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Reprodução/MPPR

O Ministério Público do Paraná, por meio da 2ª Promotoria de Justiça da Criança e do Adolescente da capital, ajuizou ação civil pública contra o Município de Curitiba e a Fundação de Ação Social (FAS) por diversas irregularidades encontradas no funcionamento das entidades de acolhimento que integram a política de assistência social executada pelo Município, como a Casa do Piá 1, estabelecimento especializado na acolhida a crianças e adolescentes em situação de risco.

A judicialização da questão foi decidida após tentativas frustradas de resolver a situação extrajudicialmente, diante da inércia e da omissão dos responsáveis pela política de assistência social do Município, inclusive após denúncias específicas, publicadas pela imprensa, de maus-tratos cometidos contra três adolescentes acolhidos institucionalmente.

Irregularidades – Inspeção realizada na Casa do Piá 1 encontrou diversos problemas no local, como alimentos manipulados congelados sem data de manuseio e vencimento, alimentos secos acondicionados em potes sem data de validade, alimentos vencidos na despensa e na geladeira, proteína animal com embalagem estufada (perda de vácuo), água parada acumulada na concretagem da piscina desativada, lixo acumulado na parte externa, inclusive material que pode servir de criadouros de mosquitos transmissores de doenças, sofá em péssimas condições de higiene e conservação, colchões rasgados.

O Ministério Público constatou ainda problemas relacionados à terceirização da prestação do serviço de cuidador, bem como a falta de capacitação de tais profissionais e a reiterada conduta da Prefeitura Municipal de se eximir de ofertar capacitação continuada aos profissionais terceirizados, sob a alegação de que compete à empresa contratada – o que viola as diretrizes do serviço de acolhimento de crianças e adolescentes.

Maus-tratos – Após reportagem publicada na imprensa sobre maus-tratos contra adolescentes atendidos na Casa do Piá 1, o Ministério Público iniciou a apuração pela via extrajudicial na mesma data, averiguando que a Fundação de Ação Social e a Procuradoria-Geral do Município não tinham adotado qualquer providência emergencial para identificação dos servidores e cuidadores envolvidos, o que só ocorreu após reunião realizada na data de 30.04.2024, quando informada via nota à imprensa, em 01.05.2024, a instauração de sindicância.

Ainda, todos os acolhidos citados na denúncia foram identificados de pronto, em razão das fotos veiculadas, mas a Fundação de Ação Social não os encaminhou, sequer, para escuta especializada. A 2ª Promotoria de Justiça da Criança e do Adolescente, de posse de documentos e informações, encaminhou os fatos às Promotorias de Justiça de Infrações Penais contra Crianças, Adolescentes e Idosos para a apuração dos crimes.

A reportagem versa sobre situação grave de violência institucional em face de crianças e adolescentes acolhidos e reportou a falta de qualificação e capacitação dos servidores e terceirizados no manejo com os acolhidos, sendo indiscutível que foram submetidos à violência física, moral e psíquica, que vão desde o fato da unidade passar por períodos de superlotação, até o uso de castigo físico, com exposição dos meninos à situação vexatória, cruel e degradante, considerando que, dos áudios veiculados, é possível garantir que as contenções físicas não estavam seguindo protocolo algum.

Um dos meninos relata que foi amarrado em um colchão e teve uma meia inserida em sua boca, o adolescente identificado não possui diagnóstico de saúde mental e não faz uso de medicamentos psiquiátricos que justifique tal tratamento que, em verdade, se assemelha à prática de tortura. Um dos áudios que chegou ao conhecimento do Ministério Público, após a reportagem, revela, ao menos, o envolvimento de três servidores na prática de violência institucional.

Conforme constatou o MPPR, “não há qualificação adequada dos servidores (não apenas educadores) e terceirizados para prestar serviços em favor de crianças e adolescentes, sobretudo portadoras de deficiência e transtornos de saúde mental, pois esses são as vítimas dos servidores e terceirizados desqualificados”.

Pedidos – Em vista dos inúmeros problemas, o Ministério Público requer na ação civil pública que o Município de Curitiba e a FAS sejam compelidos, liminarmente, “a substituir imediatamente os cuidadores e educadores lotados na Casa do Piá 1, que não atendem as especificidades das Orientações Técnicas, realizando a capacitação introdutória e prática dos novos que forem ingressar”.

Além disso, pede que os requeridos sejam obrigados a adotar imediatamente “as providências necessárias para implementação de capacitação introdutória, capacitação prática e formação continuada no âmbito de todas as Unidades de Acolhimento Institucional governamentais, em articulação com os demais equipamentos que compõem a rede de proteção, devendo considerar os diagnósticos e especificidades de cada uma de suas unidades, haja vista a variedade de perfis de atendimento”.

Outro item pedido na ação judicial é a revisão imediata do contrato firmado entre a Fundação de Ação Social e a empresa contratada para fazer o cuidado dos adolescentes acolhidos, para que sejam sanadas as omissões quanto a obrigações da empresa relacionadas ao serviço contratado. Além desses pedidos liminares, o MPPR requer também que o Município de Curitiba instale câmeras de segurança com áudio em todas as Unidades de Acolhimento Institucional Governamentais.

No julgamento do mérito da ação, pede-se a confirmação dos pedidos liminares, para que o Município de Curitiba seja obrigado “ao integral cumprimento das normas legais e técnicas aplicáveis aos serviços de acolhimento, sob pena do pagamento de multa diária no valor de R$ 100 mil, a ser revertida para o Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente”.