
A SPVS (Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental) — entidade que atua há 40 anos em prol da conservação da Mata Atlântica no Paraná e no Brasil — firmou, em 2025, uma parceria valiosa com o Global Nature Fund (GNF), fundação privada sem fins lucrativos sediada em Radolfzell, na Alemanha.
Criada em 1998, a instituição tem como objetivo proteger o meio ambiente e a biodiversidade por meio de projetos de conservação e desenvolvimento sustentável, administrando fundos do BMZ (Ministério para Cooperação e Desenvolvimento da Alemanha).
Dentro dessa proposta, SPVS e GNF se uniram para dar novo fôlego às ações da Escola de Conservação da Natureza no território da Grande Reserva Mata Atlântica, projeto conduzido pela SPVS desde 2017. A nova parceria pretende envolver 460 jovens, 100 professores e 50 empreendedores locais.
Além da Escola de Conservação da Natureza, o projeto busca transformar conhecimento em ação, integrando comunidades, empresários e poder público, estimulando a criação de roteiros de ecoturismo e a formação de grupos de trabalho intersetoriais que dialoguem diretamente com políticas públicas de conservação do bioma.
Em três municípios — Morretes, Antonina e Guaraqueçaba — estudantes de 15 a 18 anos, professores e empreendedores terão a oportunidade de enxergar o território não apenas como cartão-postal, mas como fonte de oportunidades econômicas alinhadas à conservação.
Após a formação dos jovens, será realizado um encontro unindo todo o grupo com empresários e representantes do poder público da região, a fim de estimular a integração, o debate e a definição de ações para o território. A Escola de Conservação da Natureza incentiva o exercício da cidadania e a construção de propostas de intervenção a partir de tecnologias sociais, fomentando a formação de redes e favorecendo a participação das comunidades, com espaços de reflexão e fala.
Na entrevista a seguir, Solange Latenek, coordenadora de educação no projeto, explica mais detalhes sobre a parceria e seus principais objetivos.
1. Como se deu o início da parceria entre a SPVS e o GNF? Quais foram os critérios que motivaram o GNF a apoiar a SPVS? Explique um pouco sobre como esse apoio vai acontecer.
A aproximação entre SPVS e GNF teve início em 2021, estimulada pelo biólogo espanhol Ignacio Jiménez Pérez, autor do livro Produção de Natureza: Parques, Rewilding e Desenvolvimento Local. O GNF demonstrou interesse na atuação da SPVS no território da Grande Reserva Mata Atlântica e, a partir de então, iniciaram-se tratativas até definir a melhor abordagem para este novo projeto, com apoio do governo alemão. A aprovação do projeto foi confirmada no segundo semestre de 2024 e sua execução está em andamento.
2. O que é a Escola de Conservação da Natureza e quais são as inovações previstas com esse novo apoio?
A Escola de Conservação da Natureza é um projeto da SPVS que objetiva sensibilizar, informar e instrumentalizar estudantes sobre a importância da biodiversidade para a qualidade de vida no planeta, além de apresentar a geração de empregos e renda por meio de imersões em unidades de conservação.
Acompanhando pesquisadores em campo, fazendo trilhas, observando paisagens, participando de oficinas, palestras e debates em aulas gratuitas, a iniciativa destaca a relevância da produção de natureza e da economia restaurativa. Ela estimula o conhecimento, a pesquisa, a prática e o exercício de ações que gerem desenvolvimento pessoal e territorial a partir da conservação da natureza e da cultura local.
Criada em 2017, a Escola é itinerante e foi inicialmente aplicada em Antonina (PR), com moradores do entorno das Reservas Naturais Guaricica e das Águas. Posteriormente, jovens residentes em Guaraqueçaba (PR) e no entorno da Reserva Natural Salto Morato também participaram do projeto.
A criação de uma rede de atores — envolvendo de fato a comunidade, universidades, ONGs, prefeituras, empreendedores e gestores de unidades de conservação — é uma das metas do projeto. Por meio de metodologias participativas, reconecta pessoas aos espaços naturais, incentiva o pertencimento, fomenta políticas públicas e impulsiona negócios de impacto socioambiental.
Nesta nova fase, o eixo “produção de natureza” permeia toda a formação, conectando os jovens à Rede de Portais da Grande Reserva Mata Atlântica — coletivo multissetorial formado por moradores da região. Morretes receberá, pela primeira vez, uma turma da escola.
