Franklin de Freitas – Corredor vazio do pronto-atendimento do Pequeno Príncipe: cenário diferente de antes da pandemia

Há um mês e meio era impossível imaginar a sala de espera do Pronto Atendimento do maior hospital pediátrico do Paraná, o Hospital Pequeno Príncipe (HPP), vazia. Naquele tempo, a espera por uma consulta podia chegar a quatro horas. Mas hoje, durante a pandemia da Covid-19, o cenário comum é estar vazio. O diretor clínico do HPP, o médico Donizetti Dimer Giamberardino Filho, calcula que o movimento na emergência caiu 70% durante o período de isolamento. Entre os motivos do esvaziamento do PA, está a ‘saúde de ferro’ gerada com o isolamento forçado pela pandemia. Com as crianças em casa e com hábitos de higiene mais rigorosos, praticamente todas as doenças infectocontagiosas, como gripes, viroses e dor de garganta, tiveram redução de registros. Só nas consultas de emergência por convênios médicos, a média mensal de consultas caiu de 15 mil para 2 mil.

“Chega a ser irônico, porque nos preparamos para uma pandemia e o hospital está vazio; Mas sem escola, as crianças não estão suscetíveis aos vírus que circulam nesta época do ano. Até mesmo os casos de gripes, bronquiolites e dores de garganta estão em baixa. Com os hábitos de higiene reforçados, também temos menos diarreias, enfim todas as patologias”, afirma o médico. Entre os poucos casos que chegam à emergência nestes tempos de pandemia, destacam-se os acidentes domésticos, como cortes e fraturas.

Para ser ter uma ideia, o número de atendimentos de doenças respiratórias na emergência do HPP está exatamente a metade do mesmo período do ano passado. Foram 10.878 atendimentos pelo SUS e convênios de janeiro a abril em 2019 e no mesmo período deste ano, foram 5.406. Não é a primeira vez que o fenômeno acontece. Em 2009, a epidemia de H1N1 fez com que as pessoas retomassem hábitos de higiene e naquele ano todas as doenças deram uma trégua; O médico infectologista do hospital Victor Horácio de Souza Costa Júnior, o quadro pode mudar drasticamente caso as aulas voltem, por exemplo. “Agora, com as crianças em casa, a saúde delas está resguardada para todo tipo de patologia. Mas houver relaxamento do isolamento, todos os vírus e bactérias voltam a ter espaço para crescer e tudo volta ao normal, além do perigo da covid-19. Então o isolamento resguarda o sistema de todas doenças e se ele for relaxado, todas elas voltarão, por isso monitoramos todos os boletins e estatísticas.Tudo pode mudar de repente”, diz ele.

O limite do medo de ir ao PA

Segundo Giamberardino, há também um medo natural das pessoas irem ao hospital em tempos de pandemia. Se antes, por conta de uma dor de barriga simples, os pais corriam para o hospital, agora pensam melhor, consultam por telefone ou internet o pediatra, avaliam melhor. “Isso não é uma exclusividade do atendimento pediátrico. Isso está acontecendo em todos os hospitais da cidade”, explica ele. Giamberardino lembra inclusive que, no caso de adultos, os médicos têm alertado sobre os sintomas de ataque cardíaco e Acidente Vascular Cerebral (AVC), porque pacientes têm morrido por medo de se dirigir aos hospitais. “O mesmo alerta serve para as crianças. Os pais precisam ficar atentos aos sintomas para que não deixem o quadro piorar muito com medo de ir ao hospital. Há casos, como febre alta, desidratação e dores fortes que precisam ser levados à emergência”, alerta o médico.

Isolamento deve gerar déficit adicional de até R$ 20 milhões

E não é somente o pronto atendimento do Hospital Pequeno Príncipe que está vazio, mas a área de internamento também. “O hospital todo está mais vazio, afinal as cirurgias que não são emergenciais foram adiadas. As consultas eletivas também foram em parte adiadas, assim como os exames.. Estão sendo feitas apenas as cirurgias graves e emergenciais e os tratamentos que não podem parar, como a área de oncologia e neurologia. A ocupação de leitos está em torno de 40% da capacidade”, explica diretor clínico do HPP, o médico Donizetti Dimer Giamberardino Filho.

O ‘esvaziamento’ está longe de dar tranquilidade à direção do HPP, afinal gera um problema de sustentabilidade financeira. “Uma parte significativa dos nossos procedimentos é coberta pelo sistema suplementar de saúde (convênios), onde temos uma pequena margem operacional. Com a suspensão, estamos estimando um déficit adicional entre R$ 15 milhões e R$ 20 milhões neste ano, além dos cerca de R$ 33 milhões que já acumulamos de déficit anualmente pela defasagem dos preços praticados pelo Sistema Único de Saúde”, alerta o diretor corporativo do HPP, José Alvaro Carneiro.

“Não podemos reduzir equipe em um momento de pandemia, onde tudo pode mudar, muito menos qualquer despesa. Pelo contrário, é hora de investimento, mas há muito menos atendimentos e cirurgias. É um problema que ficará para depois. Todos os setores serão penalizados financeiramente de alguma forma com a pandemia e com os hospitais e médicos não será diferente”, explica o diretor clínico do hospital.

Como doar
Quem quiser doar para ajudar o Pequeno Príncipe a enfrentar a crise pode acessar o site https://doacaodireta.doepequenoprincipe.org.br/coronavirus

Hospital confirmou seis casos de Covid-19 até agora

O pico da Covid-19 vem sendo adiado em Curitiba graças ao sucesso das medidas de isolamento e agora é previsto para maio e junho, porém tudo pode mudar a qualquer momento, principalmente se as medidas de isolamento forem afrouxadas. “E nós precisamos manter o alerta para isso, embora as crianças não sejam as vítimas preferenciais do coronavírus”, diz diretor clínico do HPP, o médico Donizetti Dimer Giamberardino Filho.

Desde 4 de março, o HPP registrou seis casos confirmados de covid-19 em crianças. Cinco já se recuperaram e até ontem apenas um permanecia internado. Foram investigados 87 casos, e 79 deram negativo. “È irônico que temos toda uma estrutura para alguma coisa que ainda não aconteceu, mas que é necessária”, diz ele.

O médico lembrou ainda que no caso do HPP a pandemia chegou antes nos funcionários, já que 12 tiveram exame positivo para coronavírus. “Na área de saúde é comum que os profissionais trabalhem em mais de um hospital e isso acaba favorecendo a transmissão. O nosso primeiro caso não foi de uma criança paciente, mas sim de uma funcionária, que acabou contaminando uma criança, inclusive. Os desafios da pandemia são emblemáticos”.