Imaginei um tanto como seria a sensação. Desde a adolescência. Qualquer pessoa que entenda um milímetro de economia, ou de estatística, tomaria a cena por improvável, quase impossível. Mas fato é que estava eu, alguns muitos anos depois, diante da mensagem na tela do computador. Roberta D´Albuquerque compareça urgentemente a uma agência da Caixa. Sabe, eu não tenho conta na Caixa, minha única ligação com eles é a loteria. Uma ligação semanal, que venho construindo com afinco e uma dose de esperança ingênua. Meu pai sempre foi dado a uma apostinha da Mega aqui, outra ali, me levava umas raspadinhas pra casa. E eu, sempre fui dada a meu pai. Aí já viu. 

Era de manhã cedinho, e os sorteios tinham se dado no fim do dia anterior. Joguei perto do último horário das apostas online. E diante da mensagem, me mantive mais calma, mais feliz e mais centrada do que acontecia na minha imaginação. A quinta, dia da conferência, é cheia no consultório, a sexta pela manhã também. Mas esperei, estava ativada em mim a paciência dos despreocupados. Separei a hora do almoço da sexta para buscar meu prêmio. Eu sabia que não se tratava da Mega em si, o UOL me contou na própria quarta que nenhuma aposta tinha sido sorteada. Acumulara, R$60 milhões. Mas, às quartas, faço a combo da semana, Quina e otras cositas mas. Não sabia o valor dos prêmios, visualizei uns 10. E peguei um táxi às 12h para a agência mais próxima – pé quebrado, lembra?

Lotadíssima, as caras de quem esperava nas cadeirinhas da fila – que agora banco não tem mais fila em pé, já viram? – as piores. Eu não. Eu tava delícia, contente, cheia de futuro. Fui chamada às 14h30, distribuindo boa tarde e dentes sorridentes. O moço, Ricardo, eu lembro, chega estranhou. Contei sobre o meu caso e não pude evitar uma piscadela. Ele, com o mesmo humor dos clientes que esperavam, não retribuiu. Documentos? Foi o que pode me dizer. Entreguei. Ricardo lá, apertando o olhinho para o monitor. Pede um minuto, chama um colega. A essa altura, aumentei pra pelo menos 20. Aí já foi dando um friozinho na barriga rica, sabe? Uma emoção nova. O oposto daquela que a gente sente quando vê o saldo negativo na conta que na nossa cabeça, e só na nossa cabeça, seguia positiva. Já sentiu essa?

O segundo moço, chama um terceiro. Eu aumento pra 30. Aumenta também a minha frequência cardíaca abastada. O terceiro senta, encontra meu olhinho já segurando o choro de emoção e diz: a senhora tinha um residual de mil Reais na sua conta de FGTS. Seus dados foram clonados e sua conta foi roubada. Oi? Foi o que pude responder, pra na sequência pergutar: E a loteria? A conta fica bloqueada por segurança. Agora, vamos abrir um chamado para tentar – e esse tentar pronunciado com um certa ênfase – reaver seu FGTS. Um momentinho. Sinto muito, senhora, o sistema caiu. A senhora vai precisar retornar a agência na segunda.

Que tal? Escrevo daqui da agência. Cheguei às 10h, estou com a mesma cara de Ricardo e da galera das cadeirinhas. De milionária a assaltada. Ô dó. Boa semana – e só se for pra vocês.

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