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Foto: Divulgação

“Relatório Isabel”, sobre mortes evitáveis e cuidados com o recém-nascido, é publicado hoje às 20h. O material será disponibilizado ao vivo através do canal do Instituto Brasileiro de Direito do Paciente no YouTube. O documento é divulgado na véspera do Dia Mundial da Segurança do Paciente, que acontece quarta (17). O tema deste ano é “Cuidados seguros para cada recém-nascido e cada criança”, contando com o lema “Segurança do paciente desde o início!”. A publicação do Relatório Isabel também tem apoio do Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba.

O relatório ganha seu nome a partir da história de Isabel, bebê que faleceu por decorrência de erros evitáveis nos cuidados.

“As vivências de Isabel e o relato de sua mãe, Roberta Lopes Guizzo são um convite à reflexão coletiva sobre as fragilidades do nosso sistema de saúde”, afirma Fernanda Góss Braga, presidente da Dando Voz ao Coração. “Ao dar visibilidade a essa história, queremos evitar que outras famílias sofram o mesmo.”

No Brasil, mais de 21 mil crianças de até 1 ano morrem anualmente por causas evitáveis. Globalmente, segundo a UNICEF – o Fundo das Nações Unidas para a Infância – somente em 2022, 4,9 milhões de crianças menores de cinco anos morreram, em grande parte, devido a causas evitáveis. Melhorar as chances de sobrevivência de bebês, crianças e suas mães, portanto, continua sendo um desafio global urgente.

A história por trás do relatório

O relatório recebeu o nome de Isabel, porque a trajetória da criança ilustra de forma emblemática as falhas de comunicação, protocolos que não são cumpridos adequadamente e a fragilidade da segurança em saúde neonatal que ainda existe no Brasil.

A associação Dando Voz ao Coração, uma das responsáveis pelo documento, nasceu da experiência pessoal de Fernanda Braga. Em 2017, sua filha Gabriela foi diagnosticada com cardiopatia congênita complexa e passou meses internada em uma UTI neonatal. “Percebi que as mães viviam, dia após dia, situações de vulnerabilidade e dor, mas também de aprendizado e troca. Quando nos unimos para escrever o livro Mães de UTI, entendemos que havia ali um espaço para transformar dor em rede de apoio e, mais tarde, em ação organizada”, relembra.

O Relatório Isabel foi construído ao longo de sete meses, com a participação de juristas e especialistas em saúde de referência nacional. O documento se debruça sobre quatro eixos principais: Empatia clínica, Direitos do paciente, Comunicação e Segurança do Paciente. 

Segundo Kalline Eler, diretora de projetos do IBDPAC, um dos maiores desafios do trabalho foi “a complexidade dos temas e a necessidade de traduzi-los para uma linguagem acessível, mas sem perder o rigor técnico”.

O relatório estará disponível gratuitamente, a partir do dia 16, para download nos sites do IBDPAC e da Dando Voz ao Coração. 

Falhas e recomendações

No total o relatório indica 24 recomendações, entre elas:

A presença 24 horas de equipes multidisciplinares capacitadas nos atendimentos; garantia do diagnóstico oportuno, seguro e orientado, incluindo-se a adoção de protocolos baseados em evidências que permitam o manejo adequado de complicações e a continuidade de cuidado seguro à paciente gestante e ao paciente criança; melhoria da comunicação hospitalar e a instituição de sistemas de notificação de mortes maternas e perinatais em até 24 horas; promoção da aprendizagem dos pais de recém-nascidos em estado crítico quanto aos cuidados, a fim de aumentar a confiança dos pais em relação a seus papeis de cuidadores; fornecimento às famílias de folhetos ou similares com informações sobre seus direitos; capacitação dos profissionais de saúde em Tomada de Decisão Compartilhada e utilização de ferramentas validadas para a sua implementação na interação com os pais, principalmente em contextos de cuidados em saúde críticos; emprego de linguagem acessível e de instrumentos de verificação da compreensão do familiar em relação às informações fornecidas.

“O reconhecimento do neonato como paciente, com direito a um cuidado seguro e contínuo, ainda é um desafio no Brasil”, pontua Kalline. “Os resultados desse cuidado precoce se refletem ao longo de toda a vida, e precisamos garantir desde o pré-natal até a UTI neonatal um atendimento que proteja cada criança.”

Impacto político

A experiência de Isabel já inspirou mudanças concretas. Em 2025, foi aprovada no Paraná a Lei Isabel (Lei Ordinária 22341/2025), que tornou obrigatório o registro de fatores de alto risco na carteira de pré-natal, garantindo prioridade no atendimento em serviços de saúde.

O relatório também reforça a urgência de aprovação do Projeto de Lei nº 2242/22, que institui o Estatuto dos Direitos do Paciente, em tramitação no Senado. “O relatório tem um papel educativo e político. Ele pode ser usado em cursos da área da saúde para que estudantes reflitam sobre como lidar melhor com situações complexas e, ao mesmo tempo, serve como chamado à ação para gestores e parlamentares”, destaca Kalline. 

Para Roberta Lopes Guizzo, mãe de Isabel, a publicação é um compromisso coletivo: “Ao trazer à luz um tema tão delicado e abrir o diálogo, reafirmamos que cada neonato e cada criança têm o direito à vida protegido. Cuidar do início da vida é plantar esperança, é semear um futuro mais humano e cheio de possibilidades para todos”, conclui.