Reprodução/Nasa

SALVADOR NOGUEIRA

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Nesta quarta-feira (18), às 19h51, partiu para o espaço o satélite Tess, da Nasa. Seu objetivo é descobrir milhares de exoplanetas ao redor das estrelas mais próximas do Sistema Solar —alvos adequados para futura caracterização por telescópios de próxima geração, no espaço e em solo. A expectativa é a de encontrar um punhado de planetas habitáveis e, no estudo posterior desses mundos, até mesmo identificar algum que de fato tenha vida. A empresa SpaceX foi contratada pela agência espacial americana para fazer o lançamento, a partir de Cabo Canaveral, na Flórida.

O lançamento do foguete Falcon 9 estava originalmente marcado para a última segunda-feira, mas foi adiado por dois dias para testes adicionais de controle e navegação pela SpaceX. O primeiro estágio realizou um pouso bem-sucedido na balsa após a missão.

Ao se estabelecer em sua órbita, o Tess deve vasculhar nada menos que 200 mil estrelas próximas em busca de mundos de porte comparável ao da Terra —uma larga amostra distribuída por 85% da abóbada celeste.

Proposto por um grupo do MIT, o Instituto de Tecnologia de Massachusetts, ele fará algo que seus predecessores não fizeram: deve se concentrar em estrelas mais próximas do Sistema Solar. O objetivo agora é encontrar mundos suficientemente próximos para permitir que os novos telescópios espaciais e em solo possam estudá-los em detalhe.

É mais uma etapa num longo jogo para decifrar toda a natureza e variedade dos sistemas planetários que existem aí fora. Até 1995, ninguém sabia sequer se existiam mesmo outros mundos ao redor de estrelas similares ao Sol.

Descobrir os primeiros exoplanetas, na década de 1990, exigiu observar por longos anos estrelas individuais, até que se pudesse captar com convicção o sutil vaivém desses astros conforme planetas ao seu redor usassem sua gravidade para tirar a estrela para dançar, numa lenta e repetitiva valsa.

Em 2009, veio a primeira grande revolução no campo, quando a Nasa lançou o satélite Kepler, cujo objetivo era fazer um censo dos exoplanetas com base em uma amostra limitada.

O telescópio espacial, criado a um custo de cerca de US$ 600 milhões, passou os quatro anos seguintes olhando fixamente para uma pequena região do céu, entre as constelações de Cisne e Lira.

Nesse período, passou o tempo todo monitorando cerca de 150 mil estrelas, em busca de pequenas reduções de brilho nelas que indicassem a passagem de um planeta circundante, capaz de bloquear parte da luz temporariamente.

Com base no quanto de luz era bloqueado, dava para dizer o tamanho do planeta. E contando o tempo que dois desses trânsitos iguais levavam para acontecer, era possível estimar a órbita do planeta —usando para isso as leis de… Kepler (o original, astrônomo do século 17).

Com isso, a missão encontrou quase 4.000 exoplanetas e demonstrou que planetas rochosos, similares à Terra ou um pouco maiores, são ainda mais comuns no Universo que os gigantes gasosos —o que faz total sentido, visto que exigem menos massa para se formarem.

Alguns desses mundos lembravam muito, ao menos em seus parâmetros mais gerais, a própria Terra.

Contudo, a amostra veio com um grande problema: praticamente todos os exoplanetas do Kepler estão distantes demais para que se possa estudá-los mais a fundo.

O satélite fez um censo espetacular, mas não colheu bons exemplares para a próxima etapa de estudos — em que os astrônomos devem observar a composição atmosférica desses planetas e descobrir se são mesmo habitáveis, quiçá habitados.

Aí é que entra o Tess, sigla inglesa para Satélite de Pesquisa de Exoplanetas em Trânsito. Financiado de início pela Google, o projeto do MIT foi abraçado pela Nasa em 2011. A um custo de cerca de US$ 200 milhões (mais o lançamento, que custará outros US$ 87 milhões), ele usará quatro câmeras para observar faixas sucessivas do céu, nos hemisférios Norte e Sul.

A técnica de descoberta é a mesma do Kepler, mas o enfoque é diferente — o Tess terá como foco buscar as estrelas mais brilhantes, a uma distância que varia entre 30 e 300 anos-luz da Terra. Praticamente todos os achados do Kepler estão mais distantes.

A missão inicial terá duração de dois anos, mas pode ser estendida. O satélite será colocado numa órbita especial, jamais usada por uma missão científica, em que ele completa duas voltas ao redor da Terra enquanto a Lua completa uma. Isso confere notável estabilidade e economiza combustível para o andar da missão.

“Esperamos achar pelo menos 50 exoplanetas do porte da Terra em estrelas próximas”, diz George Ricker, pesquisador do MIT e líder da missão. “Esse é nosso critério para declarar sucesso da missão.”

A expectativa é que esses mundos poderão então ser esquadrinhados por equipamentos como o Telescópio Espacial James Webb (a ser lançado em 2020) e novos observatórios em solo, como o GMT e o E-ELT (ambos em construção), em busca de assinaturas de luz que indiquem a composição de suas atmosferas.

Hoje, há poucos candidatos já descobertos que viabilizem esse tipo de estudo, e o favorito no momento é o sistema Trappist-1, a 40 anos-luz de distância.

“A estimativa é encontrar vários sistemas parecidos”, diz Claudio Melo, astrônomo brasileiro no ESO (Observatório Europeu do Sul). “Acho que ainda estaremos vivos quando detectarmos a primeira atmosfera parecida com a nossa.”