*Fernando Augusto Sperb

Tal como um jogo de apostas, uma sequência numérica correta pode valer muito dinheiro. Para alguns investidores de criptomoedas, essa sequência pode valer cerca de R$ 700 milhões. É com espanto que se acompanha a notícia de que, em um mercado que surgiu de pura tecnologia, milhares de usuários podem ficar sem receber os investimentos porque o fundador da empresa morreu e levou com ele a senha de acesso às contas.

Há poucos dias foi divulgada a morte de Gerard Cotten (30), fundador da maior plataforma canadense de bitcoins, a corretora QuadrigaCX. Com a notícia, veio a incerteza dos 115 mil usuários que mantinham seus investimentos no banco digital. O empresário era o único autorizado a realizar transferências para as contas e seu computador era criptografado, sendo ele o único conhecedor da senha.

Esse fato acende novamente o sinal de alerta de que é necessária a regulamentação e alinhamento entre os países sobre o setor de criptomoedas. Mas a perguntar que não quer calar é: como em um setor altamente tecnológico isso pode ocorrer?  Falhas como essas jamais deveriam acontecer, uma vez que existem formas de manter as senhas seguras – no caso de invasão de hackers, por exemplo – e disponibilizar múltiplos acessos.

O problema não é a tecnologia e sim a falta de regulação que deixa o setor vulnerável. Enquanto não existir uma legislação que balize o funcionamento das corretoras e bancos digitais que operam com criptomoedas, e isso em esfera internacional, cada empresa ou mercado regional cria suas próprias regras da maneira mais conveniente a sua realidade. O que nem sempre significa maior segurança ao investidor.

Desde 2008, quando as criptomoedas começaram a se popularizar, instituições financeiras pressionam o governo norte-americano para taxar esse tipo de transação. O argumento dos bancos é de que a cobrança de taxas sustentaria a manutenção das contas, transações e outros serviços, além de manter o pagamento de funcionários responsáveis pelo pleno funcionamento das corretoras.

Claro que, em se tratando dos bancos, existe o interesse na taxação para tentar controlar em parte a concorrência das criptomoedas. Porém, essa exigência não é totalmente equivocada, já que o avanço do setor tem impactado diretamente no mercado financeiro.

Aqui no Brasil, a controvérsia está entre os órgãos reguladores como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e a Comissão de Valores Imobiliário (CVM), que não chegam a um consenso de quem seria a responsabilidade pela regulamentação e fiscalização.

O fato é que o setor continua crescendo, mesmo com a indefinição internacional e dos órgãos fiscalizadores. No caso do Canadá, a Suprema Corte terá que definir como a empresa responderá, já que a única herdeira do empresário entrou com pedido de proteção ao credor e paralisou todas as cobranças à empresa. Enquanto isso, os investidores permanecem na incerteza de como reaver os investimentos.

*O autor é mestre em Direito Empresarial e sócio do escritório Alceu Machado, Sperb & Bonat Cordeiro


DESTAQUE

Cláusula de norma coletiva que limita atestado médico a três dias por mês é nula

A Seção Especializada em Dissídios Coletivos (SDC) do Tribunal Superior do Trabalho negou provimento a recurso do Sindicato da Indústria de Preparação de Óleos Vegetais e Animais, Sabões e Velas do Estado do Pará contra declaração de nulidade da Cláusula 20ª de Convenção Coletiva, pactuada com categoria profissional e que limitava a aceitação de atestados médicos e odontológicos não emitidos por serviços médicos das empresas ou conveniados a três dias por mês. A decisão fundamenta-se no Precedente Normativo 81 da SDC, que não estabelece limite temporal para a validade dos atestados.
O Ministério Público do Trabalho ajuizou ação anulatória contra a cláusula, constante da Convenção Coletiva de Trabalho celebrada para o período 2015/2016 entre o sindicato patronal e o Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários e Empregados em Empresas do Comércio, Indústria, Construção Civil, Locação de Veículos e Prestação de Serviços do Município de Belém (Sintrobel).

Segundo o MPT, não há na legislação qualquer limitação ao número de dias que podem ser justificados, uma vez que a inaptidão para o trabalho pode durar conforme a natureza do fato gerador (médico ou acidentário). Além disso, a restrição do prazo de ausência justificada por atestados médicos para até três dias desoneraria o empregador de pagar o auxílio-enfermidade.
O Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (PA/AP) julgou totalmente procedente a ação e declarou a nulidade da cláusula. Para o TRT, o direito à autonomia privada coletiva não é ilimitado, e a norma em questão, ao estabelecer esse regramento limitativo, prejudica especialmente os empregados de empresas que não detêm serviço médico próprio ou contratado.


A CONDUTA E O DIREITO PENAL

O Combate à corrupção mais uma vez no STF

*Jônatas Pirkiel

Nesta quarta-feira (13), o Supremo Tribunal Federal, em “desgraça no conceito da sociedade” poderá tomar uma decisão que repercutirá diretamente no “sucesso” da Operação Lavajato. Na opinião do procurador Júlio Noronha, da força-tarefa no Paraná: “…Caso o STF entenda que o julgamento de crimes complexos, como corrupção e lavagem de dinheiro, devem ir para a Justiça Eleitoral, estará nas mãos dos criminosos a possibilidade de apagar o que a operação fez perante a Justiça Federal e o que poderia ainda fazer. Não parece ser esse o desejo da sociedade, que certamente espera que a mais alta Corte de Justiça do país não enfraqueça o sistema…”.

