*Victor Leal

Uma sociedade de negócios é, quase sempre, construída a partir de interesses comuns entre sócios. Sejam amigos com vontade de empreender ou colegas de trabalho que vislumbram uma oportunidade de negócio, a verdade é que o início de uma sociedade é geralmente acompanhado de entusiasmo e boa vontade.
Porém, até mesmo os negócios planejados com minúcia enfrentam imprevistos capazes de abalar o relacionamento entre os sócios. A origem dos conflitos é variada – divergências na forma de pensar, crise financeira, arrependimento – e pode causar atritos que colocam em xeque o sucesso da empresa.
Um acordo de sociedade (contrato social, estatuto ou acordo de quotistas) detalhadamente redigido respalda a integridade do negócio, que não pode ficar a mercê da conduta daqueles que a gerenciam. Por isso, é preciso investir um bom tempo na redação de ‘termos de guerra em tempos de paz’. Esta é uma medida preventiva crucial que significa antever os possíveis cenários de conflito; a forma como cada divergência deverá ser contornada e a atitude que se espera de cada sócio. 
Após profunda reflexão e redação detalhada dos termos combinados, é fundamental que o documento seja assinado pelos sócios e registrado para ganhar valor legal. Também é necessária atenção para que não exista conflito jurídico entre as disposições que possam gerar dúvida de interpretação ou mesmo sua anulação. 
É importante que o contrato traga segurança jurídica, ou seja, que suas disposições sejam claras e válidas para que o que foi ajustado possa de fato ser aplicado em um momento de divergência. Nesse ponto, a escolha adequada do tipo societário (S.A, Ltda, sociedade simples) é essencial para melhor atender as necessidades da empresa.
É claro que, ao redigir um acordo de sociedade, nenhum sócio espera ter de tirá-lo da gaveta. A empresa, no entanto, é o elemento mais importante e não deve sofrer abalos por conta de conflitos pessoais. 
Para exemplificar o cenário no qual um acordo de sócios precisa entrar em vigor, é fundamental compreender sua aplicação. Primeiramente, é preciso que um agente – seja um sócio ou um administrador com poder de decisão – demonstre a existência de um interesse pessoal extraprofissional que traga benefícios a ele diretamente ou a alguém com o qual este sócio tenha relação. Há, ainda, a necessidade de estabelecer uma relação de causalidade, em que fica explicitado o vínculo entre a conduta do sócio e o resultado ilícito. Por fim, o efeito da ação, que mostra o prejuízo ou aquilo que a empresa deixou de ganhar por conta do interesse extraprofissional daquele sócio.
Portanto, é essencial distinguir as rusgas cotidianas das atitudes ilícitas que colocam em risco a sobrevivência do negócio.  Se comprovada a ilegalidade do ato e o descumprimento do acordo, a legislação brasileira permite a exclusão compulsória da parte transgressora, sem que ela tenha direito a retornar à sociedade. 
A medida de redigir este documento tão importante não vale somente para as novas empresas. É altamente recomendável que negócios já em funcionamento também façam a reflexão e formalizem os acordos para dirimir conflitos enquanto a harmonia prevalece.  

*O autor é advogado pós-graduando em Direito Empresarial pela FGV e sócio da Nichel, Leal e Varasquim Advogados. 


QUESTÃO DE DIREITO PÚBLICO

Juizado Especial Federal de Campinas veda contribuição de aposentados que continuam trabalhando

Euclides Morais
RESUMO ÚTIL DA DECISÃO LIMINAR: “A parte autora requer a declaração de inexigibilidade das contribuições previdenciárias decorrentes do seu labor, mantido em vínculo empregatício posterior à obtenção de benefício de aposentadoria, por ausência de contraprestação proporcional pelo INSS. Mediante aplicação conjunta e sistemática das normas constitucionais com a Lei 8.213/1991, artigo 18, § 2º  –  O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social – RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional  –,  reputo que esta norma legal se revela incompatível com o Princípio da Isonomia (CF, art. 5º e 194, I) e com o Princípio da Proibição da Proteção Insuficiente que por sua vez é resultante dos princípios da Proporcionalidade e da Dignidade da Pessoa Humana (CF, art. 1º, III)”. 
Em outro viés, reputo que a norma em questão viola também o Princípio da Moralidade, vinculante da Administração (CF, 37), posto que enseja enriquecimento sem causa por parte da União. O ente federal cobra contribuição previdenciária e não oferece ao segurado a garantia previdenciária material mínima, como se de imposto se tratasse e não se trata.
Ressalto que a continuidade do trabalhador aposentado em vínculo empregatício lhe impõe a qualidade de segurado obrigatório (Lei 8.213/1991, art. 11, “a”). Em paralelo, também será “contribuinte obrigatório” (Lei 8.212/1991, art. 11, parágrafo único, “c”). 
Sendo contribuinte (novamente) deve gozar do direito a proteção previdenciária suficiente a todas as contingências típicas do trabalho em vínculo empregatício. Segundo a norma constitucional da CF, 201, I, tais contingências são doença, invalidez, morte e idade avançada. 
Assim, em controle difuso de constitucionalidade, outorgado a todo membro da Jurisdição, DECLARO INCIDENTALMENTE A INCONSTITUCIONALIDADE da norma da Lei 8.213/1991, artigo 18, § 2º, para fins de reputar presente o fumus boni juris da pretensão da parte autora, quanto ao seu pedido de tutela provisória. Quanto ao periculum in mora, reputo-o igualmente presente, posto que a subsistência da parte autora é (ao menos relativamente) comprometida com a diminuição de seus rendimentos, após a incidência na fonte da contribuição previdenciária ora impugnada. 
Com base no Poder Geral de Cautela e por se tratar de tutela judicial conferida em cognição sumária, reputo mais adequado que a Contribuição Previdenciária seja depositada mês a mês em conta judicial remunerada a ser aberta pelo empregador, a partir da ciência desta decisão, e lá mantidos até o julgamento definitivo desta ação. 

