REINALDO JOSÉ LOPES
BELO HORIZONTE, MG (FOLHAPRESS) – O genoma da onça-pintada (Panthera onca), decifrado pela primeira vez por pesquisadores brasileiros e colegas do exterior, traz as marcas de um épico evolutivo com mais reviravoltas que novela mexicana. Nos últimos milhões de anos, o maior felino das Américas sofreu brutais reduções de sua população, precisou se adaptar a um estilo de vida muito diferente do adotado pelos demais grandes gatos e ainda teria se cruzado com outras espécies, num processo que pode ter garantido sua sobrevivência.
Apresentados durante a reunião anual da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) e publicados na revista especializada “Science Advances”, os dados também permitem uma análise de complexidade sem precedentes sobre a história evolutiva dos felinos de grande porte do gênero Panthera. O grupo inclui ainda os leopardos, leões, tigres e leopardos-das-neves.
No trabalho, os pesquisadores Eduardo Eizirik e Henrique Figueiró, da PUC-RS, junto com colegas do Brasil e do exterior, decodificaram tanto o genoma completo de um exemplar de onça-pintada quanto o de um leopardo. Depois, esses dados foram comparados com os de genomas já publicados das demais espécies do gênero Panthera, um processo que lembra o de colocar várias versões ligeiramente diferentes de um mesmo texto lado a lado.
Com isso, o grupo pôde estimar que os felinos que deram origem às onças se separaram do grupo formado pelos ancestrais dos leões e leopardos há cerca de 3,5 milhões de anos tigres e leopardos-das-neves teriam divergido primeiro dessa turma.
VIGOR DOS HÍBRIDOS
Mas uma das grandes surpresas é que, apesar dessa estimativa de “árvore genealógica”, várias regiões do DNA dos animais contêm pistas de uma separação bem mais recente. Seriam indícios fortes de que, mesmo após o surgimento de espécies distintas, os grandes gatos teriam continuado a cruzar entre si ocasionalmente, e esses híbridos acabaram contribuindo de forma significativa para o genoma dos bichos de hoje.