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Tania Alice e seu cão Buda: sem o parceiro, a artista-pesquisadora, que tem autismo, não conseguirá vir para a capital paranaense (Foto: Arquivo Pessoal)

A artista-pesquisadora da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), Tania Alice, está enfrentando uma verdadeira cruzada para conseguir fazer uma viagem até Curitiba. É que ela, numa situação paradoxal, foi convidada para participar de um evento inclusivo na capital paranaense, chamado TEATOS, mas não está conseguindo autorização para poder viajar com seu cão de suporte emocional, uma necessidade essencial devido ao seu autismo.

Tania foi convidada para participar do evento, que acontecerá entre os dias 25 e 29 de junho e é focado em ações artísticas e reflexivas de interlocução entre teatro e autismo, como palestrante convidada e também como performer. Para vir até Curitiba, ela adquiriu uma passagem aérea com a GOL Linhas Aéreas, mas ao solicitar via Medif (Formulário de Informações Médicas) o direito de viajar com seu cão, chamado Buda, teve o pedido negado pela companhia aérea.

“É um evento sobre inclusão, autismo e teatro. Vai acontecer para estar dialogando sobre essas questões do autismo, da arte, e é paradoxal eu não conseguir ir pro evento porque não me deixam viajar com meu cão de suporte emocional”, lamenta ela, que está com Buda há quatro anos, desde que ele era filhote.

“O cão de suporte emocional é diferente do cão de assistência. O treino do cão de assistência é mais rígido, mais longo, atende cegos, pessoas com epilepsia… O cão de assistência emocional já auxilia pessoas que são autistas, que se enquadram como pessoas com deficiência, mas também quem tem transtorno de ansiedade, fobia social, pânico. A presença deles acalma as pessoas e permite que elas façam coisas que não conseguiriam fazer sozinhas”, explica Tania.

Pedido liminar negado

Para tentar contornar a negativa da GOL e determinada a não desistir de participar do evento em Curitiba, Tania buscou assistência legal e tentou obter uma liminar para garantir o transporte do animal no avião. No entanto, a juíza responsável pelo caso negou a liminar, alegando que as companhias aéreas têm o poder soberano de decidir sobre o transporte de animais de suporte emocional e, consequentemente, da pessoa que depende deles.

A artista, inclusive, conta que todas as vezes que precisa viajar de avião, independente de qual seja a companhia aérea, acaba tendo de recorrer à Justiça para conseguir garantir que Buda poderá estar com ela na viagem. Antes, porém, ela vinha conseguindo as autorizações para a viagem no Poder Judiciário, algo que mudou recentemente.

A GOL, por sua vez, começou a vender uma espécie de passagem para pets, mas é apenas para cães de até 12 quilos. Outra companhia aérea, a TAM, não limita por peso, mas exige que o animal tenha de caber numa caixinha. “Se vendesse passagem [para cachorro], eu comprava, é mais barato do que ficar toda hora pedindo liminar na Justiça. Mas não vendem. Então o que acontece é que quem tem um cão pequeno e não é neurotípico, só paga a passagem para o pet e viaja. Quem realmente precisa, porém, não consegue, porque a maioria dos cães de suporte emocional são golden, e daí ultrapassa o peso limite estipulado pelas companhias”, explica Tania.

Em busca de uma solução

Tania ainda ressalta que a organização, direção e produção do evento estão todos sendo parceiros dela e buscando auxiliar na busca por uma solução para a questão. Comemora, também, os holofotes que seu caso está trazendo para o tema.

“O evento está chamando a atenção das pessoas para essa necessidade. Um autista, tendo cão, consegue eventualmente até parar a medicação e fazer muitas coisas, porque é um parceiro de tudo. O evento tambémestá sendo extremamente parceiro e companheiro nesse procedimento, e como o evento é sobre isso, espero que isso possa servir [para algo maior], porque não quero resolver meu problema, queria resolver o problema de todas as pessoas que precisam do cão e não podem viajar porque o cão ultrapassou o peso limite.”

Além disso, ela conta que o responsável pelo setor de acessibilidade da GOL já entrou em contato com ela e está tentando encontrar uma forma de resolver a situação.

Precisamos falar sobre inclusão

“Mês que vem [Abril Azul] é o mês do autismo, da inclusão. É importante entender a especificidade da demanda das pessoas autistas. Se fala muito em inclusão, mas se fala pouco de práticas inclusivas. Espero que essa divulgação sirva para que as pessoas autistas e também outras que precisam de seus cães possam viajar sem ser cobrado delas que seja um cão de assistência, que é um treinamento caro, oneroso, e às vezes nem é necessário, porque a pessoa precisa mesmo da parceria do cão”, afirma Tania.

Ainda segundo a artista, no estado do Rio de Janeiro existe desde 2021 a Lei Prince (Lei nº 9.317, de 14 de junho de 2021), que autoriza pessoas com necessidades especiais a transitar com seus cães de suporte emocional por todos os espaços públicos. “Precisa de adestramento, colete, carteira de identificação e a pessoa tem que ter um laudo psiquiátrico que confirma a necessidade. Com essa lei, conseguimos circular. Mas é uma lei estadual, se vou para São Paulo já não vale e aí tudo depende da boa vontade das pessoas”, comenta ela, fazendo um apelo para que iniciativas desse tipo se espalhem.