Morto a tiro, ex-governador do ES propôs desarmamento há quase 20 anos

Folhapress

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O ex-governador do Espírito Santo Gerson Camata (MDB) morreu em dezembro de 2018, aos 77 anos, após levar um tiro que o atingiu no pescoço. O crime aconteceu quase 20 anos após ele ter proposto, em 1999, mudança na legislação para desarmar civis em todo o país. Na época, como senador, Camata apresentou o projeto de lei 292/99, que deu origem mais tarde ao Estatuto do Desarmamento. 


Marcos Venicio Moreira Andrade, 66, foi o autor do disparo e confessou o crime. A arma utilizada por ele estava registrada em seu nome, mas com a licença vencida. Com as mudanças propostas pelo decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro na terça (15), ele poderia ter a situação regularizada.


Quando defendeu a restrição das armas, Camata falava sobre uma possível mudança no sistema de segurança pública, que ocorreria ao longo do tempo como um processo natural.


A pesquisadora Rosana Alexandre dos Santos registrou em sua dissertação de mestrado, na Universidade de Brasília, trecho do discurso do ex-senador, na ocasião do início das discussões e votação sobre o desarmamento no país.


“É claro e é necessário que as pessoas que nos veem e nos ouvem saibam que, a partir do dia em que o presidente Lula sancionar o projeto, depois de aprovado pela Câmara, os crimes não vão diminuir no Brasil, mas os que portam armas com a intenção de praticar o crime vão começar a ser cerceados, como ocorreu na Itália. Devagar, eles irão perder as suas armas. Devagar, vão acabar na prisão. E, devagar, se diminui o número de armas em mãos da população e em mãos daqueles que usam a arma com a intenção de praticar delitos e de praticar crimes”, afirmou.


Antes da aprovação do desarmamento Camata chegou a ter que mudar sua rotina por episódio em que houve o uso indiscriminado de armas de fogo. No fim da campanha eleitoral em 2002, por exemplo, ele e o senador Paulo Hartung (PSB), que na época concorria ao governo, chegaram a desistir de ir a um comício em Cariacica (região metropolitana de Vitória), depois de uma troca de tiros no local que deixou duas pessoas feridas.


Os desentendimentos entre Andrade e Camata começaram quando o assessor, que trabalhou com o político por quase 20 anos, o denunciou por crimes de corrupção.


Na época Gerson Camata se defendeu no plenário e negou as denúncias. Ele afirmou que o ex-assessor sofria de “distúrbios psiquiátricos” e que as denúncias são uma “falácia, calúnia”.


Posteriormente ele processou o ex-assessor, numa ação que chegou a bloquear R$ 60 mil em uma de suas contas bancárias, o que teria motivado a discussão e o disparo contra o ex-governador.


Andrade disse, em depoimento, que foi tirar satisfações do ex-governador ao encontrá-lo em uma rua na Praia do Canto, bairro onde o agressor mora. Após uma discussão verbal, o ex-assessor sacou uma arma e disparou contra o ex-governador.


Em entrevista à imprensa, o secretário da segurança pública do Espírito Santo, Nylton Rodrigues, afirmou que Marcos Venício demonstrou ressentime.


Nesta terça (15), o presidente Jair Bolsonaro assinou um documento que alterou o decreto que regulamenta o Estatuto do Desarmamento, lei federal aprovada em dezembro de 2003 que restringe a posse e o porte de armas no país. Como ressaltou o presidente durante discurso, a medida assinada nesta terça não muda essa lei, visto que alterações no estatuto precisam obrigatoriamente passar pelo Congresso.