3. De que forma esse apoio contribui diretamente para o fortalecimento da Escola? Quantas pessoas serão impactadas e em quanto tempo?
Além das capacitações em conservação da natureza e cidadania, os recursos permitirão a oferta de curso para observadores de aves, entrega de kits completos de birdwatching e lançamento de três novas rotas turísticas. Isso ampliará o alcance das oficinas, possibilitará a contratação de estagiários em áreas protegidas e fortalecerá o projeto diante de potenciais parceiros.
Serão envolvidos diretamente 60 jovens e 100 professores. Indiretamente, os alunos dos professores capacitados e suas famílias, totalizando aproximadamente 460 pessoas, serão beneficiados até janeiro de 2026.
4. Como foi feita a seleção das escolas e alunos participantes? Como será a articulação entre os conteúdos e o currículo escolar?
A seleção das escolas públicas de Morretes, Antonina e Guaraqueçaba considerou a proximidade com áreas naturais e indicações das secretarias de educação. Cada município indicou cerca de 20 estudantes, entre 15 e 18 anos. As oficinas seguirão as diretrizes da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), abordando temas de biodiversidade e sustentabilidade nos componentes de Ciências, Geografia e Redação. Os professores capacitados farão a integração desses conteúdos nas aulas regulares.
5. Qual será o papel dos professores ao longo do projeto? Que tipo de formação será oferecida?
As escolas são espaços de acolhimento e desenvolvimento humano, além de centros de debates comunitários. Professores das redes municipais e estaduais são líderes locais e têm papel fundamental na formação cidadã. Ao passarem por formações sobre conservação da natureza e cultura da Mata Atlântica, recebem ferramentas para incluir esses temas em seus planejamentos, de forma interdisciplinar.
O projeto prevê a capacitação de 100 professores, com apoio do material didático Manual do Educador para a Conservação da Natureza — edição Floresta Atlântica. Os docentes multiplicarão os conteúdos para cerca de 400 alunos.
6. O projeto prevê estágios para cinco estudantes. Quais atividades eles desenvolverão e como serão acompanhados?
Cinco bolsistas serão selecionados por mérito acadêmico e engajamento. Eles auxiliarão em monitorias de campo, coleta de dados de percepção, apoio na criação de roteiros turísticos e produção de materiais de comunicação. A coordenação da SPVS fará o acompanhamento quinzenal.
7. Como essa iniciativa contribui para consolidar a Grande Reserva Mata Atlântica como destino de turismo de natureza?
A Grande Reserva Mata Atlântica é o maior remanescente contínuo do bioma, abrangendo Santa Catarina, Paraná e São Paulo. A região possui enorme potencial, comparável a destinos como Costa Rica, Pantanal e Amazônia. No entanto, o êxodo de jovens das comunidades rurais ainda é uma realidade.
Ao envolver estudantes do ensino médio, a Escola de Conservação da Natureza apresenta oportunidades de desenvolvimento sem a necessidade de migração. Isso contribui para a valorização do patrimônio natural, cultural e histórico da região, beneficiando especialmente as comunidades locais.
8. Quais ferramentas e indicadores estão sendo usados para avaliar os impactos do projeto?
Com base em estudo de percepção ambiental em mil domicílios da APA de Guaraqueçaba, a SPVS identificou desconhecimento sobre conservação da natureza e falta de oportunidades para jovens. O projeto atua no contraturno escolar com atividades em unidades de conservação, promovendo sensibilização, aprendizado e conexão com pesquisadores e redes de atores.
Técnicas como debates, construção de mapas mentais e interação com mapas falados serão utilizadas para avaliar os impactos.
Impactos observados em edições anteriores:
- Aumento do conhecimento sobre biodiversidade local
- Resgate do pertencimento e orgulho regional
- Valorização das unidades de conservação
- Continuidade nos estudos
- Certificação como diferencial para inserção no mercado de trabalho
- Entrega de propostas de políticas públicas às prefeituras
9. Qual será o principal legado do projeto?
O legado mais importante será o fortalecimento do conhecimento e da percepção ambiental. Jovens e professores passarão a enxergar a Mata Atlântica como ativo econômico. A comunidade ganhará protagonismo na proteção das áreas naturais. A Grande Reserva não será apenas cenário, mas agente mobilizador, com redes de portais que garantem coesão territorial e continuidade das ações.