Por milênios a humanidade não contou com nenhum recurso eletrônico, elétrico, ou sequer mecânico. As ferramentas baseadas no princípio da alavanca, que multiplicam a força aplicada, datam de alguma coisa como cinco mil anos, aproximadamente quando a roda e a tração animal para transporte e agricultura também começavam a ser empregadas. A seguir, os moinhos de vento, rodas d’água, catapultas e máquinas variadas entraram no repertório. Parece muito tempo, mas na perspectiva da vida do homo sapiens na Terra é apenas um suspiro.

O uso do vapor como força motriz e os primeiros estudos com a eletricidade datam do final do século XVIII, daí as locomotivas e navios a vapor, iluminação a gás, motores de explosão, e os veículos “auto-móveis” que se locomoviam sem o uso de cavalos, o voo dos objetos mais pesados que o ar. Tudo em apenas cem anos.

Os primeiros computadores, sucessores também de ábacos sofisticados que os chineses e árabes já utilizavam, tornaram-se operacionais na Segunda Guerra mundial. Então, no curtíssimo espaço de oitenta anos, chegamos aos computadores pessoais, smartphones, e outros equipamentos eletrônicos que se tornam “superados” em seis meses com o lançamento de novos aparelhos mais potentes, mais leves e até mais bonitos e que se tornam objeto de desejo de pessoas que geralmente não aprenderam a usar todas as condições do anterior.   

A ciência envolvida nesta revolução tecnológica vem de longe, deve muito ao matemático alemão Gottfried Leibniz criador do cálculo integral, também a outros como Isaac Newton, físico, matemático, astrônomo, e que declarou: “enxerguei longe por estar no ombro de gigantes”, em homenagem aos demais cientistas que o antecederam. E disso vieram os recursos que tornam as máquinas operacionais e fascinantes como a internet de quem tudo parece derivar, e também os vícios a ela associados, que tem sido pesquisados desde 1996, e se tornou um importante campo de estudo, atraindo a atenção de pesquisadores de várias áreas, que tentam estabelecer se esta é apenas uma dependência, ou se caracteriza como qualquer outro tipo de adicção, como os jogos de azar.

Não existe ainda uma definição padrão para o uso patológico da Internet, normalmente descrita como a compulsão de aumentar o tempo gasto em rede, permanecer on-line sempre por tempo maior que o planejado, ter problemas físicos, sociais ou psicológicos, mostrando-se sempre ansioso. Como qualquer outro jogo em que se perde o domínio de tempo e convivência comunitária, possivelmente é um vício comportamental, um distúrbio de controle de impulsos sem que exista a ingestão de substância intoxicante.

A necessidade de estar cada vez mais conectado traz desconforto físico, mudanças de humor, depressão por não conseguir reduzir o uso, e isso tem sido nomeado como “uso problemático da internet”, e a mais forte evidencia disso parece ser nossa incapacidade de ficar sem nossos celulares ao longo de todo o dia, ou até mesmo acordar no meio da noite procurando por eles. Em encontros amorosos, em reuniões de professores, alunos no tempo de intervalo das aulas (ou mesmo durante as aulas), no transporte coletivo – e muitas vezes no individual, provocando sérios acidentes – a onipresença de nossos equipamentos móveis passam a impressão de que nossos sentimentos todos estão sendo mediados por eles.

O uso excessivo compromete nossa saúde mental e também a física, além de provocar isolamento social, pois o mundo virtual parece sempre mais feliz, mais bonito e equilibrado que o mundo real, com o único defeito de não existir. Quanto mais conectado, mais distante das agruras do dia – a – dia, maior é a tendência é de uma reformulação radical no conceito de identidade pessoal, com intensas transformações nas características anteriormente assumidas para classe, sexualidade, e mesmo nacionalidade, pois a revolução da informação e da comunicação projeta um mundo eletrônico vasto e misterioso de novos relacionamentos nas redes, nas quais podemos criar avatares que correspondem na maior parte das vezes àquilo que sonhamos para nós mesmos, com novos papéis sociais, comportamentos mais heroicos ou rebeldes, personalidades muito distantes das reconhecidas anteriormente.

Evidentemente o poder de atração da internet sobre crianças e jovens com deficiências é imenso, cabendo maior cuidado nesses casos, pois a fuga para um universo sem estas limitações torna-se quase irresistível. Mas a todos, inclusive adultos, tem sido difícil resistir a fuga do concreto em direção a um mundo mais mágico.

Educar nestes tempos, se por um lado conta com mais ferramentas auxiliares, por outro representa competir com toda esta fascinação.

 

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.