Aos 95 anos, pesquisador curitibano anuncia seu 17º livro e já trabalha próximas obras

Após três anos de pesquisa, o professor Ernani Costa Straube concluiu recentemente o “Dicionário Histórico dos Logradouros de Curitiba”, que será lançado no próximo mês. E já tem mais dois livros para “sair do forno”

Rodolfo Luis Kowalski
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Ernani Straube, com fotos de Curitiba das décadas 60 a 80: “Vivi muita coisa” (Valquir Aureliano)

Um verdadeiro colecionador de histórias, o professor Ernani Costa Straube, nascido em 28 de janeiro de 1929, celebrou recentemente 95 anos de vida. Mas ao invés de ser presenteado, ele resolveu foi é presentear Curitiba, anunciando a conclusão de seu mais novo livro (o 17º em sua prolífica carreira): o “Dicionário Histórico dos Logradouros de Curitiba”, uma obra com mais de 440 páginas que resgata os atos oficiais de criação de 5 mil logradouros da Capital, incluindo suas denominações antigas e, em casos selecionados, uma breve biografia ou descrição da origem desses nomes.

Segundo o professor, foram mais ou menos três anos “colecionando” os nomes das ruas curitibanas, verificando qual a lei que determinava suas denominações e pesquisando as origens dos nomes dessas vias. Um trabalho que resultou na criação de dois grandes fichários, onde todas as informações pesquisadas por Straube foram sendo guardadas enquanto ele escrevia o livro, agora prestes a ser lançado – e que em breve estará disponível para download livre no portal www.archive.org e em seu site pessoal, www.professorernani.com.br

“O livro traz 5 mil ruas, mais ou menos metade do total de ruas em Curitiba. Nem todas foram contempladas porque isso seria impossível, então selecionei as principais vias, as ruas mais antigas”, explica o pesquisador. “Fiz dois fichários colecionando o nome das ruas, vendo a lei que determinava aquela denominação e quem era o fulano – uma pequena biografia, de duas ou três linhas sobre a pessoa. Já a parte de zoologia, o meu filho [Fernando, que é ornitólogo] foi quem revisou, porque tem a questão dos nomes científicos e são muitas ruas com nomes de árvore, frutas, pássaros… Então ele quem revisou a parte de zoologia e botânica”, emenda.

Histórias curiosas, inclusive, não faltam. Por exemplo, você sabe onde fica a antiga Rua Alegre? E por que ela ganhou esse nome na época? E a Avenida Guaíra?

“Então, a Rua Cândido Leão, que é aquela que vem da Praça Tiradentes até a Alameda Doutor Muricy, chamava-se Rua Alegre porque ali, segundo consta, havia um alfaiate de sobrenome Alegre. Então as pessoas diziam assim ‘vou lá no Alegre’, e aí acabou que virou o nome da rua mesmo: Rua Alegre”, conta o professor Ernani. “Já a Avenida Kennedy antes era Avenida Guaíra. Kennedy foi presidente dos Estados Unidos, acabou assassinado. Foi ele quem implantou a Aliança para o Progresso e com isso o povo quis homenageá-lo, porque recebemos muitos benefícios com essa Aliança”, complementa.

Outra curiosidade é a influência da política na hora de escolher ou trocar o nome de alguma via. “Os vereadores mudam segundo a politicagem. Muitos nomes de ruas de Curitiba existem em função da política”, analisa Straube. Em 1880, por exemplo, o Imperador do Brasil visitou o Paraná e foi homenageado com o Largo Dom Pedro II. Na mesma época, uma das principais vias de Curitiba passou a se chamar Rua da Imperatriz, enquanto outra ganhou o nome de Rua do Imperador. “Proclamada a República, mudou tudo: o Largo Dom Pedro II virou Praça Tiradentes; a Rua da Imperatriz virou XV de Novembro e a Rua do Imperador virou a Rua Marechal Deodoro.”

Além disso, há ainda as ruas curitibanas que estão, literalmente, em cima de rios. “A Travessa da Lapa, por exemplo, fica em cima do Rio Ivo. Eu sei disso porque conheci ali quando ainda tinha o rio. Na Mariano Torres, você está passando em cima do Rio Belém, que foi canalizado, sepultado com uma estrutura de cimento. E muitas pessoas não sabem disso”, diz o professor, explicando ainda que definir qual foi a primeira rua curitibana é uma missão difícil, quase impossível, porque muitos dos mapas antigos da cidade acabaram se perdendo. “Mas a única rua que se manteve, que não teve nenhuma modificação na denominação, foi a Rua do Rosário”, aponta.

