Sempre fomos bombardeados por discursos ilusórios e distantes da realidade, do vendedor de rua que apregoava as maravilhas do elixir cura-tudo, aos malandros de alto coturno que nos ofereciam a salvação da alma mediante uma pequena quantia simbólica, ou políticos desonestos que acenavam com um país onde não houvesse fome, dor ou sofrimento desde que lhes déssemos nosso voto e tivéssemos paciência por vinte anos, o tempo necessário para sua ideologia começar a dar frutos, ou para que enriquecessem merecidamente com nossa ingenuidade.

Agora estas patranhas chegaram ao paroxismo, em qualquer esquina real ou virtual deparamos com donos das verdades mais estranhas, terra plana, cloroquina, um capitão que sonha tornar o país sua capitania hereditária, ministros da educação que odeiam a educação, diplomatas que se encarregam de puxar brigas estéreis com nossos maiores parceiros econômicos, “responsáveis” pelo meio ambiente que desejam degrada-lo, generais que colaboram com a erosão da disciplina militar, ministros da economia que parecem quiméricos cada vez que falam.

São tantas as incongruências e dispartes a que somos submetidos atualmente por parte de pessoas que ocupam cargos proeminentes de nossa Republica, alguns artistas e blogueiros, que nos vemos submetidos a uma guerra de narrativas onde fatos são menos importantes que suas versões, e algumas delas tão malucas que nos trazem certeza de termos entrado em uma espécie de realidade paralela.

É certo que a construção da individualidade tem início e também finaliza com a história dos relacionamentos e situações vividas, ou seja, existimos e construímos nossa identidade por meio de nossas relações externas, do concreto que vivenciamos e conceitos que internalizamos desta forma. O contexto social nos edifica, nos conecta ao mundo, transformando em inteiro aquilo que era fragmentado, entretanto, quando externamente tudo está contraditório e difuso, escolas e pais tem dificuldade em educar, na expressão mais ampla deste termo.

Algumas personalidades totalmente alheias ao sistema educacional tem poder sobre vários de seus segmentos, guerras ideológicas fora do contexto pedagógico, entre olavistas, militares, religiosos, dividem o espaço que deveria ser exclusivamente das melhores metodologias de ensino e aprendizagem.

Bertold Brecht, poeta e dramaturgo, nos alertava: “Nada é impossível de mudar. Desconfiai do mais trivial, na aparência singela. E examinai, sobretudo, o que parece habitual. Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural, nada deve parecer impossível de mudar”.

Num momento de conselheiros paralelos, muitas vezes recomendando exatamente o contrário dos oficiais, de relatórios paralelos e pessoas da mais baixa extração dando as cartas e comandando de forma velada as mais altas instâncias governamentais, é preciso mudar.

São tempos terríveis, quando os arautos da dependência e do fim das liberdades da democracia valem-se justamente da data cívica para anunciar destruição de instituições, derrubada da Constituição e dos direitos e deveres que ela preconiza. São tempos tristes, quando nossa bandeira e nossas cores nacionais são apropriadas por uma parcela da população que não as respeitam, que não nos respeitam, que falam em guerra e esta guerra é contra nós.

Nesses momentos, é preciso mudar, mais que nunca. Para que as mortes, as torturas, a censura do passado sejam apenas má lembrança que nos sirva de alerta.

Todos temos direito a um bom sistema educacional, a uma boa qualidade de vida, e principalmente paz. Temos direito às nossas opiniões, não temos direito aos fatos. A realidade não pode e nem deve ser negada por nenhum motivo, nem pelos mais tortuosos do universo paralelo.

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.