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Palhaços Quiko e Mar de Sá Pato animam o Asilo São Vicente de Paulo, em Curitiba (Fotos: Luis Pedruco)

Entre as portas cor-de-rosa do Asilo São Vicente de Paulo acontece semanalmente uma quebra na rotina. Os palhaços Quiko Tinto e Mar, ambos da família Sá Pato, enchem os corredores da casa de risadas e descontração. O projeto Visitarte surgiu em 2017 com uma proposta incomum no Brasil: levar a palhaçaria para a população idosa. Sem financiamento, o projeto entrou em uma pausa entre os anos de 2020 e 2023, na pandemia, e retornou as atividades em 2024, quando retornou com auxílio de 20% de cobertura das verbas pelo Governo Federal.

O idealizador do projeto e quem dá vida ao palhaço Quiko, Carlos Moreira, conta que a ideia surgiu depois de uma viagem à Europa, quando teve o primeiro contato com um trabalho semelhante. “Eu conheci um grupo francês que fazia visitas em lares para idosos, e percebi o quanto a arte do palhaço podia trazer leveza e conexão para essas pessoas”, lembra.

Com essa inspiração, o Visitarte começou atuando em instituições de Curitiba com o apoio de voluntários. A pandemia, junto com a falta de verba, forçou a pausa das atividades, mas em 2024, o projeto foi reestruturado e retomado com apoio da Lei de Incentivo à Cultura e o reforço da atriz Denise Westphalen, que encarna a palhaça Mar.

A dupla atua quinzenalmente em duas instituições: o Asilo São Vicente de Paulo e o Lar dos Idosos Recanto Tarumã. Além disso, promovem oficinas de palhaçaria no CEDIVIDA, um espaço dedicado ao autocuidado e estímulo cultural dos idosos.

Diferencial

O grande diferencial do Visitarte está na forma como eles respeitam as particularidades de cada pessoa. Não há um roteiro fixo ou uma “fórmula pronta” para as visitas. Carlos e Denise se preparam com música e exercícios, mas entram em cena abertos à experiência, atentos às reações, ao clima do grupo e às necessidades emocionais e físicas dos idosos.

“O que mais importa é a conexão. Às vezes o resultado é uma gargalhada, outras vezes um abraço apertado ou até um silêncio cheio de significado”, explica Denise.

Essa flexibilidade permite que a arte seja uma ferramenta para estimular memórias, resgatar histórias de vida e promover a expressão pessoal. Para muitos, é uma chance de reafirmar sua identidade e autonomia, algo que muitas vezes se perde em instituições de longa permanência.

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Momento da chegada dos palhaços

Projeto que faz a diferença

Conceição Iglesias, de 63 anos e moradora do Asilo, relata com carinho como a chegada dos palhaços muda o clima da casa. Para ela, a presença dos artistas é sinônimo de alegria e vontade de participar, um alento para os dias que, sem essa visita, podem parecer monótonos. “Eu gosto muito deles, desde criança gosto de palhaços. Quando eles vêm, tudo fica mais alegre, dá vontade de brincar. E quando eles não estão, sinto falta” diz.

No olhar do fisioterapeuta Felipe Milani, o impacto do Visitarte vai além dos residentes. A equipe técnica e os cuidadores também sentem a leveza que os palhaços trazem para o ambiente, quebrando o peso e a seriedade inerentes ao trabalho com idosos.

Palhaçaria como serviço social

Mais do que entretenimento, a palhaçaria é um instrumento para mediar emoções complexas que surgem na convivência coletiva, como o luto, a ansiedade e os conflitos de espaço e pertencimento — desafios presentes em instituições com dezenas ou centenas de moradores. Assim, o Visitarte auxilia a reduzir o estresse e a criar um ambiente mais acolhedor, onde o riso e a leveza abrem caminho para o respeito, a escuta e o cuidado compartilhado.

“São 150 mulheres vivendo juntas, com conflitos, ciúmes, tudo isso normal da convivência humana. O Visitarte ajuda a baixar a ansiedade e o estresse, trazendo equilíbrio para todas.”, conta Monica Freitas, supervisora do serviço social da instituição.

Carlos reforça que o humor é uma ferramenta essencial para envelhecer com dignidade e qualidade de vida. “O envelhecimento pode ser um processo difícil se estivermos longe do humor e da poesia. O riso abre espaço para o afeto, para o diálogo, para uma vida mais leve. Nosso trabalho é lembrar a importância disso.”

O Visitarte também está alinhado ao Estatuto do Idoso, que garante o direito à cultura, lazer e convívio social. Mais do que diversão, o projeto reafirma que a arte é um direito fundamental, um caminho para o envelhecimento ativo e significativo.

Mesmo sendo um projeto recente no Brasil, o Visitarte já virou referência nacional e internacional, sendo acompanhado por grupos na Europa e nos Estados Unidos. Carlos e Denise seguem estudando e aprimorando a proposta para garantir que cada visita seja uma experiência única, cheia de humanidade e alegria.

Iniciativas como o Visitarte colaboram diretamente para esse reconhecimento, mostrando que a arte, a cultura e o cuidado andam juntos na construção de uma cidade mais acolhedora e respeitosa para quem envelhece.

Alana Morzelli sob supervisão de Mario Akira