
Uma história de 36 anos está chegando ao fim. No próximo domingo (15 de maio) o restaurante Polpettas, localizado no bairro Bigorilho, em Curitiba, fechará as suas portas. E os últimos dias têm sido de emoção e felicidade para as famílias Zanlorenzi e Gabardo, fundadoras do estabelecimento, e para os milhares de clientes que participaram da trajetória da tradicional cantina italiana.
Fundado em 1986, o Polpettas foi o terceiro estabelecimento de uma família que fez história na gastronomia curitibana. Tudo começou lá atrás, quando Gennaro Nicolella veio da Itália para o Brasil e abriu a primeira pizzaria com forno a lenha em Curitiba, a Landerna. Anos depois ele voltou para o país natal e, ao retornar para a capital paranaense, inaugurou a Pizzicato, nos anos 1970.
Na década seguinte foi vez de Rosa Zanlorenzi se juntar à filha e ao genro, Soeli Zanlorenzi Gabardo e Fernando Gabardo, para abrir a Polpettas, que sempre se destacou pelas massas caseiras, as pizzas no forno à lenha, o bife à parmegiana e, naturalmente, os polpettones.
“Minha avó [Rosa] trabalhava com meu avô na Pizzicatto até os anos 1980, quando houve a ideia de abrir o Polpettas e daí ela saiu da Pizzicato para começar a trabalhar com meus pais”, conta Leonardo Gabardo.
“E assim foi. Meu irmão [Thiago] nasceu lá dentro, eu nasci lá dentro, e meu sobrinho [Miguel] também já põe a mão na massa, faz pizza junto”, continua Leonardo, que trabalha ao lado dos familiares (inclusive da esposa, Camila Garcia Gabardo) na cantina italiana, que ao longo das décadas produziu mais de 2 milhões de pizzas para saciar a fome e alegrar as papilas gustativas dos curitibanos.
Como já deu para perceber, é um negócio essencialmente familiar, característica que se mantém até hoje. Das mais de 2 milhões de pizzas que a Polpettas já fez, por exemplo, 99,9% foram produzidas por Fernando Gabardo, que é auxiliado na cozinha por sua esposa, Soeli, tudo sob supervisão da matriarca, Rosa.
O filho, Leonardo, fica no salão junto com um garçom, mas quando a coisa apura também dá uma força na cozinha. “Todo mundo se ajuda numa correria danada, é uma equipe”, diz ele. “Antigamente pegávamos delivery da cidade toda e saía 200 pizzas por dia. Hoje temos área reduzida e, em dias de maior movimento, saem de 80 a 100 pizzas, fora a parte das massas”, relata ainda Leonardo, membro da terceira geração da família.
A doída hora da despedida
Desde que a casa anunciou nas redes sociais o plano de fechamento, na última terça-feira, uma verdadeira romaria teve início. “Temos uma clientela muito bacana, grande parte dos nossos clientes são famílias dando continuidade. Famílias que vimos os filhos começando, hoje vão com os filhos, já tem os netos… A vida inteira foi assim, passando de pai para filho”, comemora Leonardo Gabardo, comentando ainda que a família já imaginava que a despedida da cantina italiana geraria uma comoção, mas admitindo que não tinham a dimensão do afeto que o restaurante gerou ao longo das décadas.
“Os últimos dias têm sido uma choradeira danada. As pessoas entram no restaurante chorando, querendo entender, pedindo para gente não fechar. Eles entram chorando e a gente chora junto. Tem tanto cliente que as vezes não temos a dimensão do que representamos para eles. Foram diversos pedidos de namoro, de casamento… Criou um laço muito forte. Pra gente está sendo difícil [a despedida], mas vimos que pros nossos clientes também”, afirma Gabardo.
Decisão sem volta
Apesar de toda a comoção e do apelo dos clientes, Leonardo Gabardo explica que a decisão de fechar a casa é certa. Ele admite que, se fosse para se deixar tomar pela emoção, a família acabaria sendo demovida da ideia. Mas nessas horas, ressalta, é preciso usar a razão. “Estamos muito cansados, principalmente meus pais, que já estão com 60 anos, e minha avó, que está com 82. Chegou a hora de diminuir o ritmo”, explica.
“Eles abriram o restaurante muito novos, perderam muitas festas, casamentos, datas importantes da família. Estavam sempre trabalhando e a pandemia mostrou que precisamos valorizar também outras coisas da vida, ter um tempo maior. Pensamos muito e vimos que precisávamos desse descanso, realmente. A decisão está tomada”, explica.
Já Thiago Gabardo, irmão de Leonardo e que até os 24 anos de idade também trabalhou no restaurante, destaca que o Polpettas sempre trabalhou com uma estrutura muito enxuta, essencialmente familiar. Para manter a casa funcionando, teriam de mudar essa característica do restaurante e ampliar a estrutura.
“E aí ou toma a decisão de entrar de cabeça ou não continua. E a decisão de não continuar foi por isso, pela necessidade de descanso, o cansaço que a noite provoca em quem vive esse ritmo de restaurante: não tem feriado, não tem final de semana, horários tortos, então isso [ter uma rotina mais ‘normal’] naturalmente acaba se tornando até um sonho. Você poder viver um final de semana, fazer o horário útil normal, é uma vontade que eu vejo com muita alegria que meus pais e minha avó possam viver isso, um horário mais tranquilo. Não é aposentadoria, mas é encerramento desse ciclo do restaurante. A decisão por parar é para guiar esforços nessa vida fora da noite“.
A última chance do adeus
Para quem quiser se despedir do Polpettas (ou quiser aproveitar as últimas chances de conhecer o restaurante), é melhor se apressar. O delivery, possivelmente, já não funcionará a partir de hoje, por conta da demanda no salão da casa. A ideia é dar o melhor atendimento possível aos clientes nestes últimos dias, oferecendo uma última experiência maravilhosa. Além disso, as reservas para os próximos dias estão praticamente esgotadas, sendo que no domingo o estabelecimento irá atender no almoço.
“Se alguém quiser fazer uma reserva, vir se despedir, tem de correr. Já abri dois horários por noite para acolher mais gente, porque o pessoal que gosta costuma vir e ficar a noite toda. Vou ter de limitar, mas faltam muitas pocas [vagas para reserva”, diz Leonardo Gabardo, deixando ainda uma mensagem aos milhares de clientes – e amigos – do Polpettas.
“A gente agradece, porque todos adotaram a nossa família e nós adotamos todas as famílias que vieram aqui. Todos os clientes são acolhidos e queremos agradecer por todos esses anos. Vamos ficar morrendo de saudade, já estamos com saudade. Muito mais que um restaurante, a nossa relação com os clientes foi de amizade e amor”, diz ele, deixando ainda um convite para o reencontro. É que a família é proprietária d’A Mercearia Ceasa. “Às pessoas que quiserem nos encontrar futuramente, estamos dentro do Ceasa. Não vai ter restaurante, mas temos café e mais para frente vamos ter alguma novidade lá também”.