
Que tal uma mistura entre forró e metal extremo? À primeira vista, pode soar ou parecer uma combinação até estranha. Mas para Gustavo Henrique Silva, de 37 anos, é quase que um resumo de vida. Ou pelo menos a trilha sonora de uma vida…
Uma figura multifacetada, Gustavo é professor de História da Uninter, vendedor de discos, DJ e também músico. Em sua loja (a Agreste Discos) e no trabalho com discotecagem, o foco é o forró. Já com sua banda, a Cachorro da Duença, a chave vira e vai para um outro extremo, o do metal: trata-se de um grupo de grindcore. E são esses, também, os gêneros musicais preferidos do Professor Gustavo Silva, como ele é conhecido.
Mas afinal, como é possível tal harmonização musical, tão peculiar?
De Caruaru, a Terra do Forró, para o mundo
A parte do forró é fácil de explicar. Gustavo nasceu em Caruaru, no estado de Pernambuco, cidade conhecida como a Terra do Forró. Trata-se de um lugar peculiar, que surgiu a partir de uma feira no agreste do Pernambuco, numa época em que o local era uma rota de passagem de tropeiros. Pessoas de fora, então, começaram a ser recepcionadas, bem como referências musicais distintas. E no meio dessa efervescência toda, surge também uma vocação boêmia para o município, com muitos forrós pela cidade.
“Forró era um nome dado para qualquer tipo de festa, independente do gênero musical. Mas essa vocação boêmia faz muitos artistas migrarem para Caruaru para tocar, para poder se apresentar. E aos poucos a cidade foi se construindo como capital do forró mesmo, do gênero. Muitos artistas nasciam ou migravam para lá, como Onildo Almeida, Janduhy Finizola e Jacinto Silva. Luiz Gonzaga e Elba Ramalho também estavam sempre por lá”, explica Gustavo, que viveu na cidade até seus 18 anos, quando foi para a faculdade em Campina Grande (PB), outra cidade conhecida por sua mega festa de São João.
“A paixão pelo forró vem do nascimento. Desde criança meus pais me levavam pras festas, era uma coisa que envolvia toda a cidade. Na minha rua, lembro de ter visto as últimas palhoças. A galera fazia um barracão no meio da rua, a cobertura era feita com palha de coco, e fazia o forró embaixo. Era uma tradição que tinha. Meus pais me levaram pra show de Azulão, que hoje é o meu ídolo do Forró, lá nos anos 1990. Para mim, gostar de forró é algo natural, orgânico”, explica ainda ele.
A paixão pelo rock e o metal: “agressividade musical”
O rock e o metal, por outro lado, passam a fazer parte da vida de Gustavo na adolescência. No final dos anos 1990, ele já gostava de rock nacional, que escutava pela rádio, com nomes como Raimundos e Charlie Brown Jr. Nos começo dos anos 2000, no entanto, foi que ele começou a ouvir bandas gringas, como Red Hot Chilli Peppers, Guns N’Roses e Nirvana. “Aí foi o divisor de águas. Foi quando decidi que seria roqueiro”, conta o professor, que em 2003 começou também sua coleção de discos. O primeir álbum que comprou foi Rock and Roll Over, do Kiss. O segundo foi Brasil, do Ratos de Porão, banda que ele classifica como aquela que mais mudou sua vida.
“Comprei o disco [do Ratos] por causa da capa, também já tinha ouvido falar da banda. E quando eu ouvi Ratos, disse ‘puts, preciso ouvir coisas mais pesadas, coisas que falem o que esses caras falam’. Foi quando comecei a ouvir punk, hardcore, crossover, thrash metal, e por aí vai.”
Em 2012, ele ainda participou da fundação da banda Cachorro da Duença, pioneira no grindcore em Caruaru, a primeira banda do gênero da cidade. Gustavo é vocalista da banda e compõem a grande maioria das letras do grupo – algumas poeias que ele próprio escreve e depois adapta, fazendo a musicalização. “A música tem de despertar vários sentimentos. Eu gosto da agressividade sonora do grindcore, do thrash metal, do death metal, bem como da alegria e da sensualidade do forró. Ainda não cantei forró, mas quero. Só que é difícil para caramba cantar forró, dependendo do ritmo”, aponta ele, que lançou trabalhos recentes com os colegas, disponíveis no Spotify.
Discotecagem, só com forró, avisa o DJ
A vinda do caruarense para Curitiba, por sua vez, ocorre em 2017, quando Gustavo decide vender quase todas as suas coisas e se mudar para a capital paranaense para recomeçar a vida. Dois anos depois, começou também a discotecar, trabalhando desde o início com o forró, exclusivamente. “Eu comecei a discotecar por uma necessidade de mostrar a coleção, manter a coleção viva. E desde o início eu só discoteco forró, é o que eu tenho para mostrar”, diz ele, que só discotecou uma vez com rock ou metal. E lá em Caruaru, curiosamente. “Teve um festival de blues e rock, uns amigos me chamaram para tocar e discotequei rock lá. Foi a primeira e única vez que discotequei rock”, conta.
Curiosamente, com a banda, ele até hoje não cantou forró, embora tenha esse desejo. “É difícil para caramba cantar forró, dependnedo do ritmo, mas eu tenhoe ssa vontade”, afirma. Por outro lado, aponta que Curitiba já oferece espaço suficiente para o rock, com bandas covers, bandas autorais e outros DJs focados no gênero. Por isso, acredita que contribui mais discotecando forró na cidade.
“Eu discoteco forró, mas rock e metal, não. Veja, eu já tenho a banda de grindcore que satisfaz esse meu desejo por expressar isso, já extravaso ali. E eu acredito que o rock já tem muito espaço, pelo menos em Curitiba. Eu tenho uns 150 discos de forró, todos bem selecionados. Azulão, tenho quase tudo. Estou tentando fechar a coleção Pau de Sebo, uma série de coletâneas da CBS, que eles pegavam os artistas de forró dos selos deles e faziam coletânea. Tenho muita coisa do Trio Nordestino, Jacinto Silva, Marinês, Trio Mossoró, Jorge de Altinho, Nando Cordel, Amelinha… E eu vejo que o curitibano tem mais uma curiosidade antropológica pelo forró, gosta mais de ouvir. O pessoal daqui não tem ainda a cultura da dança. Ainda… Vamos ver se isso muda.”
