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A cada 20 horas, um caso de intoxicação por agrotóxico agrícola é registrado no Paraná. Segundo dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do Ministério da Saúde, entre 2007 e 2017 (último ano com dados disponíveis) um total de 4.785 paranaenses tiveram intoxicação confirmada. Dentre todas essas ocorrências, 347 terminaram em morte.

Esses números colocam coloca o Paraná como o principal destaque (negativo) do país em termos de internações e óbitos por intoxicação com agrotóxico agrícola. Com relação às internações, São Paulo (4.024), Minas Gerais (3.235), Pernambuco (2.860) e Santa Catarina (1.827) aparecem na sequência do Paraná. Já com relação aos óbitos, o estado é seguido por Pernambuco (342), São Paulo (232), Minas Gerais (166) e Ceará (158).

Os dados, alarmantes, não chegam a surpreender. Isso porque o Paraná, segundo a Secretaria Estadual de Saúde (Sesa), é o terceiro maior consumidor de agrotóxicos do Brasil, consumo este que tem crescido. Em 2016 e 2017, por exemplo, foram consumidos um total de 92.160,5 e 92.398,0 toneladas de agrotóxicos, respectivamente. Já no ano passado, o consumo total chegou a 92.904,3 toneladas.

De acordo com o Plano de Vigilância e Atenção à Saúde de Populações Expostas aos Agrotóxicos do Estado do Paraná, publicado em maio do ano passado pelo governo estadual, esse avanço dos agrotóxicos estaria relacionado ao atual modelo de desenvolvimento para o setor agropecuário, voltado prioritariamente à monocultura químico-dependende e produção de commodities para exportação

“Esse modelo impõe o avanço sem limites sobre os biomas preserváveis como a Amazônia e o Cerrado. As grandes extensões de culturas de soja, milho, cana-de-açúcar, algodão e eucalipto alimentam o ciclo dos agrocombustíveis e da agroindústria em detrimento à produção da agricultura familiar de alimentos, esta última responsável pela produção de 70% dos alimentos no país”, explica o documento oficial.

Acontece, porém, que a maior parte dos agrotóxicos consumidos no Paraná representam riscos, tanto que cerca de 80% dos produtos mais aplicados em todas as regiões do estado eram considerados perigosos ou muito perigosos, numa classificação que leva em conta questões como a periculosidade ambiental e classes de uso agrícola.

Princípio ativo mais consumido no estado, o glifosato é classificado desde 2015 pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC), ligada a Organização Mundial da Saúde (OMS), “como provavelmtente cancerígeno”.

Alimentos contaminados e população exposta
Desde 2012 o Paraná possui um Programa Estadual de Análise de Resíduo de Agrotóxicos em Alimentos (PARA/PR), por meio do qual realiza coletas de amostras em propriedades ruais e na Unidade de Curitiba das CEASA, avaliando a qualidade do alimento e classificando como insatisfatórias as amostras que apresentam resíduos de agrotóximos acima dos Limites Máximos de Resíduos (LMR) e/ou resíduos não autorizado para as culturas.

Entre 2015 e 2017, 145 das 638 amostras analisadas foram classificadas como insatisfatórias – o equivalente a 22,7% do total. O morango e a uva foram os alimentos que apresentaram maior porcentual de amostras insatisfatórias, variando de 29,6% a 71,4% para o morango e de 20% a 70% para a uva. O pimentão e o pepino que passaram a ser monitorados a partir de 2013 apresentaram amostras insatisfatórias em todos os anos, variando de 22,2% a 75% para o pimentão e 11,7% a 40% para o pepino. O pêssego foi inserido no monitoramento em 2016 e apresentou 80% de amostras insatisfatórias

“Podemos afirmar que existe uma contaminação de alimentos por resíduos de agrotóxicos e consequentemente uma exposição da população a esse risco, principalmente quando se observa que a maior parte das amostras insatisfatórias apresentou resíduos de agrotóxicos Não Autorizados”, aponta a Sesa em seu Plano de Vigilância e Atenção à Saúde.

Pulverização aérea desponta como grande vilão
Uma das formas de uso de agrotóxicos na agricultura que caisa grande contaminação é a pulverização aérea, atividade que fatura anualmente cerca de R$ 936 milhões e gera R$ 234 milhões em impostos. O Brasil, segundo a ANAC, possui a segunda maior frota de aviação agrícola do mundo, com 2.083aeronaves (aviões e helicópteros), das quais 140 (6,7% do total) estão no Paraná.

Acontece que mesmo com calibração, temperatura e ventos ideais, a pulverização aérea deixa cerca de 32% dos agrotóxicos retidos nas plantas e 49% no solo, enquanto 19% se expandem para áreas circunvizinhas à da aplicação, o que causa riscos graves à saúde humana e ao meio ambiente. “A fiscalização dessa atividade cabe ao MAPA, porém com a atual estrutura deste nos estados, não há um controle e monitoramento eficientes, aumentando os riscos de contaminação”, aponta a Sesa em seu documento.

Até por conta disso, desde 2018 tramita na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) um projeto de lei que proíbe a pulverização aérea de agrotóxicos em todo o território estadual, bem como veda a comercialização de materiais utilizados na prática de disseminação, pelo ar, dos insumos químicos. O projeto, ainda em tramitação, não é a primeira iniciativa da Casa a tratar do assunto. Em 2012 e 2015, outros quatro deputados chegaram a apresentar dois projetos de lei com o mesmo teor, mas viram suas iniciativas rejeitas pela Comissão de Co0nstituição e Justiça da Alep.

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