Franklin de Freitas – Visconde de Guarapuava

Um mar de carros. Luzes de freio acesas, cruzamentos bloqueados. Como trilha sonora, buzinas incessantes. É a sinfonia do stress, cada vez mais frequente em Curitiba – e já não restrita apenas aos horário de pico. E teria como ser diferente? Curitiba tem hoje 1,42 milhão de veículos, de acordo com os dados mais recentes do Detran-PR. Isso dá uma taxa de 0,740 veículo por habitante, número maior até do que São Paulo, a maior metrópole do País, que tem um índice de 0,735 veículo/habitante.
Tudo o que está ruim, porém, tem como piorar. E pode também não demorar muito para que se verifique essa piora.

“Se o ganho real do salário tivesse continuado, como foi até 2013, a situação seria muito mais caótica, levaria a um problema incontornável, ninguém andaria mais. A recessão é que, de alguma maneira, deu uma folga. Mas, tendo um crescimento, isso vai voltar a ser um drama. Quanto mais renda, mais deslocamentos por automóvel”, diz o Engenheiro Civil Valter Fanini, um dos autores do Caderno Técnico sobre Mobilidade Urbana publicado pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Paraná (Crea-PR).

Os fatos, inclusive, reforçam o discurso. De 2007 a 2019, intervalo que inclui o período mais recente de crescimento econômico do Brasil, o número de veículos na Capital cresceu 47%, passando de 966,7 mil para 1,42 milhão. Os carros são a maior parte da frota, respondendo por 68% do total.

“Não há obra que dê conta para que todos tenham carro. O espaço viário é limitado. Pode-se melhorar pontualmente, em áreas periféricas, mas não vai muito longe do que está aí. Não tem solução a não ser reduzir o número de automóveis”, afirma Fanini.

A maneira mais simples de se fazer isso seria ampliar o uso do transporte coletivo. Contudo, de 2015 a 2018 o número de passageiros caiu na cidade. O cálculo mais recente da prefeitura é de 1,39 milhão de usuários por dia útil, o que significa qu 230 mil pessoas deixaram de passar pelas roletas dos ônibus, estações-tubo e terminais curitibanos nos últimos anos.

Disponibilidade de veículos; tempo de espera e deslocamento; lotação; segurança e custo da tarifa são algumas das principais explicações. “Hoje, o transporte público não é uma alternativa. Quando você não tem poder de escolher, é obrigado a usar algo, a demanda é cativa. E nesse caso, a demanda é quase que em 98% cativa”, estima Valter Fanini.

Quais as alternativas para a cidade?

Para um problema desse tamanho, não existe solução rápida. A cereja do bolo da mobilidade urbana, o metrô, parece cada vez mais distante, sobretudo em tempos de crise fiscal e investimentos restritos. “O metrô aliviaria muito, principalmente no centro da cidade. A linha Norte/Sul é extremamente integrada, com uma área de abrangência muito grande. Junto a um sistema de viagens curtas, com bonde ou pequenas linhas, como a Circular Centro, muita gente que vem de carro para o Centro não viria mais, pela velocidade do deslocamento, gasto com estacionamento, stress para dirigir”, opina Fanini.

Uma possívelsolução, então, seria investir na integração entre modais e num sistema de gestão de tráfego em tempo real, calculando o tempo de todos os semáforos. Além disso, o engenheiro José Ricardo Vargas de Faria reforça que também é preciso repensar a dinâmica dos deslocamentos. Segundo ele, o transporte coletivo não acompanhou a expansão da cidade nas últimas décadas, quando a população se adensou em áreas mais periféricas, por conta do custo financeiro menor. Enquanto isso, os eixos estruturais – com uma canaleta central e exclusiva para ônibus, e duas vias expressas pelas laterais – ficaram justamente nos lugares cuja demanda é menor.

“O Bigorrilho, por exemplo, está dentro de uma zona estrutural, mas tem menos habitantes por hectare que o Sítio Cercado, que não tem esse sistema. O maior carregamento de passageiros ocorre nas pontas (sobrecarregando o sistema). O deslocamento é muito grande. Temos que facilitar a moradia em regiões centrais, usando terras públicas, e pensar em ‘novos centros’, com serviços mais perto de onde as pessoas moram e trabalham”, completa Faria.