
Há 14 anos, o Litoral do Paraná vivenciou um dos maiores desastres naturais do Estado. As fortes chuvas que assolaram a região no dia 11 de março de 2011, causaram estragos extensos, destruindo casas, desabrigando pessoas e causando mortes.
O cenário no litoral era assustador, casas alagadas, destruídas, cidades inteiras sem água e estradas interditadas. No km 13 da BR-277, o asfalto cedeu. Quedas de barreiras nas PR 508 e 407 interromperam o tráfego para Curitiba. Cidades ficaram ilhadas sem seu deslocamento para a Capital do Estado ou outras regiões. Apenas em meia pista, alguns veículos eram liberados emergencialmente. Filas se formavam em bairros de Paranaguá, eram moradores esperando receber água vinda por meio de caminhões-pipa. Pessoas foram detidas por vender água de poços artesianos, famílias choraram suas perdas, moradores na Floresta em Morretes e nas Colônias como Santa Cruz e Morro Inglês, perderam suas casas, seus animais e suas plantações.
DEFESA CIVIL
Conforme a Defesa Civil Estadual, foram registradas 2.499 pessoas desabrigadas e 10.761 desalojadas. Foram mais de 2.500 ocorrências relacionadas a movimentos gravitacionais de massa, erosão acelerada e assoreamento de drenagens, além de inundações generalizadas. Na ocasião, comunidades ficaram isoladas, pontes desabaram, casas precisaram ser abandonadas às pressas e vieram abaixo, as ruas foram invadidas pela água e entulhos, blocos de rocha e solo foram carregados pela correnteza causando quilômetros de estragos. As cidades de Guaraqueçaba, Antonina, Paranaguá e Morretes foram as mais atingidas no evento, contabilizando a morte de quatro pessoas, dez mil desalojados e dezoito mil pessoas afetadas.


Na ocasião, os dados coletados dos pluviômetros do Sistema Meteorológico do Paraná (Simepar) e da concessionária da BR-277, Ecovia, registraram um acúmulo de 234,8mm em 48h, com pico de intensidade de 40mm no acumulado horário. Desde o ocorrido a Defesa Civil do Estado desenvolveu várias ferramentas e protocolos que visam evitar que catástrofes como essa aconteçam novamente. Uma das ações foi o treinamento das comunidades das áreas de atenção do litoral realizando simulados de abandono.
O tenente-coronel Ivan Fernandes, coordenador executivo da Defesa Civil Estadual explica que a Defesa Civil Estadual acompanha essa situação no litoral desde o desastre das águas de março. “Um dos principais pontos que detectamos à época foi justamente a falta do mapeamento das áreas de atenção existente nos municípios do litoral. Como é uma área, muito suscetível à ocorrência de desastres naturais, principalmente nos meses de verão pela forte incidência de chuvas, percebemos que não havia um mapeamento preciso em relação a áreas de inundação, áreas de alagamento e mesmo áreas de deslizamento”, comenta.
Por conta disso, a Defesa Civil realizou um trabalho conjunto principalmente de conscientização junto aos municípios, exigindo a elaboração de um plano de contingências que abordasse justamente o mapeamento dessas áreas de atenção. “Hoje, todos os municípios do litoral, assim como todos as cidades do Estado, possuem um plano de contingência com o cadastramento de recursos humanos e materiais e principalmente essas áreas de atenção para situações de alagamento, inundação e deslizamento”, informa.
Outro fator destacado pelo tenente-coronel é a melhoria nas condições de monitoramento das questões climáticas que envolvem o litoral. “Com estações meteorológicas, estações hidrológicas, conseguimos fazer uma previsão, um pouco mais precisa em relação às condições de clima no litoral e mesmo os alertas à população que também é um fato a ser destacado”, observa.