(Valquir Aureliano) Ernani Costa Straub concluiu obra e já trabalha nas duas próximas

Um verdadeiro colecionador de histórias
Antes do lançamento do “Dicionário Histórico”, uma das últimas obras lançadas pelo professor Ernani havia sido o livro “O barco corsário da Cotinga”, que conta a história sobre o afundamento de um navio pirata na baía de Paranaguá, no dia 9 de março de 1718. Por muito tempo, a história foi tratada como lenda, até que o pesquisador conseguiu as provas cabais sobre o fato. “Foi muito difícil, levei quase cinco anos para obter essas informações, que eu consegui na Torre do Tombo, em Portugal. No livro trago 32 documentos comprovando esse afundamento”, diz ele.

Outra obra lançada por ele é “Do Licêo de Coritiba ao Colégio Estadual do Paraná”, que conta a história daquela que seria a mais antiga repartição pública paranaense. O CEP, inclusive, é um marco na vida de Straube: seu pai, Guido Straube, foi diretor do Ginásio Paranaense (outro nome que o Colégio Estadual teve ao longo das décadas) e o próprio Ernani, anos depois, ocupou a mesma função no histórico colégio paranaense.

“O CEP existe desde antes do Paraná ser Paraná. Ele começa como Licêo de Coritiba, em 1846, ainda no tempo imperial. Ele foi criado em São Paulo, porque nessa época Curitiba era a quinta comarca de São Paulo. Inclusive, o Estado do Paraná devia ter se chamado Estado de Coritiba. Mas em 1850 foi criado o Estado do Amazonas, com o nome sendo tirado por conta do Rio Amazonas. Aí acharam que o novo estado também deveria usar o nome de um rio, seguiram a mesma regra, e o ‘Paraná’ acabou escolhido por conta do Rio Paraná”, relata.

Além disso, o pesquisador já está trabalhando em mais duas obras históricas. Um desses livros será uma súmula sobre a história do escotismo no Paraná e o outro, um trabalho sobre os 120 anos de existência do Colégio Bom Jesus. “Sigo trabalhando e já tenho mais dois livros sendo preparados, um está com 150 páginas e o outro já tem 200 e poucas páginas. São trabalhos paralelos, para lançar ainda neste ano”, revela o pesquisador.

História viva
O curitibano de mil faces

Acima de tudo, Ernani Costa Straube é um professor, como ele próprio afirma. Mas a verdade é que ele é muito mais que isso: escritor, historiador, farmacêutico, gestor público nas áreas de educação e segurança pública e perito criminal são algumas das funções já exercidas pelo curitibano, que tem a cadeira número 12 da Academia Paranaense de Letras, já foi presidente do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná e diretor e um dos idealizadores da Escola de Polícia Civil (hoje conhecida como Escola Superior da Polícia Civil do Paraná), localizada no bairro Vila Izabel (Rua Tamoios, 1200).

“Eu que instalei aquela Escola de Polícia na Rua Tamoios. Fiquei lá de 1976 até 1983, então eu tive a satisfação de ter, como professor, a oportunidade de fazer a minha escola: comprei quadro-negro, comprei carteira, tudo o que precisava. Montei essa escola que está lá até hoje, e o mais importante da estrutura mantém-se lá até hoje”, celebra.

Trabalhando na Polícia, inclusive, Ernani Straube acabou se tornando personagem de um dos episódios mais trágicos episódios da história brasileira: ele é o último perito criminal vivo do acidente aéreo na Colônia Murici, em São José dos Pinhais, ocorrido em 16 de junho de 1958 e que vitimou o ex-presidente da República Nereu Ramos e outras figuras políticas proeminentes na época, como o deputado Leoberto Leal e o então governador de Santa Catarina, Jorge Lacerda.

“O avião vinha de Porto Alegre (RS) e passou por Florianópolis (SC), onde embarcaram o Nereu Ramos, o Leoberto Leal e alguns outros. Aí quando o avião chegou na Grande Curitiba, e isso era mais ou menos cinco e meia da tarde, tinha um CB, um Cúmulo-nimbo, que são aquelas nuvens escuras bem poderosas, com Delta de alta pressão. E aí, o que aconteceu? O piloto, quando estava chegando aqui em Curitiba, pede autorização para baixar de altitude. Aí, quando eles estavam a quatro quilômetros do Afonso Pena, houve o que hoje é chamado de Vassoura de Bruxa, que nada mais é do que uma corrente descendente que vai derrubar o avião. Aí caiu para 50 metros e a asa direita foi cortando a copa das árvores. Nisso o avião deu cambalhotas e veio para o chão e no meio do caminho tinha um caule de árvore, que havia sido cortado recentemente e acabou causando todos os ferimentos nas pessoas e as mortes também.”