Não obstante seja outro o entendimento do atual Ministro da Justiça, Sérgio Moro, em seu projeto anticrime, o “crime de caixa 2”, que é aquele onde o partido político ou mesmo o candidato recebe doações sem declará-las à Justiça Eleitoral, trata-se de uma conduta mais grave do que o crime comum de “falsidade ideológica”, como previsto no artigo 350, do Código Eleitoral, ou da previsão da lei 7.492/86, em seu artigo 11, de: “…manter ou movimentar recurso ou valor paralelamente à contabilidade exigida pela legislação…”.

Como diz o professor Luiz Flávio Gomes: “…O problema mais grave é que o “caixa 2” frauda a legislação assim como o processo eleitoral, porque desiguala os concorrentes. De outro lado, constitui o “caixa 2” (ou o “caixa 3”, que significa pagar as contas do candidato nas gráficas, nos postos de gasolina etc.), para além do abuso do poder econômico, uma das formas de “compra” do mandado do parlamentar, o que vicia a própria democracia. São essas doações(configuradoras do “caixa 1 ou 2 ou 3”) as grandes responsáveis por formar, dentro do Congresso Nacional, as famosas bancadas da Bala, da Bola, do Boi (agronegócio), do Bife (Friboi), da Bíblia, das Betoneiras (construtoras), dos Bancos, das Bebidas (Ambev, por exemplo), das mineradoras etc. Essas bancadas não cuidam, em regra, do interesse geral, sim, dos interesses dos financiadores das suas campanhas…”.

A decisão do plenário do Supremo Tribunal Federal deverá servir de base para uniformizar o entendimento da Corte em relação a este tipo de delito, visto que a 2ª. Turma tem encaminhado alguns casos para apreciação da Justiça Eleitoral e outros para a Justiça Federal. O que a Procuradoria Geral da República entende é que a Justiça Eleitoral não está aparelhada para a apreciação destas situações de maior complexidade, com o risco de levar muitos casos à prescrição ou mesmo à aplicação de penas mais brandas o que as que são impostas pela Justiça Federal.

De forma que, este julgamento deverá por um fim ao conflito de competência das instâncias judiciais. O que já deveria ter ocorrido não fosse a “morosidade” na apreciação destas ações que envolvem, via de regra, políticos poderosos que se articulam nas suas relações de poder e impedem que os processos tenham curso razoável.

*O autor é advogado na área criminal (jô[email protected])


PAINEL

Demissão
A demissão de uma trabalhadora deficiente junto com outros 500 empregados da empresa não caracteriza dispensa discriminatória. O entendimento é da 7ª Turma do TST.

Milhagem
A utilização de pontos acumulados em cartão de crédito para aquisição de passagens aéreas é direito adquirido e a sua utilização não pode sofrer limitações em função de mudanças nas regras da operadora do cartão ou da companhia aérea. O entendimento é da 14ª Câmara de Direito Privado do TJ de São Paulo.

Religião
O juiz da 15ª Vara Cível e Ambiental de Goiânia-GO autorizou a transfusão de sangue em uma recém-nascida contra a vontade dos pais, que são seguidores da religião Testemunha de Jeová. Para o magistrado, o direito à crença religiosa não deve se sobrepor à vida da criança.

Descriminação
Trabalhadora impedida de participar de seleção interna para promoção na empresa, feita exclusivamente para homens, sofre discriminação de gênero e deve ser indenizada por dano moral. O entendimento é da 2ª Turma do TRT da 11ª Região. 

Sindical
O juiz da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Ceará determinou liminarmente que a União mantenha os descontos em folha de contribuições dos membros de um sindicato. A decisão suspendeu os efeitos da recente Medida Provisória que proíbe a cobrança de contribuição sindical a qualquer empregado que não tenha dado autorização expressa, individual e por escrito ao seu sindicato.

DIREITO SUMULAR
Súmula nº 609 do STJ-  A recusa de cobertura securitária, sob a alegação de doença preexistente, é ilícita se não houve a exigência de exames médicos prévios à contratação ou a demonstração de má-fé do segurado.


LIVRO DA SEMANA

Originalmente criados para regularizar os pagamentos da Fazenda Pública decorrentes de condenação judicial, os precatórios acabaram por subverter sua razão de existir. Em algumas décadas, transformaram-se num martírio para os credores. A sua complexidade aumentou imensamente; Este livro sistematiza e consolida o novo regime jurídico dos precatórios, tal como consagrado na Emenda Constitucional 94/2016 e, também, na Lei 13.463/2017. Por meio de estudo pormenorizado da Constituição e da jurisprudência dominante, sobretudo a mais recente do Supremo Tribunal Federal, ele confere clareza ao tema e colabora para a solução dos problemas mais tormentosos; •O seu objetivo é simplificar o tema e fornecer respostas eficientes, com o intuito de que os precatórios venham a cumprir sua função constitucional.