A decisão do SBT de reprisar Pantanal trouxe de volta aos telespectadores as lendárias imagens de paisagem rural e o recorrente som de berrante que eram marca registrada da novela, sucesso da extinta TV Manchete em 1990. Naquele ano, a trama de Benedito Ruy Barbosa entrou no ar com a proposta de um ritmo mais lento e um sem número de cenas sensuais, muitas delas protagonizadas pela selvagem Juma Marruá, interpretada pela então quase desconhecida Cristiana Oliveira. Agora, em 2008, a reexibição de Pantanal teve ao menos dois efeitos imediatos: aumentou a audiência da emissora de Silvio Santos e mexeu com os ânimos da concorrência.

Muita gente que atuou na novela de 1990 não soube de sua reestréia no canal do homem do baú. O ator Cláudio Marzo, por exemplo, sequer sabia dos rumores sobre o retorno. “Não faço a menor idéia do que está acontecendo”, resmungou. “Na época, foi um papel muito importante, mas isso é passado.” O desconhecimento se deveu ao efeito-surpresa planejado pelo SBT. Mesmo assim, muitos espectadores sintonizaram a emissora na reestréia de Pantanal. O resultado apareceu no Ibope: o índice de 4 pontos, comum no horário, foi elevado para 7 entre às 22h17 e 23h03, enquanto a trama ficou no ar.

Dezoito anos depois, a novela que entrou para a história por ter superado a Globo volta a atormentar a emissora dos Marinho e não só pelos índices de audiência, afinal o SBT continua atrás da Globo e da Record. A volta de Pantanal dá a largada a uma corrida jurídica. De um lado está Silvio Santos, que adquiriu a trama. De outro, a Globo, que detém os direitos sobre a obra de Benetito Rui Barbosa.

O SBT declara ter adquirido as fitas da JPO Produções e, com elas, “os direitos de reexibição e transmissão da massa falida da TV Manchete” há 5 anos, o que inclui não apenas Pantanal como outros folhetins, como Ana Raio e Zé Trovão, que pertencem agora à emissora, segundo essa lógica. Já a Globo, que há 2 anos comprou todos os direitos sobre a obra de Benedito Ruy Barbosa, estuda que providência tomar junto ao departamento jurídico.

Da parte de Benedito, seu filho Ruy conta que está perplexo com a forma com que o SBT colocou a novela no ar. O principal questionamento é com relação ao tal leilão no qual teria sido efetuada a compra das fitas. “A compra de fato houve, mas parece que o leilão jamais ocorreu. Isso é mentira, outras emissoras não foram chamadas para participar e isso já questionamos na justiça”, conta Ruy. O que ele lamenta é que “não há muito o que fazer contra o SBT agora”. “Infelizmente, quando obtivermos uma resposta da Justiça, daqui a uns 10 anos, a novela já terá sido exibida.”

Os atores, por sua vez, estão divididos. O orgulho de falar sobre a participação em Pantanal, lugar-comum no elenco, deu lugar a um misto de alegria e estranhamento. O SBT tenta se resguardar de futuros processos judiciais dos artistas convocando atores, atrizes, diretores e afins a comparecerem na emissora para receber o que têm direito, de acordo com o contrato estabelecido com a extinta Manchete.

Intérprete de Filó, Jussara Freire foi pega de surpresa ao saber que a trama já havia estreado. Disse, revoltada, que ia procurar orientação de seu agente. “Como sempre, o Silvio Santos nunca demonstra respeito pelos artistas do Brasil. Não teve a cordialidade de pedir autorização.” O patrão já foi alvo de muita reclamação quando, há três anos, reexibiu Xica da Silva, outro sucesso da Manchete.

José de Abreu, que vivia o psiquiatra Gustavo em Pantanal, pretende entrar com duas ações na Justiça por conta da reestréia – uma para pedir os direitos de imagem, outra para questionar a venda das fitas para o SBT. “Quero tornar essa venda ilegal, está contra a lei que diz que não se pode vender os direitos de intérprete. As fitas não têm vida própria, estão cheias de direitos”, reclama. Ele conta que tem apoio de atores “que não estão mais tão em evidência”, como Ingra Liberato, que fazia Madeleine quando jovem.

Mesmo assim, José diz adorar a idéia do retorno do folhetim ao ar e conta que o diretor Jayme Monjardim está “feliz da vida” com a volta de Pantanal. Só menos que Sérgio Reis, o Tibério na trama. Para o cantor, essa é uma ótima chance de os mais jovens e os telespectadores do Mato Grosso do Sul, que não tinham sinal da Manchete, acompanharem a saga gravada lá. “É bom para o SBT, bom para o povo, que vai ver de novo um grande sucesso, e bom para os atores, que voltam a ficar em evidência.”