Valquir Aureliano – Sabrina Mugguati com o filho especial Jorge

Sabrina Muggiati, 48 anos, mãe de uma jovem de 18 anos e um de 16, autista e portador da Síndrome do X Frágil, nunca imaginou ficar longe dos filhos por 40 dias, mas isso aconteceu. Ela e a irmã foram diagnosticadas com Covid-19. Preocupada com as condições do filho especial, Sabrina ficou em isolamento: “Ser diagnosticada com Covid-19 e precisar se afastar de tudo e fazer a quarentena é algo assustador. É não saber o que vai acontecer, como o seu corpo reagirá ao vírus. É tudo novo. E quando se tem um filho com Síndrome do X Frágil, que demanda de cuidados especiais, a quarentena se torna eternidade. Além do mal estar, vem a culpa da ausência. Eu chorava todos os dias e meu filho perguntava no telefone: ‘’Já curou do Covid?’”, conta Sabrina.

Ela conta que, quando surgiram os primeiros casos do novo coronavírus no Brasil, sua preocupação foi com seu filho especial. “Ele foi diagnosticado com autismo aos 5 anos e aos 8 anos com Síndrome do X Frágil, uma condição genética, desconhecida até mesmo por profissionais das áreas de saúde. Tomei todos os cuidados com o Jorge, desde o uso da máscara até as chamadas pistas visuais para que aprendesse sobre a necessidade de higienizar corretamente as mãos. Mas quando o diagnóstico veio para mim e para minha irmã, o desespero tomou conta de mim. Primeiro eles testaram e felizmente deu negativo”, conta ela. “Foram dias de agonia, não só pelos sintomas da doença, mas pela agonia de não poder tocar, de não poder ajudar, de não estar com ele a cada descoberta. Pois sim, criança especial tem descobertas diárias, que fazem valer todo o nosso sacrifício, dedicação e amor por eles”.

Sabrina alerta que os sintomas da Covid-19 são devastadores, com mal-estar generalizado, sem força para sair da cama, sem vontade de comer e uma fraqueza assustadora. Ela não teve febre, mas emagreceu muito e sofreu com diarreia e falta de ar. “Eu fiquei muito abatida, mais que minha irmã. Quase fui hospitalizada. Até hoje, já negativada, sinto o cansaço e a dificuldade de respirar quando me esforço, como subir escadas e ir ao supermercado”, conta ela.

O isolamento durou bastante porque Sabrina demorou para apresentar resultado negativo para o vírus nos exames. Foram três testes até que ela negativasse e pudesse ver os filhos novamente, o que aconteceu no início da semana. “O reencontro foi emocionante. Jorge não é de abraçar e veio me abraçar. No momento, percebi o quanto o meu filho tem conhecimento e entendimento a respeito da doença. Passou dias de impaciência, mesmo sendo muito bem cuidado e estando em casa com o carinho de diversas pessoas que o amam. O sofrimento que a doença causa é muito grande, mas foi gratificante sair dela, e ver o quanto a ligação mãe e filho é forte, e valeu a pena lutar dia a dia para a cura”, diz Sabrina. “Mesmo tendo saído desse período, não desejo essa doença para ninguém. A dor da cura é muito grande. Mesmo curada, a fraqueza ainda é constante. Façam como meu filho, usem máscara o tempo todo, tenham cuidado e se higienizem. É o que podemos fazer para cuidar dos nossos e de quem amamos”.

Instituição ajuda portadores de Síndrome do X Frágil a lidar com a Covid-19

Sabrina Mugiatti é idealizadora do Projeto Eu Digo X, do Instituto Lico Kaesemodel, que ajuda pacientes de Síndrome do X Frágil (SXF) e suas famílias. A síndrome é uma condição genética, pouco conhecida e diagnosticada comumente como autismo. Como a SXF apresenta muitos sintomas e sinais diferenciados, acaba dificultando a definição do quadro clínico de pessoas acometidas por ela. Por essa razão, muitos são diagnosticados com Autismo, TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção / Hiperatividade) ou Síndrome de Asperger, entre outros. A SXF é uma condição hereditária que causa deficiência intelectual de graus variáveis e pode ter sinais comportamentais importantes, muitas vezes dentro do espectro do transtorno autista.

Infelizmente, mesmo sendo de incidência tão comum, a SXF tem diagnóstico difícil e, muitas vezes, é desconhecida até mesmo por profissionais das áreas de saúde e de educação. “Um dos principais motivos para a demora de um diagnóstico clínico mais preciso são as semelhanças com os sintomas e sinais da condição do espectro do autismo”, explica Luz María Romero, gestora do Projeto Eu Digo X.

Um dos projetos recentes da instituição é justamente conscientizar os portadores e seus familiares sobre os cuidados com a Covid-19. Em um atendimento hospitalar emergencial, sem a presença de um familiar ou tutor, o paciente X Frágil e alguns casos de autismo podem resistir a ajuda, evitar o contato físico e principalmente não responder as perguntas realizadas. “Em casos que pacientes X Frágeis ou Autistas sejam diagnosticados com Covid -19, orienta-se que ao falar com eles, principalmente se for um paciente com Síndrome do X Frágil que o atendente ou médico evite olhar diretamente nos olhos, e se precisar tocá-los, faça-os com certa pressão, pois se sentem incomodados com toques leves”, ressalta Luz María. Segundo a gestora o ideal nesses casos é a permissão do acompanhante de confiança do paciente.

Outro item de extrema importância, segundo Luz María, é a medicação aplicada. “Muitos pacientes X Frágeis ou autistas possuem uma medicação forte para atenuar sintomas. Ao ingerir uma nova medicação, pode ter interações medicamentosas”, salienta. “Normalmente nossos pacientes não sabem os nomes dos medicamentos, apenas sabem da necessidade de ingeri-los. O ideal é a presença dos pais ou tutores, para informar a listagem, evitando incompatibilidade medicamentosa. Mas esses cuidados e ações junto aos atendimentos, podem ser tomadas somente com o diagnóstico correto dos pacientes.

Hoje o Projeto Eu Digo X possui 600 cadastros de famílias com múltiplos indivíduos (900), sendo 80% das pessoas com diagnóstico confirmado para a Síndrome do X Frágil. No entanto, após a realização da Campanha Nacional de Conscientização da Síndrome do X Frágil, que foi estrelada pelo atleta e ídolo Mundial Neymar Jr, a busca de informação a respeito da síndrome triplicou, e hoje o projeto está com uma fila de mais de 600 exames a serem realizados para confirmação de diagnóstico.