Arte de transformar aço em faca, cutelaria ganha força no Paraná

Fundada há 10 anos em Curitiba, a Kummer Knives acompanhou todo o processo recente de crescimento do mercado cuteleiro

Rodolfo Luis Kowalski
CUTELEIRO CUTELARIA VINICIUS GABRIEL KUMNER

Kummer Knives: a arte da cutelaria em Curitiba (Foto: Franklin de Freitas)

Fabricar ferramentas como facas, canivetes e outras lâminas é não só uma tradição milenar, mas também uma arte. Uma arte chamada cutelaria e que vem ganhando cada vez mais adeptos no Paraná e em outros cantos do Brasil. Uma arte que mistura força e delicadeza, com as lâminas sendo forjadas a altas temperaturas e moldadas por pancadas precisas de martelo, desferidas por um mestre cuteleiro. É ele o artista capaz de criar as facas artesanais, produzidas para um mercado que está aquecido, inclusive, e é cada vez mais conhecido do público, devido ao sucesso de programas como o reality show Desafio Sob Fogo.

“Tem um crescimento no sentido de conhecimento do pessoal, a cutelaria chegou para muita gente. Antes muitas pessoas não conheciam ou só sabiam daquelas facas que se encontra em posto de viagem, de rodovia. Mas agora a cutelaria está crescendo muito nesse sentido, das pessoas saberem que existem outras pessoas que fazem facas, que não é só a indústria que vende. E a cutelaria oferece um trabalho totalmente personalizado, com uma qualidade totalmente diferente de uma indústria”, afirma o cuteleiro curitibano Vinícius Gabriel Kummer.

Uma década de história na cutelaria

Aos 31 anos de idade, Vinícius já participa há mais de uma década do meio cuteleiro e é o fundador da Kummer Knives, que nos últimos sete anos produziu mais de duas centenas de facas, adagas e outras lâminas para diferentes clientes, atendendo também a diferentes necessidades. Uma paixão, curiosamente, que surgiu por acaso, a partir de uma necessidade prática e de um desafio que Kummer colocou para si próprio.

“Sempre gostei da atividade mateira em geral, de acampar. E em 2014 eu estava procurando um facão para isso e pensei ‘poxa, por que eu não posso tentar fazer o meu facão?’ Aí eu comecei, fui atrás. Na época tinha pouquíssima coisa disponível, mas resolvi tentar fazer a minha faca ao invés de comprar uma”, conta ele, que após adquirir os equipamentos básicos conseguiu fazer suas quatro primeiras peças. “Eram facas rústicas, feias. A primeira delas quebrou agora, esses dias aí, inclusive”, recorda ele.

Foi a partir de 2017, no entanto, que a situação começou a mudar mesmo. Naquele ano, Kummer participou de uma feira de cutelaria que aconteceu em Curitiba. Ali conheceu seus primeiros professores, entre eles Milton Rodrigues, o famoso “Miltão das Facas”, e pouco tempo depois ainda fez um curso de cutelaria. “Dali eu comecei a evoluir bem mais a minha produção. Investi em ferramentas, há dois anos construí minha oficina… Hoje já tenho ferramentas profissionais e toda essa estrutura, que para mim funciona perfeitamente. Faço minhas facas do início ao fim, não terceirizo nada. Compro aço virgem ou um aço reciclado e vou trabalhando a partir disso pra poder chegar no resultado final”, afirma.

O processo de produção: ‘É tudo feito na marreta, às forjadas’

Uma faca artesanal na Kummer Knives custa a partir de R$ 350 e pode atender às mais diferentes e personalizadas necessidades. O primeiro passo do trabalho, inclusive, é justamente saber qual será a função da lâmina que será produzida, porque para uma determinada necessidade pode ser necessário deixar o aço um pouco mais duro ou um pouco mais mole.