Hoje, a Defesa Civil Estadual possui basicamente três ferramentas que visam alertar os munícipes e toda a estrutura de Defesa Civil do município em relação a desastres naturais. “Temos o mecanismo de aviso por meio de mensagem SMS, via WhatsApp e uma ferramenta bastante inovadora que iniciamos a partir de 2024 no Estado do Paraná e Morretes foi uma das cidades elencadas para o teste, é o chamado Cell Broadcast, que é um mecanismo extremamente invasivo que, independentemente de cadastro, a população que esteja em uma área de risco, vai receber um alerta da Defesa Civil com orientações de como proceder em função, por exemplo, da ocorrência de chuvas”, detalha.
“Pedimos à população que se cadastre nos mecanismos que temos para aviso, como o cadastro do CEP por meio do SMS 4199 para receber nossos alertas. Do ponto de vista de uso e ocupação do solo, as prefeituras também têm desenvolvido um trabalho bastante importante em relação à conscientização e mesmo limitação de áreas que possam ser habitadas nos municípios, principalmente os no litoral que tem muita área de encosta, de mata ciliar, área próxima a questões que envolvem as águas pela Serra do Mar”, enfatiza o tenente-coronel Ivan Fernandes.
DIA DE PERDAS
Hoje profissional de Educação Física, Jackson Marques Pontes, trabalhava em um veículo de comunicação na época e acompanhou os jornalistas na cobertura dos estragos na Colônia Santa Cruz, na Floresta, em Morretes, Paranaguá e Antonina. Ele lembra detalhadamente cada momento daquele dia fatídico e dos anos seguintes nas regiões mais afetadas pelo desastre natural. “As gigantescas pedras e árvores que desceram pela Serra do Mar arrastadas pela enxurrada, levavam tudo ao seu redor, casas, animais, plantações e infelizmente, até pessoas”, lamenta o morador de Paranaguá.



Jackson Marques lembra que no início parecia ser apenas uma das fortes chuvas de verão, comuns nos primeiros meses do ano. “Seguíamos pelos bairros para registrar as fortes chuvas e começamos a nos deparar com um cenário um pouco diferente. Era uma chuva muito mais forte, torrencial que já iniciava bem cedo naquele dia. Ela não parou com o passar das horas e as notícias começaram a chegar de que bairros e as colônias estavam tomados pela água, mesmo assim, ainda não imaginávamos o que iria acontecer, pelo menos não com a intensidade que ocorreu”, relata Jackson.
Ele recorda que acompanhando uma jornalista, tentou chegar a Colônia Santa Cruz por um acesso da PR-408 com a PR-508, mas devido à queda de árvores, não foi possível. “Conseguimos por um acesso chegar a primeira colônia. Estacionamos e seguimos a pé. Tirei meu tênis e entrei no meio do barro e da água, foi um grande número de pessoas que perderam suas casas. Entrei descalço, fui até o outro lado onde havia uma ponte ainda na Colônia Santa Cruz que havia cedido, ilhando quem morava do outro lado”, recorda. “O cenário era de destruição, muitas árvores gigantes que desceram da Serra, pedras enormes, um cenário devastador”, observa. Na Floresta, a cena se repetia com casas que foram arrastadas pelas pedras enormes e árvores. Por muitos anos foi possível ver as falhas de vegetação na Serra do Mar.
Jackson ainda cita que havia uma força tarefa para reconstrução dos trechos destruídos ou obstruídos da BR-277. “Precisavam trabalhar rápido para que veículos de emergência, de segurança, com água e alimentos pudessem voltar novamente a circular na rodovia e atender aos moradores no litoral”, comenta.
ALTOS PREÇOS E PRATELEIRAS VAZIAS
O repórter Elísio Júnior, morador em Paranaguá, também vivenciou o ocorrido em 11 de março de 2011. “Além de toda a destruição, outros problemas surgiram como a falta de água o que levou a grandes e demoradas filas de moradores que aguardavam receber a água que chegava em caminhões-pipa. O medo dominou a população e as prateleiras dos supermercados começaram a se esvaziar. Muitos corriam para comprar com medo de que não fosse possível chegar alimentos na cidade. Os preços de muitas mercadorias e de água mineral triplicaram. Órgãos de defesa do consumidor faziam alertas para a população sobre preços abusivos”, ressalta.