*Euclides Morais- advogado ([email protected])


DIREITO E POLITICA

Prá frente Brasil, salve a seleção!

*Carlos Augusto Martinelli Vieira Da Costa
 Caro leitor, sei que você transita por este espaço em busca de considerações políticas, e não por razões esportivas, até porque para estas existem outras páginas com gente muito mais gabaritada e interessante. Todavia, estamos em plena Copa do Mundo, e não há como deixar de levar em conta este fato, até porque ele tem muito a nos dizer sobre política, sociedade e comportamento.
Veja, por exemplo, a vitória da seleção de México sobre a Alemanha, numa reedição moderna da parábola da luta entre Davi e Golias, onde mais uma vez o gigante foi derrotado. E a supremacia do perdedor, no caso, não é apenas futebolística, mas alcança todas as demais  categorias mensuráveis por critérios sociais ou econômicos. 
Contudo, não há neste exemplo qualquer ranço moralista. É apenas uma chamada para o fato de que no esporte, como na política ou mesmo na vida, as chances não se resumem a cálculos matemáticos de probabilidades ou mesmo análises retrospectivas, pois não raras vezes estes podem ser superados pela situação de momento ou mesmo uma simples questão de atitude.
E para nós brasileiros este embate e suas consequências ainda teve outro sabor não tão nobre, mas nem por isto menos aprazível, que foi o doce gosto da vingança. Afinal, a humilhação de quem nos humilhou sempre representa uma redenção, e mostra que a roda gira e a fila anda.
De qualquer modo, mesmo que a seleção brasileira tenha a sorte e a virtude de nos trazer o hexa, isto por si só não terá o condão de nos redimir das nossas recentes divergências, cada vez mais arraigadas ao ponto de nos diluir com nação. 
Todavia, com o tempo talvez consigamos compreender que,  tal como no futebol, o  importante é saber lamber as feridas, que sempre serão nossas, mas não devem impedir aqueles que vem à nossa frente de construir o seu próprio momento.

*O autor é Procurador do Município de Curitiba


PAINEL

Pensão
Pai não é obrigado a pagar pensão para filha maior de idade que faz curso de pós-graduação. O entendimento é da 3ª Turma do STJ.

Citação
Em ação de improbidade administrativa a citação pessoal réu é obrigatória. O entendimento é da desembargadora Mônica Sifuentes, do TRF da 1º Região.

Cheque
Desde que não haja vedação expressa, o acordo judicial pode ser pago com cheque no último dia do prazo. O entendimento é da 6ª Turma do TST.

Responsabilidade
Shopping Center deve indenizar consumidor que foi roubado por um homem armado no estacionamento, pois o risco da atividade e a ideia de segurança transmitida pelos shoppings centers tornam esses estabelecimentos responsáveis pela integridade física dos seus clientes.  O entendimento é da 21ª Câmara Cível do TJ do Rio de Janeiro 

Defensoria
A Defensoria Pública tem legitimidade para propor Ação Civil Pública para discutir problemas ocorridos em presídio terceirizado.  O entendimento é do desembargador Paulo César Caminha e Lima, do TJ do Amazonas.

Virada
Acontece no dia 07 de julho, no Centro de Eventos da FIEP, a Virada Jurídica, idealizada para advogados, estudantes ou bacharéis. Serão mais de 20 palestrantes divididos em mais de 15 apresentações, workshops. A abertura acontece às 9h30 com palestra dos especialistas Luciana Salles Worms e Renato Almeida Freitas falando sobre o tema “Direitos Humanos em tempos de extremismo: Intolerância no Século XXI”. Inscrições e programação completa no site: http://www.viradajuridica.com/

Sobrenome
É possível o restabelecimento do nome de solteiro em caso de morte do cônjuge. O entendimento é da 3ª Turma do STJ.


Livro da semana
França, 1840. Marie Lafarge é acusada pelo homicídio do próprio marido, Charles Lafarge. O crime contou com grande repercussão. No Tribunal lotado, a cadeira dos réus era o único espaço ocupado por uma mulher. À época, mulheres não podiam exercer o direito ao voto ou compor o corpo de jurados. Marie Lafarge foi (supostamente) julgada pelos seus pares. E condenada. Brasil, 2017. A condição da mulher – no banco dos réus ou fora dele – ainda precisa ser discutida. Não obstante a mulher tenha conquistado espaço e direitos, os discursos utilizados no Tribunal do Júri – que se afastam da linguagem técnica e se aproximam dos discursos sociais – evidenciam a desigualdade e a relação de poder que ainda marcam a sociedade. Há a contínua produção do que é “ser homem” e do que é “ser mulher” e, consequentemente, do (triste e perigoso) binômio desvio-correto, anormal-normal, condenáveis -não condenáveis. Esta obra faz parte da coleção GRANDES JULGAMENTOS DA HISTÓRIA – As Dimensões Conceituais da Justiça, coordenada por Luiz Eduardo Gunther e Marcelo Bueno Mendes