrar as nossas fragilidades. Isso é muito importante para a saúde psicológico”, lembra Arns.

Como oito amigas resolvem a saudade ‘zoando’ pela internet

Para oito amigas jovens, de 19 e 20 anos que se conhecem há mais de 10 anos e se encontram semanalmente, a quarentena tem sido bem complicada. Maria Eduarda Caldart, 19 anos, Alessandra Oliveira, 20 anos, Fernanda Todeschi, 20, Camila Gusso, 18, Camila Dallin 19, Emanuelle Lopes, 20, Giovana Serkes, 20 anos, e Mariana Mosson 19, têm se virado também com a internet, a saudade de abraços está difícil de superar.

“Não está sendo fácil para nenhuma de nós, mas a gente supera a saudade principalmente online, usamos apps pra poder fazer ligações por vídeo com várias pessoas, jogamos gartic ou stop pelo PC ou até mesmo assistimos BBB juntas. Esses dias foi meu aniversário e minha namorada bolou uma boa, elas mandaram cartinhas para mim e isso ajudou bastante”, conta Alessandra Oliveira. “Mas o contato físico, olho no olho dá muita saudade, porque a gente sempre foi de se abraçar”.

Mariana Mosson diz que mesmo que estranho, o contato pela internet tem salvado os dias. “Nos grupos matamos um pouquinho a saudade e nos distraímos. A presença delas mesmo que do outro lado da tela, falando coisas aleatórias, transforma um dia sem graça de quarentena em um cheio de risadas. O que eu tirei desse período longe sem poder se ver, com certeza foi de que a presença de pessoas que te fazem bem é um pilar na nossa vida, independente de ver pessoalmente ou não”, conta ela.