Nossa Esquadrilha Pégasus, pertencente à Polícia Militar de Minas Gerais, opera 19 aeronaves, sendo 10 helicópteros e 9 aviões. Temos como lema “A Ajuda que vem do Céu”, cumprindo as missões de segurança pública, defesa civil, meio ambiente e apoio a todos os órgãos do estado. Nosso principal papel na tragédia foi deslocar equipes especializadas para os pontos de resgate de vítimas, pois o único meio de transporte capaz de chegar a esses lugares é o helicóptero. Nenhum outro meio seria capaz de realizar tal tarefa e muito menos num curto espaço de tempo.

No dia 25 de janeiro, estava num dia de trabalho como qualquer outro. Por volta das 14 horas, fomos acionados para atender a ocorrência de rompimento de barragem na cidade de Brumadinho. Enviamos a equipe que estava de serviço para o local e cerca de 20 minutos outra equipe também se deslocou.

Por volta das 17 horas, eu me desloquei para a ocorrência num helicóptero equipado para voos noturnos. Mesmo após o pôr do sol, nossa equipe continuou a sobrevoar para identificar possíveis vítimas ainda com vida. Infelizmente, não detectamos nenhum sinal de vida. Por volta das 3h30, estávamos no aeroporto da Pampulha, quando recebemos novo chamado para checar as condições da barragem 6. Retornamos ao local em 16 minutos de voo. Lá, identificamos uma grande mancha no centro da barragem indicando vazamento, motivo pelo qual, no dia seguinte, houve a evacuação das áreas críticas na rota do Córrego do Feijão.

Desembarcávamos os bombeiros e militares de Israel nas áreas críticas, muitas vezes mantendo o voo com o esqui tocando a lama. Tal tarefa requer muita destreza, pois qualquer movimento incorreto poderá levar o helicóptero a se acidentar. Numa tragédia como a de Brumadinho, o piloto realiza dezenas de voos como esses por dia.

Desde o segundo dia, nenhuma equipe conseguiu identificar alguma vítima com vida. Numa situação como aquela, manter-se vivo sob a lama recheada de minério de ferro seria um milagre, pois o terreno fica muito frio à noite. Todos os dias iniciávamos nossos trabalhos às 5 horas e apenas retornávamos para nossa base por volta das 21 horas. Dias intensos de trabalhos.

No dia 30, fomos acionados para içar um bovino que estava desde o início da tragédia. Configuramos o helicóptero (cálculos de peso e balanceamento) para erguer 400 kg, que era o peso do boi segundo cálculos dos veterinários. Mas o peso era superior. Então, abortamos o içamento. Na segunda tentativa, o helicóptero estava configurado para içar até 750 kg, carga máxima permitida para o gancho de carga do helicóptero H125. Nessa tentativa, conseguimos içar o bovino e o levamos até o ponto de desembarque, ao lado da Igreja do Córrego do Feijão, onde estava um grupo de veterinários e um veículo para conduzir o animal, que estava naquela lama por cinco dias.

Trabalhar numa missão como a de Brumadinho é colocar em prática todos os treinamentos realizados para que todas as operações fiquem dentro de padrões de segurança. As equipes aéreas trabalham no limite do erro. Uma operação que nos engrandece como cidadãos de saber que temos todo esse potencial na defesa da vida.

A lição dessa tragédia é que o povo brasileiro não aguenta mais tanta morosidade do poder público em fiscalizar e exigir ações concretas que evitem tragédias para a população e meio ambiente. Estamos há pouco mais de 3 anos da tragédia de Mariana e tudo já havia sido esquecido. Essa tragédia não deveria ter acontecido se o poder público tivesse agido como deveria. E ainda existem dezenas de barragens como a de Brumadinho nas mesmas condições. Ações concretas devem ser feitas imediatamente. Essa é a maior tragédia do Brasil em áreas de mineração. Podemos ultrapassar 350 mortos, já que passamos do limite em localizar sobreviventes.

Meu reconhecimento especial a todas as forças públicas que atuam na tragédia. Polícia Militar, Bombeiros, Polícia Civil, Defesa Civil e demais órgãos de Minas Gerais, Forças Armadas, outras forças de outros estados como Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia, Polícia Federal, Rodoviária Federal e o exército de Israel.

Fica o grande recado a todos os povos. Viver como Jesus Cristo nos ensinou, valorizando o que realmente importa nessa vida: o amor! Para aqueles que estão de alguma forma afastados, restabeleçam seus laços familiares ou de amizade. Precisamos valorizar a vida ao máximo, cuidar de nossas almas e dar menos valor aos bens materiais.

Para quem está em campo, muita fé e energia para continuar o árduo trabalho de resgatar os corpos de nossos irmãos trabalhadores. Cada corpo resgatado será um alento para os familiares que poderão sepultar seu ente querido com todas as honras merecidas.

Messias Alan de Magalhães é piloto de helicóptero e tenente-coronel da Polícia Militar de Minas Gerais