
A família de Ruhan Luiz Machado, de 20 anos, morto a tiros por policiais militares na noite da última segunda-feira (22 de outubro), quer que o caso seja tratado como execução. A Polícia Militar (PM) apresentou a versão de que o jovem teria sido morto ao reagir a uma abordagem, alegando, inclusive, que o rapaz teria disparado contra os policiais. A família, contudo, diz que Ruhan jamais se envolveu com o crime e que a morte não tem justificativa.
O corpo do rapaz foi liberado ontem à noite. De acordo com os familiares, o jovem foi executado com cinco tiros na cabeça depois de ter sido imobilizado com um tiro na perna. O corpo dele é velado hoje na Igreja Fonte da Vida, no bairro Capão da Imbuia. O enterro deve acontecer à tarde, no Cemitério São Roque.
Inconformados com a morte do rapaz, familiares e moradores do Cajuru fizeram um protesto ontem. A manifestação começou no fim da tarde e adentrou a noite, com manifestantes disparando rojões, ateando fogo em pneus, apedrejando um ônibus e jogando pedras na polícia, que reagiu disparando bombas de gás e tiros de bala de borracha em dezenas de pessoas.
Irmã da vítima, Stefhany Machado conta que ouviu os tiros que mataram o irmão. "Eu tava vindo na rua, vi ele passando e virando a esquina e falei 'meu irmão tá ali'. Foi isso e já ouvi um tiro e ele gritou. Chamei meu pai e falei que estavam matando o Ruhan", conta. "Primeiro escutamos um (tiro) e depois mais cinco. Mas foi assim, um e questão de 20 segundos os outros, tudo de uma vez."
A tia Jucelene Zoara relata que o rapaz chegou a gritar por socorro após levar o primeiro tiro e que o pai e a irmã ouviram o pedido por ajuda. "Ele disse 'meu CPF é tal, meu RG é tal. Minha tia mora aqui do lado, me ajude'. E aí a polícia simplesmente executou."
Segundo ela, não houve abordagem ou confronto, mas a polícia simplesmente chegou atirando. "Quando ele viu que eles (policiais) estavam ali para matar, ele disse: 'sou trabalhador, meu pai mora aqui do lado, minha tia mora aqui do lado'. A polícia não se importou com isso. Matou o Ruhan, simplesmente, com cinco tiros na cabeça."
Ruhan não tem antecedentes criminais. De acordo com a família, ele trabalhava com o pai em uma construtora e havia passado no vestibular para o curso de Direito, mas não tinha como pagar, mesmo tendo conseguido bolsa de 50% desconto. Tinha planos para tentar a bolsa de 100% a partir do próximo Enem.
Em nota preliminar, a PM informou que os policiais que participaram da ação estão lotados no 20º Batalhão da PM e que, como de praxe, diz a nota, “em toda ocorrência em que há emprego de arma de fogo e pessoas feridas ou em óbito, será analisada por meio de um procedimento interno a fim de verificar todas as circunstâncias do fato e a responsabilidade dos envolvidos. Por telefone, a assessoria da PM afirma que um revólver calibre 38 foi apreendido na residência. A família nega. Alguns veículos de comunicação também relataram que os policiais apreenderam maconha na casa. Para a tia de Ruhan, mesmo que seja verdade, não justificaria a ação.
"Se não temos pena de morte instituída nesse país, por que a polícia mata, por que tem permissão para tentar numa casa e matar, por quê? Não estaria dando a cara para bater se não tivesse plena certeza de quem é o Rhuan. A gente não vai deixar eles mancharem o caráter, a índole do menino. Não vamos deixar eles fazer isso", disse.
Polícia responde a questionamentos
Respondendo a questionamentos da reportagem, a Polícia Militar informou que, segundo o 20º Batalhão, dois policiais militares participaram da ação que resultou na morte de Ruhan. Eles teriam se dirigido até o local após uma denúncia apontar que estaria ocorrendo uma desova de cadáver próximo ao local ("e isso foi constatado", destaca a PM).
Nas proximidades, uma equipe da PM avistou o grupo em atitude suspeita, o que motivou a abordagem. Posteriormente, foram encontrados 17,2 quilos de maconha no imóvel e ainda foi apreendida uma arma de fogo na residência. "O laudo pericial da Criminalística vai apontar questões referentes a esta arma", destaca a corporação.
Sobre os policiais envolvidos na morte do rapaz, destacou que "todo policial que se envolve nesse tipo de ocorrência passa por avaliação psicológica da unidade em que atua ou pela equipe do SAS (Serviço de Assistência Social) da PM para verificar se o profissional continua no serviço operacional ou não. Nesse caso, os militares estaduais foram atendidos por um psicólogo e foram afastados."
As investigações devem ser encerrar em até 40 dias, mas há possibilidade de prorrogação do inquérito por mais 20 dias e, se ainda for necessário, por outro período.