Lucas Bebê quer esquecer definitivamente o basquete. A frustração por inúmeras lesões e o prejulgamento das pessoas em relação ao comportamento exposto nas redes sociais fizeram o jogador de 2,13 metros se aposentar aos 28 anos. O talento que o levou à NBA, onde defendeu o Toronto Raptors, não foi mais suficiente para mantê-lo em quadra. Em entrevista ao Estadão, o ex-pivô fala dos problemas com álcool, de depressão e revela que o volante Jucilei, com passagens por Corinthians e São Paulo, o ajudou a ter um pós-carreira seguro.

A sua aposentadoria pegou muita gente de surpresa… Quando você tomou esta decisão?

Nunca é uma decisão tranquila, mas foi de cabeça fria, eu já sabia o que queria. Obviamente fui contra muita gente, mas eu não me encontrava mais feliz no esporte. Falei com o (Alberto) Bial (técnico do Fortaleza Basquete Cearense) e o Espiga (auxiliar) no hotel, quando o time ia jogar pelo NBB e avisei que não queria mais. Muitas pessoas ficaram decepcionadas, porque queriam que eu continuasse, mas apenas eu sei o quanto estava sendo difícil para eu continuar jogando basquete.

No vídeo em que anunciou sua despedida, você comentou as lesões e “algumas coisas injustas que aconteceram na sua carreira…” O que aconteceu?

Muito prejulgamento, muita gente que diz entender de basquete e, na realidade, não sabe nada. Isso vai te esgotando. As pessoas dando palpite na tua carreira e em outras coisas. Não quero acreditar que alguém tenha inveja de mim. É uma palavra pesada. Mas é estranho algumas pessoas que não me conhecem fazerem um prejulgamento. Só pelo meu jeito espalhafatoso, pelo que vê nas redes sociais, por eu viver uma vida sem medo de me expor. A galera acha que sou doidão, mas nunca tomou um café comigo para saber da minha índole, do meu caráter. Esse tipo de julgamento machuca. São pessoas que não te conhecem e desejam o seu mal. A última coisa que vi falarem é que estou falido. E eu não estou. Tenho consciência de que posso trazer isso para mim pela maneira como me exponho, mas abraço qualquer consequência.

Você mudaria algo em sua trajetória na carreira?

Sim. Sei que cheguei na NBA e joguei na Europa por causa do meu talento e não pelo trabalho. Foi isso que me tirou da NBA. Se eu tivesse me dedicado mais, talvez estivesse até hoje lá. Não ganhando milhões, porque apenas os predestinados ganham milhões na NBA. O restante carrega piano e faz o trabalho sujo, o que eu poderia fazer com tranquilidade. Hoje estou com 28 anos e sou pai de família. Naquela época, eu tinha 22, 23, era um garoto ganhando muito dinheiro. Comprei quatro carros, um deles uma Ferrari. A minha cabeça era outra. Teria focado no que realmente era importante e não em coisas supérfluas como eu fiz.

Você admitiu ter tido problemas com álcool…

Eu gostava da bebida. Gosto de beber. Mas nunca tive problema sério com bebida. É só para me divertir. Nunca fiz besteira por causa da bebida, nunca bati carro ou em mulher. Nunca causei nenhum acidente. A história do alcoolismo foi um pouco exagerada e isso ficou marcado. Não tinha crise de abstinência ou mesmo compulsão por beber. Mas eu bebia muito mesmo quando saía.

A depressão foi outro problema. Como conseguiu superá-la?

Isso aconteceu quando eu saí da NBA e deixei de ser alguém. As pessoas sumiram. Não tinha mais convite para nada, ninguém tinha mais interesse e isso me fez cair em depressão. Eu pensei: ‘Sou um m…’. Mas depois tirei de dentro de mim que a vida era muito mais do que jogar na NBA. Entendi que essas pessoas não serviam para fazer parte da minha vida.

O Felipe Melo entra em qual momento para te ajudar?

Ele é parecido comigo, também sofre com o prejulgamento, mas quem o conhece sabe o tamanho do coração que ele tem. Me ajudou bastante. Estamos sempre conversando. Sou muito grato por tê-lo na minha vida. Mas há outra pessoa muito especial, a quem eu devo a minha vida, que é o Jucilei. Todo dia eu vou no WhatsApp e escrevo para ele ‘bom dia, patrão, obrigado por tudo’. Ele investiu o meu dinheiro e hoje eu tenho uma segurança financeira absurda. Também me ensinou o mais importante, que é não gastar. Morei com ele por um mês e meio agora no Rio para absorver isso.

A situação, como você disse antes de estar falido, poderia ser pior sem ajuda do Jucilei?

Com certeza. Existem caras que ganharam dez vezes mais do que eu e perderam tudo. Se continuasse gastando o meu dinheiro, ele iria acabar um dia. Ele me ajudou a ter uma rentabilidade mensal para eu gastar com segurança e não quebrar. Sou um cara que recebo muita coisa, me falam para colocar o meu dinheiro aqui, ali… Acabei de ter uma experiência negativa há um mês e meio. Perdi meio milhão de reais. Hoje tenho muito cuidado onde eu coloco o meu dinheiro. Claro que eu poderia estar mais rico do que estou atualmente, mas tenho o suficiente para sustentar minha família e minha filha lá fora (Stella mora nos Estados Unidos).

Você gosta de cantar, dá para ver nas redes sociais. É algo em que pretende investir?

O CD está pronto, mas, para lançar, preciso falar com a Regina, mulher do Almir Guineto, o nosso mestre que nos deixou (morreu em 2017). Ela é detentora dos direitos juntamente com outros compositores de algumas músicas que cantei com ele. Preciso ter esta liberação, caso queira levar isso para frente. A minha ideia é fazer outras coletâneas, sempre homenageando estas pessoas do samba.