BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Partidos de oposição tentam derrubar na Justiça o sigilo imposto pelo governo de Jair Bolsonaro aos pareceres e estudos técnicos que embasam a reforma da Previdência apresentada ao Congresso.

Ações contra a blindagem foram preparadas após a Folha de S.Paulo noticiar no domingo (21) que o Ministério da Economia restringiu o acesso aos documentos, liberando-os apenas a servidores e autoridades públicas devidamente autorizados.

Assim, não é possível ao cidadão comum, afetado diretamente pelas mudanças em pensões e aposentadorias, ter acesso a argumentos, estatísticas, dados econômicos e sociais que sustentam o texto em tramitação no Legislativo.

Nesta segunda (22), a Rede Sustentabilidade apresentou ao STF (Supremo Tribunal Federal) mandado de segurança para suspender o ato administrativo que determinou o sigilo dos papéis.

Na ação, o partido argumenta que a Constituição dá a todos o direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, e que a administração pública deve observar o da publicidade de seus atos.

Cita também a Lei de Acesso à Informação, que regulamentou dispositivos constitucionais e prevê a transparência como regra básica nas três esferas de poder público.

“É dever do Poder Executivo disponibilizar os dados que embasaram a proposta da reforma da Previdência, de interesse coletivo, tanto para o Poder Legislativo (princípiorepublicano), quanto para todos os cidadãos (princípio do controle social), não sendo possível sua restrição por mera vontade dos ocupantes temporários dos cargos públicos, eletivos ou não”, argumenta a rede.

Para o partido, a decisão do ministério obstrui o trabalho dos congressistas, que precisam ter acesso às informações para avaliar e votar as mudanças propostas pelo governo.

“O fundamento [para negar o acesso] é um verdadeiro escárnio a um princípio basilar da tomada de decisão e, consequentemente, no ambiente típico de deliberação que é o Congresso Nacional: o conhecimento sobre todos os aspectos que dizem respeito ao tema para se chegar à melhor decisão possível”, diz trecho da ação.

Também nesta segunda, os senadores da Rede Randolph Rodrigues (AP) e Fabiano Contaratto (ES) propuseram ação popular à Justiça Federal em Brasília para que, em tutela de urgência, também suspenda o ato que determinou o sigilo. Os argumentos são semelhantes aos da ação que começa a tramitar no Supremo.

PT, PDT, PCdoB e PSOL apresentaram à Justiça Federal em Brasília nesta segunda outro mandado de segurança, com pedido de liminar, para derrubar o sigilo, sob pena de multa em caso de desobediência. Eles também solicitam que os documentos sejam publicados antes de sessão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara para deliberar sobre a reforma, prevista para as 14h30 desta terça (23). As alegações também são parecidas às da Rede.

O governo vem defendendo que os pareceres e notas técnicas só se tornem públicos após a apreciação da proposta de emenda à Constituição (PEC) da Previdência.

“É completamente inconcebível que estudos realizados para embasar uma proposta de alteração constitucional apenas possam ser tornados públicos após a aprovação da PEC”, diz trecho da ação.

“Tal negativa da administração figura como um verdadeiro atentado à democracia, pois obriga o cidadão a construir sua livre concepção política de maneira cega, impondo-lhe apenas as informações escolhidas, unilateralmente, pela administração como passíveis de divulgação”, acrescenta.

Paralelamente à ação dos partidos, a Defensoria Pública da União prepara uma recomendação ao governo para que recue da decisão e abra as informações. O órgão estuda, em caso de recusa, ajuizar outra ação contra o governo.

Nesta segunda, o ministro Gilmar Mendes, do STF, negou pedido do deputado federal Aliel Machado (PSB-PR) para impedir, via liminar, qualquer tomada deliberação da Câmara sobre a PEC até que sejam incluídos e analisados pela Comissão de Comissão e Justiça dados sobre os impactos orçamentários e as fontes de custeio de medidas previstas no projeto.

O congressista ajuizou essa ação na semana passada. Afirma que a votação de projetos que criem ou alterem despesas obrigatórias ou renúncias de receita, sem que deles conste estimativa de seus impactos financeiros, afronta a legislação.

Mendes afirmou, em sua decisão, não vislumbrar “violação flagrante ao processolegislativo estabelecido na Constituição Federal” na apreciação da PEC pela CCJ. “Não restou comprovado nos autos, nesse primeiro momento, que forma a alteração do regime de repartição para o regime de capitalização [discutida na reforma] implicaria a criação ou alteração de despesa obrigatória ou renúncia de receita”, escreveu o ministro.

Ele justificou também que não há risco que justifique uma decisão neste momento, pois a “eventual apreciação da PEC pela CCJ não impede sua posterior anulação sob fundamento de violação ao devido processo legislativo”. “Por outro lado, parece-me que o deferimento prematuro da medida poderia configurar ingerência indevida do Poder Judiciário no Poder Legislativo, hipótese nociva à separação de poderes”, acrescentou.