“Todos esses detalhes sobre como a faca será utilizada e por quem eu preciso saber antes de começar a produzir a lâmina. Você vai usar para quê? Na cozinha? E vai cortar o quê? Vai cortar alimento mesmo ou vai querer tipo um cutelo para cortar osso? Isso tudo diferencia também a produção. Esses dias, por exemplo, fiz um kit de duas facas, uma pro cara matar o porco e outra para ele limpar o porco. Então fiz uma faca mais pontuda, bem pontuda mesmo, e outra diferente, para ele trabalhar limpando o bicho. A estrutura de fio, o modelo de ponta, o modelo de cabo, tudo vai variar conforme a função daquela faca”, explica o cuteleiro.

Com essas informações em mãos, é hora do cuteleiro colocar a mão na massa. Ou melhor, no aço.

Hora de “colocar a mão” no aço

Se for necessário forjar o aço, a forja é ligada, o aço é aquecido e depois marretado com golpes precisos, até chegar ao formato idealizado no projeto. Por outro lado, se for necessário desbastar o aço, o metal terá toda a sua silhueta recortada para então ser encaminhado à lixadeira, onde é feita a parte do fio e lixada também as bordas do material.

“Depois disso tem o tratamento térmico, que daí vai esquentar o aço até a temperatura crítica, uns 800 graus Celsius, mais ou menos, e daí resfriar no óleo. Na sequência a gente coloca a lâmina uma hora dentro do forninho, pra reduzir a tensão do metal e fazer ele ficar duro o suficiente e mole o suficiente. No forno, ele fica por uma hora, numa temperatura em torno de 200 graus. Aí ele não vai destemperar, o fio vai ficar durável e a lâmina não vai ficar quebradiça, justamente alcançando-se um meio termo ali. E depois disso começa a questão do acabamento: fazemos o lixamento pra lâmina ficar num padrão e começamos a montagem do cabo, com a escolha da madeira. Montando o cabo, a gente cola, espera um dia pra secar, e depois faz o acabamento do cabo, afiação e começa a bainha”, detalha Kummer.

De faca para o holocausto zumbi às facas de churrasco: os pedidos mais comuns e os pais inusitados

Ao longo dos anos, Kummer já recebeu pedidos de clientes do Paraná e de outros estados, como São Paulo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Mato Grosso. Algumas de suas peças, inclusive, já foram vendidas até para o estrangeiro, viajando para países como Noruega, Inglaterra e Suíça. “Já tem algumas coisas que eu fiz espalhadas por aí”, celebra o cuteleiro.

Facas para churrasco

O mais comum, segundo ele, são os pedidos de faca para churrasco. “O brasileiro gosta de churrasco, dá faca de churrasco como presente. Até faca de cozinha está começando a sair um pouquinho mais, porque querendo ou não, de cozinha, de churrasco, é tudo ligado ali à gastronomia, é a mesma coisa praticamente. Mas a principal demanda é a bendita faca de churrasco, tanto que eu costumo ter sempre à pronta entrega uma ou duas facas de churrasco, porque o pessoal sempre aparece querendo comprar para dar de presente para alguém e daí procuram algo que já esteja na mão.”

Adaga inusitada e faca para o apocalipse zumbi

Pedidos exóticos, no entanto, também podem aparecer. Kummer já produziu, por exemplo, uma faca para um possível holocausto zumbi, a pedido de um cliente. O que mais lhe chamou a atenção, no entanto, foi a encomenda de uma adaga. “Não sei o que o cara ia fazer, mas ele não queria uma faca funcional, só queria a estrutura dela ali e não precisava ter fio: era algo mais decorativo ou simbólico. Mas esse tipo de pedido é algo fora do script, porque eu faço facas funcionais, para churrasco, cozinha, acampamento, atividade mateira, limpar a carne de algum animal que foi morto… Eu faço faca pro cara meter na lida mesmo. Mas às vezes aparecem alguns pedidos um pouquinho fora do comum”.

Contato da Kummer Knives

Para quem quiser conhecer mais sobre o trabalho da Kummer Knives, basta seguir a empresa no Instagram: @kummerknives. Outra forma de contatar o cuteleiro é através do WhatsApp (41) 99903-0147.