Franklin de Freitas

Diversos portais de notícia trouxeram na manhã desta quarta-feira (1º de julho) uma notícia “urgente” e positiva. A Pfizer, em parceria com a empresa de biotecnologia BioNTech, demonstrou bons resultados de testes em humanos. Em seu site, a Revista Exame, por um exemplo, deu a seguinte manchete: “Vacina contra covid-19 funciona e laboratório Pfizer pode produzir um bilhão de doses”.

A notícia, de fato, parece positiva. Mas há motivo para tanto alarde, tanta animação? Ao menos por enquanto, a resposta tem de ser negativa. Em verdade, no mínimo, é certo que é exagerado o frenesi causado nas redes sociais.

O primeiro ponto a se analisar é: a Pfizer é uma empresa privada. Tem interesse econômico em divulgar que está perto de achar uma cura para a Covid-19. A própria Exame, por exemplo, trouxe a informação que as ações da empresa subiram mais de 4% na bolsa americana após ser anunciada a novidade.

Acontece, porém, que a candidata à vacina teve testagem minúscula: 45 voluntários, dos quais 12 receberam uma dose de 10 microgramas, 12 receberam 30 microgramas, 12 receberam uma doce de 100 microgramas e nove foram tratados com a versão em placebo.

Importante, então, entendermos como funcionam as etapas para testagem de uma vacina.

Como funcionam os testes para uma vacina

Primeiro, há uma fase exploratória, com pesquisa e identificação de moléculas promissoras, os antígenos. No segundo momento, uma fase pré-clínica, ocorre a validação da vacina em organismos vivos, com o uso de animais como ratos.

Só aí se inicia a fase de testes clínicos, que se divide em três momentos diferentes.

Primeiro, são feitos os ‘testes seguros’, com a vacina sendo aplicada em um número pequeno de pessoas, para se verificar a segurança do medicamento e avaliar dosagens, bem como confirmar de que forma a vacina estimula o sistema imunológico. É nesta etapa do estudo que se encontra a candidata à vacina da Pfizer, por exemplo.

Se a candidata apresenta bons resultados, passa-se à segunda fase, na qual os cientistas dão a vacina para centenas de pessoas em diferentes grupos, como crianças e idosos, para verificar como o medicamento age em cada um deles. Novamente, então, é feita a avaliação sobre o quão segura é a potencial vacina e sua capacidade de estimular o sistema imunológico.

Na terceira e última fase, então, são feitos os testes de eficácia, com a vacina sendo aplicada em milhares de pessoas. Os cientistas, então, comparam entre os voluntários que receberam o medicamento e aqueles que receberam um placebo quantos foram infectados. Só então é determinado se a vacina, de fato, protege contra o coronavírus e, a partir daí, cada país avaliará os resultados para decidir se aprova ou não a vacina, ou seja, se concede um registro sanitário.

Em entrevista recente ao Bem Estar, Álvaro Furtado Costa, médico infectologista do HC-FMUSP, lembrou que o mundo testou vacinas de HIV que chegaram até a fase 3, mas aí falharam. Ele também comentou na ocasião que anúncios muito otimistas sobre vacinas, não raro, ajudam a impulsionar ações da empresa que a anuncia – o que também aconteceu no caso citado.

Corrida pela vacina tem mais de 140 candidatas

Hoje, conforme informações do jornal The New York Times, há mais de 130 vacinas em todo o mundo ainda em fase pré-clínica de testagem. Outras 13 candidatas 13 se encontram no estágio inicial da fase clínica, enquanto outras nove estão na fase dois e três, na fase três – entre elas uma desenvolvida pela Universidade de Oxford, no Reino Unido, e que foi aplicada em cerca de dois mil brasileiros, numa iniciativa da USP com apoio do Ministério da Saúde.

Uma das candidatas mais avançadas, já aprovada para uso limitado, é uma vacina desenvolvida pela chinesa CanSino Biologics, em parceria com a Academia Militar de Ciências Médicas da China. No último dia 25, após resultados bastante promissores na fase 2 do estudo clínico, as forças armadas chinesas aprovaram o uso do medicamento nos militares, com registro válido por um ano. Ainda não há informações, contudo, se essa vacinação será obrigatória ou opcional para os soldados.

Outras candidatas em estágio bem mais avançado que a vacina da Pfizer estão sendo desenvolvidas pela AstraZeneca em parceria com a Universidade de Oxford – aquela cujos testes estão sendo feitos no Brasil; em junho também a Sinofarma, da China, anunciou que estava entrando na última fase de testes clínicos, que serão realizados nos Emirados Árabes Unidos; outra chinesa, a Sinovac Biotech, está preparando o início dos testes da fase três, com a aplicação do medicamento em pessoas na China e no Brasil; e na Austrália o Instituto de Pesquisa Infantil Murdoch está testando uma vacina que utiliza o Bacilo de Calmette-Guérin, ou BCG, utilizado há mais de 100 anos como proteção contra a tuberculose. Esses são os três estudos em desenvolvimento que se encontram no terceiro estágio da fase clínica de testes.