
O caminho do meio, do equilíbrio, é o caminho da virtude. Mas a natureza, que não se guia por princípios éticos, não tem sido virtuosa ou bondosa com o Paraná, tanto que o estado, depois de sofrer por mais de dois anos com uma das maiores secas de sua história, agora sofre com os impactos das chuvas intensas e temporais.
Para tentar entender a relação entre os dois fenômenos climáticos que afetaram a região de Curitiba nos últimos anos, o Bem Paraná apelou para os especialistas do Sistema de Tecnologia e Monitoramento Ambiental do Paraná (SIMEPAR). Segundo o meteorologista Reinaldo Kneib, ainda não é possível relacionar, cientificamente, as duas situações, até porque é comum haver excesso de chuva nesta época do ano no leste paranaense (Curitiba e litoral). Por outro lado, ele reforça que já existem estudos que apontam no sentido de as mudanças climáticas estarem potencializando a ocorrência de desastres, de eventos climáticos extremos.
“Alguns estudos apontam nessa direção, que o ser humano, através da emissão dos gases do efeito estufa, faz a atmosfera ficar mais quente, o que gera mais energia. Essa condição aumentaria os extremos: temos mais períodos secos e o oposto pode acontecer, de ter mais tempestades. Mas temos os fenômenos do dia a dia, como a chuva de verão, e temos fenômenos cíclicos, que ocorrem a cada 10, 20 anos, que são fenômenos naturais e que as vezes não são claros no dia a dia, mas acontecem de tempos em tempos”, explica o meteorologista, ressaltando ainda que Curitiba, por ficar entre duas serras, é uma região crítica para fenômenos naturais. “Podemos, inclusive, ter uma potencialização disso tudo nas próximas décadas”, alerta.
No caso específico da tragédia no litoral paranaense, Kneib ainda destaca o papel do próprio homem na criação de condições favoráveis para um desastre. “A Serra do Mar é uma barreira física [para a passagem dos ventos] que acaba intensificando o volume de chuva. Sem a Serra do Mar, também ia chover, mas não ia ter tanto desastre. Mas aí já é uma consequência, também, do planejamento urbano. Criam rodovia numa serra, você desmata, e isso tudo tem consequências.”
Barragens da Grande Curitiba atingem 100% da capacidade
Os dias de chuva no Paraná a partir de 2021, por outro lado, também garantiram o fim da crise hídrica que assolou o estado entre 2019 e 2021. No começo de novembro, por exemplo, as quatro barragens do Sistema de Abastecimento Integrado (SAIC) da Região Metropolitana de Curitiba (RMC) atingiram 100% de sua capacidade. O pleno restabelecimento do sistema (que segue com sua capacidade no limite) ocorreu pela primeira vez ao longo de toda a crise no último dia 1º.
O Paraná foi duramente castigado pela estiagem em 2020, quando os reservatórios atingiram níveis mínimos históricos, de 26,77%, em novembro daquele ano. Segundo o Governo do Paraná, foi a maior estiagem dos últimos 50 anos, pelo menos. Entre 17 de março de 2020 e 21 de janeiro deste ano, então, a Grande Curitiba teve de conviver com o rodízio no abastecimento de água, sendo que ao longo desses 649 dias chegou a ser implementado um rodízio com 36 horas com água por até 36 horas de suspensão no fornecimento de água.
Além do rodízio, contudo, o tempo seco também aumentou o risco e as ocorrências de incêndio pelo estado e impôs perdas financeiras para a agricultura. É que sem chuvas significativas no momento do plantio de grãos, muitos produtores atrasaram a semeadura, fazendo com que a produção sofresse impacto de pragas e de geadas fora dos ciclos convencionais.
A saúde também acabou impactada, por causa do clima seco.
Riscos
Desastres potencializados nas rodovias
Os problemas nas estradas, contudo, são apenas um dos reflexos das chuvas intensas pelo Paraná. Desde o mês passado o estado também tem sido afetado por vendavais, inundações e fortes enxurradas, além das quedas de barreiras. Conforme a Defesa Civil, só nos últimos dois meses foram registradas 116 ocorrências relacionadas às chuvas, com 116 municípios atingidos e 104.700 pessoas afetadas. Pelo menos oito pessoas já faleceram por conta dessas situações – além das duas mortes já confirmadas em Guaratuba, outras quatro pessoas faleceram em ocorrências de enxurrada, uma delas em Nova Laranjeiras, na região central do Paraná (onde quatro pessoas morreram), e outra em Pato Branco, no sudoeste do estado (duas crianças faleceram após serem levadas numa enxurrada).
Em outubro, um desmoronamento de toneladas de pedras nas proximidades do Viaduto dos Padres, na BR-277, bloqueou a rodovia no sentido litoral. O problema persistiu por semanas e recentemente foi ainda registrado mais dois deslizamentos de terra no local, que hoje foi parcialmente liberado, com o trânsito passando a fluir em pista simples. Ainda em outubro, um trecho da rodovia PR-182, em Salgado Filho, no sudoeste paranaense, chegou a ceder e desmoronar por conta da chuva, enquanto em Coronel Vivida um deslizamento de terra bloqueou totalmente a PR-562.
Para piorar, nos próximos dias a previsão para os próximos dias é de um aumento no volume de chuva. Hoje o dia segue com alguma instabilidade atmosférica em função do tempo abafado no Paraná. Possibilidade de chuva, é considerado mais alto a partir do período da tarde, sendo que em alguns casos, as chuvas podem ser acompanhadas de trovoadas.